Por André Rehbein Sathler, Malena Rehbein Sathler e Valdemir Pires Overdose informacional combinada à fragmentação identitária resulta em crescente incapacidade de atribuição de sentido e de produção de conhecimento.

Pode levar à passagem da neurose para a necrose (num jogo de palavras à Edgar Morin).

Não por acaso, o antídoto para o excesso de informações é o reducionismo informacional: mensagens mais simples e ambivalentes, como praticado pela publicidade comercial há muito tempo, migrando depois para o marketing político – a disputa do poder como numa feira.

Em tempos de atenção instantânea das redes sociais, dos quinze segundos de fama só restam cinco.

E é com esses que os políticos têm que se virar para apresentar aos seus eleitores-audiência plataformas políticas complexas.

Isso explica porque as questões passaram a ser sempre traduzidas em termos dicotômicos, para não dizer mesmo maniqueístas: a favor ou contra.

Cabe ao bom marqueteiro político identificar quais questões estão nos trending topics da conjuntura e colocar seu candidato no lado certo da força.

Uma hiperssíntese dessa tendência é o “meu nome é Enéas”.

Nos cinco segundos de fama de que dispunha, o candidato colocava ao eleitor: eu estarei lá, você é a favor ou contra mim?

No fenômeno Enéas transpareceu, também, outra face da política como feira: o feirante (político) importa mais do que os hortifrutis (programas de governo).

As motivações e as imagens pessoais dos políticos acabam sendo o resíduo informacional que permanece na memória dos eleitores.

O marqueteiro tornou-se peça-chave na arena eleitoral, pois traz um know-how importante.

Sabe traduzir termos técnicos difíceis (sobre as políticas públicas propostas) em discurso corrente.

Conhece o valor da linguagem e o poder dos símbolos. É hábil para simplificar as mensagens em termos dicotômicos e mais que hábil em exacerbar a aura de santa liderança dos candidatos.

Ele deve tornar amigável ao público aquilo que talvez não prendesse sua atenção normalmente: esta é sua glória.

O gap entre realidade e sonhos vendidos aparece aqui como o grande problema: o marqueteiro não tem obrigação de que suas peças ou campanhas sejam reflexo da realidade, afinal uma das principais habilidades no mundo publicitário é justamente criar uma realidade diferente, que justifique demanda sobre o que se quer vender.

Se a realidade “colar”, se a necessidade for gerada, a publicidade foi eficiente.

Se o produto for ruim, o problema é dele (não do marqueteiro), que não fez a sua parte.

Mas e se, afinal, o produto for ruim?

Frustração.

E a cada frustração, aumenta o cinismo e instala-se a desesperança.

Mas a feira – ah, a feira – a feira não pode parar.

No mundo da política, onde certo nível de confiança é pré-requisito fundamental para manutenção da democracia, a estratégia de publicidade que vende, mas não garante a coerência com o produto, pode não só destruir sonhos, como minar a capacidade de sonhar.

Desconfiadas do hortifruti que saíram para comprar porque não confiam mais no feirante, as pessoas vão ficando confusas e irritadas: pode sobrar tomate podre na cara de todo mundo.

André Rehbein Sathler é economista e doutor em Filosofia e Coordenador do Mestrado Profissional em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados.

Malena Rehbein Sathler é jornalista, Doutora em Ciência Política e professora do Mestrado em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados.

Valdemir Pires é economista e Professor-doutor e Pesquisador do Departamento de Administração Pública da Unesp.