Por Osvaldo Matos, publicitário e sociólogo Era época de uma eleição super disputada, na década de oitenta, na cidade de Tropicana o dia a dia atribulado: muita disputa, denúncias de compra de votos e transporte irregular de eleitores, além da polícia na rua controlando brigas.
Terminada a votação, as urnas foram colocadas num grande clube municipal onde iriam ser contadas no dia seguinte.
A certa hora da noite, após o comandante do batalhão ter feito o trabalho de distribuição da sua tropa, foi para casa.
Enquanto estava jantando, o prefeito da cidade, seu candidato à sucessão e alguns vereadores da situação chegaram a casa do comandante querendo conversar com ele.
O prefeito agradeceu a atenção de ser recebido, em horas tão impróprias e disse-lhe: - Comandante, vou logo para o assunto com o senhor: queria lhe dizer que tudo indica que a gente vai perder a eleição.
O senhor sabe, eu sou ligado ao governador, ligado ao presidente da república e temos de continuar no poder.
Na época não havia reeleição, compravam-se votos, mas começavam a definir-se alguns traços democráticos na cidade, devido ao crescimento econômico ao longo daqueles anos.
O comandante, então, comentou: - Mas, prefeito, não posso fazer nada. - Pode, disse o prefeito, o senhor vai fazer o seguinte: reduzir o número de policiais tomando conta das urnas.
A apuração delas será feita no outro dia.
A gente vai invadir o clube e tocar fogo nas urnas. - Mas, prefeito, isso não posso fazer. - Pode, comandante.
O senhor está do meu lado ou do lado dos Boca Preta, a oposição? - Não estou do lado de ninguém, apenas do lado da lei. - O senhor tem que fazer isso.
O senhor não está gostando de ficar aqui e de comandar seu batalhão grande e com prestígio?
Tudo o que o senhor pede aqui, para consertar as viaturas, a gente faz; para ajudar o batalhão, a gente faz.
O governador vai gostar do ato que o senhor vai fazer. - Não, não posso.
Primeiro, não devo tirar o policiamento de lá, devo deixar alguém lá. - Não, isso não é bronca.
Eu vou contratar um pessoal, vão dar-se umas trocas de tiros, morre um ou outro, mas não tem bronca.
De forma cínica, o prefeito insistia para que o comandante tomasse tal atitude.
O comandante contrariou-o: - Prefeito, não posso fazer isso.
Não posso colocar meus homens em risco.
E aconselho o senhor a não fazer isso.
Não vou tirar, não.
Só não prendo agora o senhor, porque não tenho testemunhas e sei que o poder político fala mais alto.
A corda sempre arrebenta pelo lado mais fraco.
Se eu tivesse testemunhas, daria voz de prisão ao senhor. - Vou fazer de todo jeito, comandante.
Fique na sua, então.
O comandante mandou o prefeito retirar-se.
Imediatamente, colocou a farda, ligou para o batalhão e foi, pessoalmente, reforçar a guarda do local onde se guardavam as urnas.
Colocou homens nos telhados do clube e viaturas fechando as ruas principais do clube.
Na época, as viaturas e o armamento eram escassos, os policiais trabalhavam com revólveres velhos e fuzis ainda da segunda guerra mundial.
Mesmo assim, o comandante agiu certo.
Chamou soldados que descansavam, pois haviam trabalhado o dia inteiro.
Com isso, conseguiram evitar mais uma ação danosa para a democracia naquela época tentar reestruturar-se e reerguer-se.
Não era de se esperar a vitória do adversário e, em menos de dez dias, após a conversa com o prefeito, o comandante foi retirado da unidade e recolocado, como castigo, em uma unidade extremamente delicada, onde ficavam policiais militares presos por roubo ou por assassinato.
Ou seja, eles tiraram o comandante de uma unidade considerada boa, como um prêmio, para transferi-lo a uma das piores unidades policiais, a dos policiais presos por crimes diversos, incluindo assassinatos e tráfico de drogas.