O duro e impopular exercício da crítica Por Michel Zaidan Filho, em artigo enviado ao Blog de Jamildo Dizia o cronista pernambucano Nelson Rodrigues que toda unanimidade é burra. É burra e perigosa, quando se trata da existência de uma sociedade democrática.
Paulo Câmara abre processo contra Michel Zaidan Antes de Paulo Câmara, Antônio Campos entrou com processo contra Zaidan em maio Por melhor e infalível que seja o governante de turno (prefeito, governador e presidente), a necessidade do contraditório, da atividade crítica, vigilante e fiscalizadora dos cidadãos é fundamental para a oxigenação do sistema político-partidário.
A busca, a qualquer preço, da unanimidade pelo governante é uma forma de despotismo suave, sobretudo quando se assenta na cooptação, no aliciamento ou compra de apoio político-parlamentar.
A liberdade de expressão ou de opinião, num regime democrático, não é um beneplácito do gestor ou administrador. É uma garantia de que sua gestão seja republicana, realize o bem comum ou o interesse público.
Um administrador público – seja ele um político de carreira, um guarda-livros ou contabilista – não é eleito por um chefe, por uma família, uma oligarquia ou grupo político, para preservar e ampliar vantagens, conveniências e interesses desse grupo ou dessa oligarquia.
A Ciência Política Clássica levou muitas centenas de anos para definir o conceito de representação ou mandato popular.
Desde o abade Syeis até hoje, a essência, o garante, a base da representação é a soberania do povo.
Ou seja, o mandatário governa em nome, com e para o povo. É portanto injustificável que produza-se uma curiosa inversão: de mandatário do povo em mandante do povo.
Em vez, do compromisso com os interesses populares, compromissos com os financiadores ou patrocinadores de campanha, o governante deve fidelidade à Constituição e à vontade política da população, expressa na autorização dada, pelo voto, ao vencedor nas urnas.
Mas isso o obriga a realizar sua vontade e, acima de tudo, a prestar contas de seu mandato àqueles que o elegeram e também aos que não o elegeram.
Afinal, todos são contribuintes e cidadãos.
Um governante que não sabe conviver com o contraditório e se aborrece com as críticas de seus concidadãos ou governados confunde a gestão pública com a gestão privada (de sua casa ou de sua empresa) ou, como burocrata, pensa que a crítica é uma mera licença poética concedida por ele aos que desaprovam ou fazem reparos à sua gestão.
Estes confundem a liturgia e os privilégios do cargo como autorização para fazerem o que quiserem com o erário público, sem prestar contas de sua gestão.
E ai das daqueles que acharem ruim; estes vão se queixar ao bispo.
Um agravante desse modelo de gestão é a ausência efetiva da separação de poderes e o papel da mídia.
Se as novas casas legislativas não estivessem tão desmoralizadas e destituídas de poder, seriam o contraponto necessário à vontade imperial do governante.
A elas cabe o papel da fiscalização, do controle das atividades do Poder Executivo.
Infelizmente, tornaram-se em instrumento de homologação da vontade do gestor, às custas do aliciamento e da cooptação.
Como dizia a filósofo judia, se transformaram em mercados de compra e venda de apoios políticos.
Pior é o papel da imprensa dita livre e independente, que se comporta com empresa e busca vantagens junto ao Poder Político e Econômico.
De órgãos formadores da opinião pública, viraram máquinas de “produção” de um falso consenso, de uma pseudo-unanimidade em torno dos poderosos de turno.
Se quisermos desfazer a impressão de um famoso historiador paulista que chamou o nosso regime democrático de um profundo mal-entendido, num contexto de formação oligárquico-liberal, é preciso fazer da liberdade de opinião, da liberdade de crítica, da liberdade de consciência, mas do que uma simples reverência retórica nas cátedras e salões nobres do Parlamentos. É preciso ter coragem de exercê-las diante daqueles que confundem o cargo com uma prebenda, e a crítica como crime ou desrespeito.