Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem Por Ayrton Maciel, repórter do Jornal do Commercio, especial para o Blog Há uma máxima no mundo dos negócios: contrato é para ser cumprido.
No capitalismo, porém, sujeito a crises cíclicas, alternadas por tempos de crescimento consistente, a máxima do capital não é dogma, crença ortodoxa.
Há necessidade sempre de exceções.
Inclusive porque, entre os negócios, há a política e os políticos, há governos e governos, uns mais competentes ou prudentes, outros menos.
Contrato é contrato, é pra ser honrado.
Mas, e se em algum contrato “o olho político” descuidou do olhar capitalista? É o que parecer a Arena Pernambuco.
O fundamental era ter a obra grandiosa, em um projeto nacional grandioso e à época unitário.
A Arena Pernambuco – da qual, hoje, todos gostariam de se livrar – fez parte de um mesmo projeto com dupla pretensão política, ambas nacionais.
Uma, a de manutenção do poder, gestado pelo então presidente Lula (PT), em um momento com a economia e o social caminhando bem bem, no País, ao contrário do mundo, que mergulha na crise econômica.
A outra, a da possibilidade de descolar e ter voo próprio nacional, o do então governador Eduardo Campos (PSB).
Seis anos após o anúncio, pela Fifa, das 12 cidades sedes da Copa de 2014, entre elas São Lourenço da Mata, o governo do Estado decide rediscutir o custo nas suas contas, enquanto a concessionária Odebrecht só quer saber de receber a sua conta, acordada em contrato.
O interesse agora do governador Paulo Câmara – à época do acordo, secretário de Administração e, posteriormente, vice-presidente do Comitê Gestor da Copa – em buscar uma repactuação do contrato tem sentido, é o caminho correto – pelo custo financeiro astronômico aos cofres do Estado -, mas não anula ou isenta de responsabilidade o governo atual, continuidade do anterior, pela contratação de uma obra que se mantém com o valor de construção ainda incerto.
A preços e obrigações de hoje, com base no que, há dois anos o Estado repassa à concessionária a título de pagamento por investimento e manutenção, é surreal o cálculo projetado a preços e obrigações de hoje: o estádio deve sair, ao menos, por R$ 2,6 bilhões, em 30 anos.
O valor é contestado pela concessionária que, no entanto, não faz o contraditório apresentando o seu cálculo.
A outra parte, a concessionária, tem seus argumentos.
Se o custo é irreal, desproporcional, está no contrato, acertado a dois.
A Odebrecht afirma que a iniciativa partiu do governo, após Pernambuco ser escolhido como um dos Estados-sedes das da Copa do Mundo de 2014.
Acertado o contrato, pouco tempo depois, o Estado passou a pressionar a concessionária para que desse início às obras da Arena.
Mas, pendências colocavam em risco os cronogramas de engenharia e políticos do projeto, a principal delas a aceitação pelos três principais clubes do Estado – Sport, Náutico e Santa Cruz – de fazerem seus 20 mais importantes jogos anuais na Arena.
Seria um componente fundamental para a viabilização financeira da Arena.
Sport e Santa Cruz rejeitaram à época o acordo.
Uma carta-ofício, datada de 21 de dezembro de 2010, chegou à concessionária pressionando pelo começo das obras, sem o compromisso dos clubes, e sugerindo que o impasse seria resolvido posteriormente.
Vem daí a origem do projeto de lei encaminhado e aprovado pela Assembleia estabelecendo que, para os clubes participarem do Programa Todos com a Nota, teriam de ter seus 20 melhores jogos na Arena.
A carta com a “solicitação” está assinada pelo então procurador do Estado, Tadeu Alencar; o secretário de Planejamento, Geraldo Julio, posteriormente presidente do Comitê Gestor da Copa; o de Recursos Hídricos, João Bosco Almeida; o de Desenvolvimento Econômico, Fernando Bezerra Coelho; o de Transportes, Eugênio Moraes; o de Administração, José Francisco Neto; e o secretário-executivo da Controladoria Geral de Pernambuco, Sílvio Baptista.
O secretário de Administração e, posteriormente, vice-presidente do Comitê Gestor, Paulo Câmara, e o governador Eduardo Campos não assinam a carta.
A concessionária aceita, então, o “pedido” do governo para começar a obra, independentemente de três garantias da eficácia contratual: os 20 melhores jogos dos três times pernambucanos na Arena, o terreno livre e desimpedido e a abertura de aquisição financeira bancária.
O governo pediu, pressionou e conseguiu o inicio antes do contrato entrar em vigor.
Embora alvo de críticas de alguns parlamentares da oposição, sobre a existência de cláusulas de confidencialidade, o projeto de lei é aprovado na Assembleia Legislativa sem resistência.
A Alepe foi parceira, não discutiu, não questionou.
A direção da Arena Pernambuco nega a existência dessas cláusulas, com o argumento que não cabe sigilo em contratos que envolvem ente públicos.
Da parte da concessionária, “o olho capitalista” falou mais alto, lubrificado pelo momento de crescimento do Estado e do País.
Mas, o projeto político, no Estado, ganhava dimensão, fortalecia-se.
Não demora muito, e o Estado começa a pressionar pela antecipação da conclusão das obras, previstas no cronograma para dezembro de 2013.
O objetivo era ter a Arena pronta para a Copa das Confederações, o que se concretizou.
A antecipação em oito meses levou a concessionária a dobrar o ritmo de trabalho, com equipes de construção operando 24 horas por dia.
Com isso, vem o aumento do custo da Arena.
Dois anos depois de entregue, as projeções de risco, de custo e de arrecadação estão sob questionamento político, na Assembleia, e na opinião pública.
A concessionária defende-se: Sport e Náutico não aceitaram o acordo; a renda dos jogos estão, em grande parte, abaixo do esperado; e o governo deixou de cumprir sua parte em obras, particularmente na mobilidade: o terminal integrado Cosme e Damião foi concluído pós-Copa; os Corredores Norte/Sul e Leste/Oeste ainda sem conclusão; a aquisição dos trens e o término da Radial da Copa sem previsão.
A Cidade da Copa, na situação em que se encontra a Arena Pernambuco, passa a ser um projeto inviável.
Com o “olhar capitalista, a concessionária, no entanto, ainda afirma que “ajudará bastante” a viabilizar o estádio.
A Copa passou, a Fifa se foi e há uma obra que até o momento não tem os custos de execução e estimativo de final de contrato esclarecidos.
Na contabilidade capitalista, o custo inicial de construção da Arena era de R$ 479 milhões, mas, com o preço do estudo e do projeto executivo, subiu para R$ 532 milhões.
A pressão do governo para a antecipação da obra fez o custo “estimado” pular para R$ 630 milhões.
Isso sem embutir o lucro da concessionária, como a própria observa.
O contrato de pagamento do investimento e manutenção da Arena, entretanto, é de 30 anos, dos quais apenas dois se passaram.
Só pela manutenção mensal, a Arena custa R$ 1,5 milhão por mês.
O risco de aumento do custo seria só da concessionário, como ela alega, se não cobrasse do governo.
O que se tem, hoje, é que o Estado diante de uma situação complexa, criada pelo próprio governo, com elevado custo de desgaste político.
A cada ano que o Estado repassar recursos para cobrir o contrato, novo desgaste estará sofrendo.
A repactuação é a única saída transparente.
Uma saída de custo menor.
Ter ideia de começa e fim.
Como o exemplo da Arena Fonte Nova, em Salvador, citado pela concessionária.
Com 60 mil lugares, o estádio custou caro também, mas sabe-se o começo e o fim das contas.
São 13 parcelas mensais de R$ 130 milhões.
Em 13 anos passa para o Estado da Bahia, quitado a um preço estimado de R$ 1,69 bilhão.
Muito caro para um arena esportiva, mas menos danoso para os cofres públicos.