Primeiro pronunciamento de Dilma após protestos contra governo federal.
Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicos Por Miriam Leitão Coluna no jornla O Globo Há um erro que o governo não pode cometer e está cometendo: subestimar a dimensão das manifestações contra a presidente Dilma Rousseff.
No próprio domingo, dois ministros bateram cabeça.
Ontem, a presidente falou sobre democracia para receber as palmas dos seus.
Depois, em entrevista rápida, nada declarou que demonstrasse ter entendido o que está se passando no País.
Na entrevista, a presidente Dilma Rousseff disse: “Ah, vocês querem uma confissão de erro?
Erramos no Fies.
Demos o controle das matrículas para o setor privado”.
Antes fosse apenas esse o erro do governo Dilma.
Seria corrigido, e o País seguiria seu caminho.
Foram muitos os erros dos últimos anos.
Ontem, os procuradores do Ministério Público, em Curitiba, denunciaram 27 pessoas, entre elas o tesoureiro do Partido dos Trabalhadores (PT), João Vaccari.
O procurador Deltan Dallagnol foi claríssimo ao explicar o esquema.
Propinas pagas pelas empresas, que tinham negócios com a Petrobras, eram disfarçadas de doações legais ao Partido dos Trabalhadores.
Segundo o procurador, Vaccari sabia a origem ilícita dos recursos. É disso que se trata.
A maior empresa do país foi assaltada.
O roubo levou ao enriquecimento ilícito de ex-dirigentes e, pelo mesmo canal, o partido do governo foi financiado.
Para Dilma, o erro do governo foi ter permitido que quem tirasse zero em português recebesse financiamento público. “Deixamos o setor privado controlar a matrícula, e isso está errado.
Não pode tirar zero em Português”. É constrangedor.
Um dia depois de avassaladoras manifestações populares, no dia exato em que o tesoureiro de seu partido foi denunciado pelo Ministério Público, quando tantos fatos graves abalam o País, a presidente tem a admitir um erro: o do Fies.
O governo errou na Petrobras durante anos e a levou a uma crise.
A corrupção se alastrou pela empresa.
A inflação está alta e subindo pelo efeito de políticas econômica e energética erradas no mandato passado.
O Brasil está estagnado.
Foi por isso que os brasileiros foram para as ruas no aniversário da redemocratização.
No domingo à noite, os ministros Miguel Rossetto e José Eduardo Cardozo apareceram na televisão meio confusos.
Cardozo apresentou promessa requentada, a de uma reforma política e do pacote anticorrupção.
Tudo o que fora dito em junho de 2013.
Rossetto foi pior ao dizer que os manifestantes “não votaram na presidenta Dilma”.
Essa visão cria dois tipos de cidadãos: os de segunda classe são os que supostamente não votaram no governo.
Mostrou que nada entendeu.
Nem da mensagem das ruas, nem de democracia.
Sequer entendeu um detalhe estatístico: a popularidade da presidente hoje é muito menor do que o percentual de votos que recebeu.
Logo, entre os descontentes, há também quem votou na presidente.
A presidente disse que não deixou de pensar, ao ver as manifestações, que agora os brasileiros podem se expressar, e que valeu a pena lutar pela liberdade.
Sim, quem viu o País sob ditadura valoriza ainda mais o direito de manifestação.
Só não é dádiva de governo algum.
Foi conquista. Árdua, dolorosa.
E mesmo quem participou da luta democrática não é dono da vitória.
A democracia pertence ao povo brasileiro.
Ela inclui o direito de a população se expressar, e o dever do governo de ouvir, se explicar, ser transparente, agir diante do que está sendo dito.
A presidente Dilma conseguiu a proeza de enfrentar duas manifestações contrárias, ao mesmo tempo.
Na sexta-feira, manifestantes foram às ruas para apoiar o governo.
Alguns carregavam cartazes em que chamavam de “traição” as medidas que o governo tem tomado na economia.
Ela tem que explicar aos seus eleitores que essas medidas são para corrigir os erros do primeiro mandato.
Segundo o Datafolha, 63% dos que se manifestavam a favor do governo disseram que Dilma sabia dos escândalos da Petrobras.
A massa muito maior que foi domingo para as ruas protestou contra o governo Dilma e a corrupção.
Dilma teria muito a dizer se enfrentasse a questão.
Mas disse que “a corrupção não nasceu hoje. É uma senhora bastante idosa”.
O problema é este: a velha senhora nunca pareceu tão forte, atuante e ardilosa.
E ela é inaceitável.
Foi este o recado das ruas.