Artista plástico que confeccionou a alegoria do Galo da Madrugada diz que olhos azuis foram uma charada.
Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem.
Charada ao sabor dos interesses governistas Por Michael Zaidan Indagado sobre o significado os “olhos azuis” da alegoria carnavalesca, público- privada, “0 Galo da Madrugada”, o artista plástico responsável pela confecção da fantasia respondeu que era uma charada, um enigma carnavalesco a ser decifrado pela imaginação dos foliões.
Charada de fácil decifração esta, considerando as relações mais do que promíscuas entre produtores e artistas pernambucanos com o prefeito e governo do estado.
Quando o jornalista Bruno Albertim ocupou o cargo de Secretário de Turismo da Prefeitura do Recife, disse ele que o principal produto turístico daquela secretaria era o carnaval do Recife, já apelidado por muitos como o “maior do mundo”.
Se o antigo folguedo popular da cidade mauricéia é ou não o maior do mundo, uma coisa é certa: ele tornou-se uma das propagandas mais eficientes para vender o estado e o município ao mundo.
LEIA TAMBÉM: » Galo da Madrugada de olhos azuis foi homenagem a Eduardo Campos, diz artista plástico A engenhosa e cara operação simbólica para transformar os festejos momescos no “principal produto turístico” de Pernambuco é o resultado de uma sinergia de esforços e ações público-privadas, que conta naturalmente com o interesse da mídia em co-patrocinar o evento.
De forma que, às vezes, se torna muito difícil distinguir o que é público do privado, o que é oficial do espontâneo, do popular. 0 Carnaval é um desses festejos pagãos, carregados de simbolismo (daí a estética do grotesco) que foi convenientemente domesticado pelas nossas elites em vista de seus objetivos e interesses. É uma empresa? É uma válvula de escape? É um rito pagão?
Ou uma forma de angariar consenso popular através do rico patrocínio público da folia carnavalesca? - Talvez seja tudo isso e algo mais.
Se houve algum princípio de inversão ou transgressão simbólica na organização do carnaval, nas últimas décadas, é que se transformou de coisa marginal e suja em um megaespetáculo televisivo, por onda posam e desfilam celebridades oriundas de uma cultura de massas barbarizada, que junta crime, violência, pornografia, futilidades e denúncias de corrupção praticada por agentes públicos.
A quem serve o carnaval, afinal de contas?
Ao invés de uma revolta simbólica contra os poderes dominantes, através de alegorias grotescas e demoníacas, o folia momesca tornou-se um instrumento de marketing e venda dos mais diversos apetrechos.
Mais o pior negócio é o estado de euforia, brilho, felicidade e satisfação que supõe provocar no imaginário do povo, tendente a torná-lo mais receptivo e tolerante às desgraças e descalabros do Poder Público e da própria estrutura social, quando se for a folia.
Como povo parcialmente socializado pela ética puritana do trabalho, o “ethos carnavalesco” nos faz diferente das sociedades de índole cristã reformada.
E há muitos estrangeiros que admiram essa espírito dionisíaco e bacante, sobretudo nas mulheres.
Mas não nos deixemos enganar: a saudosa maloca da música de um Adoniran Barbosa deu lugar a um arremedo televisivo de barraco de escola de samba, povoada de atrizes mais ou menos brancas e arremediadas, loucas para convencer o distinto público da novela das oito de que vale a pena ser brasileiro, carioca, pernambucano e recifense.
Afinal de contas, se não temos o melhor prefeito e governador do mundo, temos o maior bloco carnavalesco do planeta.
E isso é pouco?
PS.
E a concentração dos órfãos de ex-governador no dia 15 de março, na praia de Boa Viagem para pedir o “impeachment” da Presidenta eleita também faz parte dos festejos pós-carnavalescos?