Por Ayrton Maciel, especial para o Blog de Jamildo O maior mal para a democracia é a quebra do princípio da autoridade. É quando se perde o respeito pela liberdade, ao confundi-la com a falta de regras na sociedade.
O maior mal da democracia é a passividade da autoridade, que dispensa o exercício pleno do Poder por entendê-lo como autoritário.
Essas sentenças estão, hoje, na rotina nossa da convivência diária.
Imagine a cena: Avenida Beira Rio, via de mão dupla, sentido Praça do Internacional, bairro do Benfica.
Uma fila de carros aguarda a abertura do semáforo.
Uma segunda fila vai se formando na divisa entre a mão e a contra-mão.
Cidadãos impacientes em uma cidade esgotada não se contêm: uma terceira via é aberta, com os mais incivilizados acochando-se entre a contra-mão e a calçada.
Uma quebra da ordem extrema.
A ausência material da autoridade e a percepção da quebra da autoridade dominam a via, tornada espaço de disputa.
Foi-se o princípio da lei e do poder.
A cidade não é (só) mais uma espaço de competição na mobilidade, mas do sentimento integral da impunidade.
Contestar o infrator passa a ser uma agressão, um ato com alto risco de uma reação descontrolada.
Imagine uma segunda cena: um segmento social, político ou econômico descontente com a cidade, o Estado ou o País ou uma categoria em protesto contra atraso de salário, por uma empresa ou pelo poder público, resolve, em protesto, bloquear a Agamenon Magalhães – maior via urbana – e por horas paralisa a cidade.
Não é necessário uma massa, bastam 10, 15 ou 20 e a cidade vira uma cidadela.
Nada sensibiliza (em sentido contrário) o gesto.
Nem a cidadã no ônibus, nem o moribundo na ambulância, nem a vítima à espera da polícia.
O poder público, no Estado democrático, está atado.
A cidade não tem dono, a cidade (hoje) tem donos.
Terceira cena: detentos “estocados” em uma penitenciário esgotada e inumana reagem à violência do sistema com violência bárbara em troca, e tornam o poder público refém de sua ausência.
Rolam cabeças para o sistema se mexer; cede a autoridade para as cabeças deixarem de rolar.
Se o Estado pode, por que não faz?
Se o Estado sabe, por que não age?
Se o Poder, no Estado democrático, existe para fazer valer a autoridade e as regras de convivência, por que é passivo?
Se existe também para corrigir injustiças e assegurar o princípio da igualdade de tratamento a todos os cidadãos, o que o tolhe?
São as escolhas, a ordem das prioridades invertida.
A uma tropa armada cede, ante o risco da cidade tombar sob a desordem armada, e não por ser justo o que se cede.
Ao que é visível é mais fácil ceder, como uma Arena, símbolo político e econômico.
Quarta cena: governar sem saber com quem governa.
Imagine um Estado imenso e proporcionalmente desigual.
Historicamente, corrupto e, por tradição, adorador do improviso.
Governar sem mecanismos internos de acompanhamento, controle e punição.
Por não existirem ou não funcionarem ou por omissão ou fraqueza.
O governo refém de quem o apoia, o Estado refém da ausência da autoridade.
Um estado de fragilidade que possibilita malfeitores levarem a maior empresa nacional a um estágio de degradação moral que atinge o País.
Governar permanentemente na berlinda, sob noticiário diário devastador.
Se quem governa não é cúmplice, cabe reagir.
A Petrobras não pode ser a manchete do País por quatro anos.
Ao Estado nacional e às suas unidades cabe o poder, aos governantes a autoridade.
Aos poderes (constituídos) o exercício da lei, na cidade, no Estado, na União.
Não dá para viver sob o caos.
Ayrton Maciel é jornalista.