Por Gustavo Krause Em 1994, cumpria o último ano do mandato de deputado federal quando fui convidado para participar de encontro com uma comitiva de deputados americanos.
A mim, me caberia fazer uma explanação sobre a conjuntura brasileira.
De plano, alertei os ilustres visitantes para as peculiaridades do Brasil e sugeri: “É importante que os senhores arquivem os mecanismos tradicionais de análise.
Eles não se aplicam ao Brasil”.
Justifiquei: “O Brasil não tem moeda: tem um nome.
Na prática, o que existe é uma cumplicidade aritmética entre os agentes econômicos chamada correção monetária.
O Brasil não tem orçamento.
O mais importante instrumento de planejamento governamental que traduz financeiramente as prioridades políticas de um país e protege o cidadão da rapinagem dos poderosos, é uma ficção.
A Federação é uma cópia canhestra do federalismo dos senhores.
Aqui, predomina o centralismo que é o avesso da gênese federativa: a descentralização do Aqueles parlamentares, nascidos e criados na tradição anglo-saxônica, para quem Moeda, Orçamento e Federação são os pilares de uma nação civilizada, estavam zonzos.
Piorou quando ilustrei minha exposição com números impressionantes: “De 1980 a 1994, o Brasil teve 15 Ministros da Fazenda, 14 Presidentes de Banco Central, 6 planos de estabilização, inclusive o confisco, 6 moedas, 13 políticas salariais, 17 regras de câmbio, 3 tablitas, 53 medidas de controle de preços, 720% de inflação média anual”.
Os gringos se entreolharam perplexos à espera de uma conclusão catastrófica.
E aí para surpresa deles, concluí: “Apesar disso, senhores, o país funciona, a bem da verdade, precariamente, produzindo aleijões graves com o risco de uma ruptura do tecido social.
A nossa esperança é o Plano Real em curso” (na época, a URV engolia a moeda podre o que foi difícil O Plano Real revolucionou o país, demolindo a perversa cultura inflacionária e construindo uma saudável cultura de estabilidade, a tal ponto que seus ferrenhos adversários, ao chegar ao poder, proscreveram exóticas e supersticiosas fórmulas econômicas no compromisso lastreado pela “Carta ao Brasileiros”, subscrita pelo candidato Lula.
Na sequência histórica, ficou evidente que os governos petistas não estavam preparados para enfrentar crises.
E mais, reinventada no governo Dilma, uma tal Nova Matriz Macroeconômica desmantelou a economia.
A contabilidade criativa tinha pernas curtas.
A contabilidade real é cruel.
E agora?
Lula escreveu a Carta; Dilma teve de engolir a banca e seus rebentos “neoliberais”.
A questão é: Dilma vai digerir ou vomitar os ministros siameses, Fazenda e Planejamento?
Duas circunstâncias respondem pelo tempo de validade dos ministros da área econômica: conjuntura estável e favorável; confiança e identidade político-ideológico com o Presidente da Não me parece que seja o caso.
Os tempos são bicudos.
A conjuntura, adversa.
O enfrentamento, impopular.
Tudo que um chefe de governo detesta.
De outra parte, a relação chefe/subordinados não dá liga.
Diz-se que Levy votou em Aécio.
Suprema ironia.
Ambos, os ministros, são “mãos de tesoura”.
De perfil alto.
Não têm nada a ver com o antecessor, Mântega, cegamente obediente, que estava mais para o otimismo tolo de Cândido, discípulo de Pangloss, personagens de Voltaire.
A rigor, Joaquim Levy e Nelson Barbosa fazem parte do time dos vilões, os banqueiros, que surrupiaram a comida dos pobres na obra-prima de João Santana que fez o diabo e arrebatou o Oscar da sacanagem eleitoral.
De logo, deixo claro: desejo ardentemente que o governo tire o pais do atoleiro que ele mesmo botou.
Se der errado, a vítima é o Brasil.
Infelizmente, o cartão amarelo mostrado a Nelson Barbosa por conta da declaração (correta) do Ministro sobre a indexação do salário mínimo é um péssimo sinal e que me lembra a experiência vivida com Itamar no meu primeiro dia trabalho como Ministro da Fazenda.
Crise política brutal; inflação estratosférica.
Corrigi o preço da gasolina, medida correta.
O Presidente não gostou.
Botou a boca no trombone.
Trocamos um telefonema civilizado, porém, tenso.
Expliquei a razão da medida.
Após o que ouvi a pergunta: dá pra revogar a portaria?
Infelizmente, não.
Estava engatilhado o complemento se a ordem fosse dada: o senhor revoga a portaria e o ministro.
Não foi necessário.
Teria passado para história como Krause, o brevíssimo.
Levy e Barbosa, outros batráquios virão.
Preparem a goela e o estômago.
Já vi esse filme.