Por Roberto Numeriano Especial para o Blog de Jamildo Li hoje, no Blog de Jamildo, uma notícia que por si mesma dá a dimensão do abuso do privatismo sobre a chamada esfera pública.
A notícia registra que “Antes de passar o Governo do Estado para Paulo Câmara, o ex-governador João Lyra Neto sancionou duas leis do deputado estadual Alberto Feitosa.
Uma acrescenta a denominação “Governador Eduardo Campos” ao nome da Empresa de Turismo de Pernambuco (Empetur).
Assinada pelo ex-governador no dia 23 de dezembro de 2014, a Lei Nº 15.431 adiciona “Governador Eduardo Campos” ao nome da Empetur, que agora passa a se chamar Empresa de Turismo de Pernambuco Governador Eduardo Campos”.
Antes de tudo, não sei se essa lei estadual nasceu legal, nos termos da legislação brasileira.
Se é, a lei nacional que a possibilita já é uma gritante ilegalidade. (Em se tratando do nosso enxovalhado país de muitas leis e pouca Justiça, não me admiraria se existir uma lei que permita batizar uma empresa pública com o nome de uma pessoa, em particular, seja ela quem for).
Mas mesmo se for legal a lei da lavra desse senhor deputado de uma assembléia legislativa que nos últimos tempos desceu ao nível da pura vassalagem diante do poderoso Poder Executivo, trata-se de ilegítima e é, no mínimo, tipicamente provinciana.
A ilegitimidade está no fato de que, nos Estados e política modernos, a separação entre as esferas do público e do privado constitui o princípio básico do republicanismo, a par da separação entre os três poderes.
Uma lei assim dá margem a todo tipo de abuso para quem, pelo jeito, tem pouco o que fazer na assembléia.
Que tal batizar a Compesa de Companhia Pernambucana de Saneamento Jarbas Vasconcelos?
O homem, agora, não faz parte da atual roda do poder e tem grandes serviços prestados ao bem público?
Semelhante ridículo já vitimou o nosso grande Gilberto Freyre, que passou a ser um penduricalho no nome do Aeroporto Internacional dos Guararapes.
Para além dos áulicos de uma corte legislativa hoje decadente nos termos de uma representação realmente republicana, o que se revela com esses tipos de homenagem é o fato de que o privatismo, cada vez mais, anula e/ou submete a esfera político-institucional pública.
Anula, submete e a corrompe, não diga-se de passagem.
Aliás, a “homenagem” está bem ao estilo do ex-governador Eduardo Campos, não por acaso imperial na sua forma de pensar e praticar a política (sobretudo nos bastidores): ele era, de fato, uma encarnação modernosa, à Luís XV, da frase lapidar dos soberanos autocráticos: “O Estado sou eu”.
De todo modo, o ex-governador pode e deve ser homenageado por outros meios que não o exponham ao ridículo post-mortem.
Roberto Numeriano é jornalista, professor, pós-doutor em Ciência Política e presidente do diretório municipal do PSOL/PE.