Por Demétrio Magnoli, na Folha de São Paulo A publicidade de Dilma é superior pois opera no universo da política, não no do marketing “É Duda Mendonça!”, exclamaram tantos analistas em 2002, quando Lula conquistou o Planalto. “É João Santana!”, começam a dizer agora, no rastro das pesquisas que indicam uma dianteira de Dilma.
O diagnóstico estava errado ontem –e continua errado hoje.
A campanha eletrônica da presidente-candidata é muito melhor que a de Aécio, mas por razões estranhas às técnicas de marketing.
No fundo, o predomínio de Dilma na telinha deve-se, justamente, à sábia descrença do lulopetismo nos poderes encantatórios do marqueteiro. “O que parece, é!”, ouvi de um publicitário, anos atrás, numa mesa-redonda sobre o valor da Copa do Mundo para o Brasil.
O brilho exterior do evento da Fifa justificava-o automaticamente, gerando por si mesmo efeitos benéficos em diversos níveis, argumentava o profissional do marketing.
Ele não sabia que a ciência só existe porque as aparências enganam: afinal, não é o Sol que gira ao redor da Terra.
As ferramentas do marketing funcionam bem no universo do consumo, mas não no da política.
O primeiro tem como centro o indivíduo e seus desejos de consumo.
O segundo estrutura-se em torno da sociedade e dos valores coletivos.
A publicidade de Dilma é superior pois opera no universo da política, não no do marketing. “Nós contra eles”: pobres versus ricos, povo versus elite.
O tema invariável do lulopetismo brota da extensa tradição populista, inaugurada no Senado romano.
Mesmo enveredando pelas trilhas da difamação e da mentira, a propaganda de Dilma jamais renunciou ao registro da política.
A propaganda de Aécio, pelo contrário, apenas roçou as fronteiras do discurso político, esterilizando-se no registro do marketing.
O candidato oposicionista não soube dizer que Dilma não é o que parece. “Aécio é o Brasil sem medo do PT.” Na sua melhor frase, a campanha dos tucanos contrapôs “o Brasil” ao “PT”, utilizando a ideia de unidade como antídoto contra o discurso da divisão (“nós contra eles”). É política, mas só até a página 3.
Segundo a lógica binária dos marqueteiros, existem apenas as alternativas do discurso “positivo” (propostas) e do “negativo” (ataques).
Aécio oscilou entre os comportamentos polares, ao sabor das pesquisas qualitativas.
A lógica conflitiva da política, contudo, exige o emprego da crítica, um recurso situado além do espectro de opções do marketing. “Os ricos nunca ganharam tanto dinheiro quanto no meu governo.” Na frase de Lula encontram-se as chaves para a crítica dos governos lulopetistas –isto é, para desvendar a empulhação veiculada pelo discurso populista.
Aécio martelou o prego da inflação crônica, mas não esclareceu suas relações com a persistência de taxas de juros que desviam a riqueza social para o sistema financeiro.
O candidato também não acendeu um holofote sobre o “bolsa empresário” do BNDES, iluminando a face oculta da “mãe dos pobres”.
Ele insistiu no escândalo da Petrobras, mas não explorou seu potencial pedagógico, explicando o lugar ocupado pela estatal na santa aliança da coalizão governista com as grandes empreiteiras.
O marketing está para a política como o ensino fundamental está para a universidade. “Escolas e hospitais padrão Fifa.” Os manifestantes das Jornadas de Junho ofereceram uma bússola para as oposições, gritando nas ruas que a função do Estado é gerar bens públicos, não soprar bolhas de consumo com os foles do crédito, dos subsídios e da dívida.
Os tucanos deixaram passar a oportunidade de mostrar as imagens das manifestações e de abrir um diálogo honesto com a maioria dos brasileiros, que as apoiaram.
Provavelmente, escutaram o alerta de marqueteiros sobre os riscos de avivar a memória de um movimento avesso ao conjunto da elite política.
O marketing teme a incerteza, que é inerente ao mundo da política.
João Santana não ganha eleições.
No máximo, empacota um discurso eficaz