A ditadura da corrupção Pedro Henrique Braga Reynaldo Alves Presidente da OAB-PE Tenho visto com muita preocupação pessoas esclarecidas pregando certa complacência em relação à corrupção reinante em nossa Nação, como quem já perdeu há tempos a capacidade de indignação.

Para eles a máxima maquiavélica de que “os fins justificam os meios” se presta a legitimar a reedição do estilo de governar daqueles que “roubam mas fazem”, com uma pretensa atenuante de que agora os feitos são de caráter social e em benefício dos menos favorecidos.

Na visão desesperada desses cidadãos, roubar dinheiro público para dar sustentação política a um governo que se mostre preocupado com os mais pobres, é menos grave que a corrupção realizada com propósitos diversos.

O pior é que essa permissividade tem uma fronteira muito tênue com a institucionalização da corrupção como instrumento de poder.

A democracia de fato dá muito trabalho, pois exige diálogo, busca de maiorias ou mesmo de consensos, contraditório, controle social etc., é realmente, como dizia Churchill, “o pior regime, afora todos os outros”.

Fazer reformas ou executar programas de governo é muito mais fácil em Cuba ou na China, onde quem discorda das políticas públicas ou ousa fiscalizar os governantes tem um único direito, o de ser preso.

Mas os regimes ditatoriais, mesmo na América Latina, estão fora de moda, vistos com crescente antipatia pela comunidade internacional e trazem alguns efeitos colaterais nefastos como a violência e mesmo a instabilidade, pois as armas sempre podem mudar de mãos a qualquer hora.

Para sair desse dilema, o governante “moderno”, que não tenha apreço nem respeito à democracia, não precisa “pegar em armas”, basta valer-se de forma bem estruturada e organizada da corrupção.

A lógica funciona mais ou menos assim: como dissolver o Congresso Nacional exigiria o improvável apoio das Forças Armadas e não teria a menor aderência com a vontade popular, é mais simples se “comprar” uma boa parcela de deputados e senadores corruptos, através de dinheiro roubado das estatais e de propinas cobradas nas grandes obras financiadas pelo erário.

Com o troco, ainda podem ser cooptadas algumas lideranças de entidades da sociedade civil e até mesmo setores da imprensa.

Aliás, se a imprensa mesmo assim der muito trabalho, o ditador moderno pode tentar implementar normas que regulem o seu controle, instituindo uma censura prévia de todo conteúdo divulgado na grande mídia, sem que seja preciso usar este nome (censura), pois ficaria antipático e não pegaria bem.

Agir de forma ditatorial, mas preservando as aparências de uma democracia formal.

Qualquer semelhança deste cenário com o escândalo do “mensalão”, que colocou na cadeia alguns líderes do PT e de outros partidos aliados do Governo Federal, infelizmente não é mera coincidência.

Estamos vivendo sim a ditadura da corrupção em nosso País e o que o governo permitiu que fosse feito dentro da Petrobrás é um exemplo muito claro disto.

Os próprios “operadores” do esquema criminoso, Paulo Roberto Costa e Alberto Yussef, claramente incentivados pela exemplar condenação de Marcos Valério (operador do chamado mensalão), sujeito a mais de 40 anos de prisão em regime fechado (pena bem mais onerosa que a dos políticos corruptos envolvidos), aderiram à delação premiada e estão dando “nomes aos bois” e detalhando o funcionamento da quadrilha, para desespero de dezenas de políticos, executivos e empresários que estão na iminência de trocar seus luxuosos escritórios e gabinetes, quase sempre frequentados pelos maiores dignatários da república, pelas precárias instalações de nosso falido sistema prisional.

Estou certo que em breve assistiremos esses figurões sendo presos e condenados pelo maior caso de corrupção da história de nosso País, mas isto não será suficiente para reparar o grande mal que esta forma de governar causou ao Brasil.

Não me refiro aos prejuízos financeiros bilionários, que tanto comprometeram a imagem e performance da maior empresa brasileira, mas à perda de referência moral de nosso povo, que passou a tolerar ou mesmo admitir a corrupção como se ela estivesse incorporada ao cenário da política e ambas – política e corrupção – fossem indissociáveis.

Somente a confiança na perda dessas referências éticas de nosso povo é que pode explicar a reação da atual e do ex-presidente do Brasil diante das evidências, constatadas em inquéritos policiais e processos penais, da criminosa rede de corrupção que deu alicerce a seus governos: a imediata negação e subsequente acusação de tentativa conspiratória de “golpe”.

Não fosse essa inversão de valores morais, os presidentes Lula e Dilma teriam publicado desculpas solenes, repudiando os criminosos de seus governos (o que nunca o fizeram), na hipótese de realmente terem sido traídos por seus companheiros criminosos, ou, do contrário, seriam premidos a renunciar aos seus mandatos, sob a legítima ameaça de impeachment.

O cumprimento das normas penais e princípios constitucionais de nosso País, não pode ser confundido com “golpe”, só tendo algum sentido essa ideia na cabeça daqueles que não admitem que os agentes públicos exerçam suas atribuições legais em seu desfavor, e que possam apurar os seus malfeitos, assim como nas ditaduras onde o Estado se confunde com os próprios governantes, sendo impensável estes punidos pelo próprio Estado.

Em um ambiente democrático, portanto, não há espaço para essa perigosa retórica de “minha polícia”, “meu judiciário” e “minha procuradoria”, muito menos para comparar as atuações dessas instituições em relação a governos passados.

Assim como a advocacia, o Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal, são instituições fundamentais de nosso Estado de Direito, e a atuação de seus agentes atende a uma política permanente de Estado, para realização da justiça, e não de governos ou dos governantes de plantão.

A má versação e o desvio de finalidade nas nomeações de milhares de cargos comissionados, investindo nos mesmos pessoas compromissadas apenas com a ideologia partidária e a perpetuação do governante no poder, ainda que sem mérito ou menor preparo para o exercício das funções, pode realmente causar o nefasto “aparelhamento” do Estado em muitas áreas, contribuindo com a ditadura da corrupção, mas para a felicidade de nossa nação esse fenômeno – ainda – não corrompeu as referidas instituições que fazem a justiça brasileira.

Para o bem ou para o mal, o tempo político nem sempre coincide com o tempo jurídico, e ainda demorará alguns meses para que a “Operação Lava-Jato” se traduza em prisões e condenações criminais.

Nesse interim experimentamos as eleições 2014, que certamente sagrou a vitória e recondução de parcela dos corruptos para os mesmos ou novos postos de Poder, em um pleito viabilizado pelo dinheiro sujo da corrupção investido em campanhas eleitorais milionárias.

O maior teste de maturidade de nossa democracia e de nossas instituições está por vir, e será o de levar à cadeia vários líderes políticos, ainda que porventura tenham eles obtido aprovação popular pelas urnas nesta última eleição.

Estou certo que o judiciário brasileiro está apto e maduro para isso, e não se furtará em cumprir seu relevante papel constitucional.

Mais do que nunca é preciso refundar a nossa república, resgatando valores éticos e morais há muito esquecidos na atividade política e na administração pública, fortalecendo assim as nossas instituições para nos protegermos contra qualquer forma de ditadura, mesmo as travestidas de democracia popular, socialista ou bolivariana, sempre alimentadas pela odiosa chaga da corrupção.

O Brasil e o povo brasileiro merecem isso.