Por Jamildo Melo, editor do Blog Na porta de saída de um dos maiores shoppings centers da capital pernambucana, na Zona Norte do Recife, ao dobrar a esquina, o eleitor recifense topa com uma imagem enorme do ex-governador Eduardo Campos.
Os amigos pagaram um out-door agradecendo pelos investimentos que salvaram o Hospital do Câncer de Pernambuco (HCP), que iria fechar e foi recuperado e ampliado pelo então governador, antes de partir para o voo nacional. “A saudade só não vai ser maior do que a gratidão”, é a frase inscrita na peça, em letras garrafais.
No Recife, é praticamente impossível esquecer Eduardo Campos.
Não há um só local que sua imagem não seja lembrada, desde sua morte, no dia 13 de agosto, em um acidente de avião, em São Paulo.
Graças a uma comoção natural ou estimulada, nunca um morto esteve tão presente nas eleições estaduais.
Se no plano nacional, para Marina, o componente emocional perdeu força com o passar dos dias, ao mesmo tempo em que aumentaram a intensidade e o vigor dos ataques desferidos contra uma candidatura já fragilizada por sujas próprias contradições, no plano local pernambucano, não houve tempo para que a comoção perdesse força.
Sem direito a descanso eterno, no dia imediatamente posterior ao enterro dos socialistas, era possível ver carros de som, à moda antiga, pelas ruas da capital, com a voz de Eduardo Campos pedindo votos para o aliado socialista.
A Federação Pernambucana de Futebol (FPF) entrou em campo e anunciou que mandou produzir e vai instalar o primeiro busto do ex-governador, na porta do Palácio dos Esportes, em agradecimento ao programa Todos com a Nota, retomado do governo Arraes, em que os torcedores trocam notas fiscais por ingressos para os jogos.
O programa custa R$ 10 milhões por ano para todos os times do Estado, nos jogos locais ou nacionais.
O PTB de Armando Monteiro Neto começou o guia ‘homenageando’ Eduardo Campos.
Antes disto, a família Campos já havia entrado no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Pernambuco solicitando que a imagem de Eduardo Campos não fosse utilizada.
Depois, o ex-governador Eduardo Campos também apareceu na TV na sexta 26 de setembro, elogiando o senador Armando Monteiro Neto (PTB), adversário do candidato do PSB, Paulo Câmara.
A campanha de Monteiro usou um depoimento de Campos gravado em 2010, quando o petebista disputou o Senado no mesmo palanque do ex-governador.
A propaganda foi um direito de resposta a duas inserções de Câmara.
Os vídeos citam a falência de empresas da família de Monteiro, sem mencionar seu nome. “O trabalho de Armando Monteiro está presente no que aconteceu de melhor em Pernambuco durante o nosso governo.
Como deputado federal, trouxe recursos e obras para os municípios.
Como líder empresarial, Armando trabalhou para que mais indústrias viessem para o nosso Estado gerar empregos”, diz Campos no vídeo.
No começo da campanha eleitoral, os analistas apontavam que Paulo Câmara teria dificuldades e poderia não dar certo porque Eduardo Campos não estaria presente, envolvido e absorvido pela campanha presidencial, com Marina.
Os socialistas compensavam essa ausência física apresentando vídeos com Eduardo em praças públicas das cidades do interior, antes ou depois da passagem da comitiva de Paulo Câmara.
A grande ironia é que o candidato do PTB já havia andado em todos os recantos do Estado, quatro mandatos parlamentares, como deputado federal e depois senador.
A infantaria formada pelos deputados estaduais e federais também ajudou.
Pelo WhatsApp, os deputados da coligação distribuíram vídeos aos eleitores em que o falecido pedia votos ao seu lado, como foi o caso do ex-secretário de Turismo do Recife, Felipe Carreras, amigo pessoal do ex-governador.
O combo dos socialistas era completado pela presença da viúva Renata Campos no guia eleitoral e o primeiro filho, João Campos, estreando nos palanques pelo interior.
No total, foram 18 filmes originais levados ao ar, a maior parte delas após o rebote da morte com referências diretas ou depoimentos do presidenciável.
Nos debates de TV, o socialista, mesmo depois de passar o adversário nas pesquisas, usou Eduardo Campos contra o adversário, ao reclamar que ele botava ‘gosto ruim’ na gestão do socialista.
A frase usada no debate da TV Jornal não era à toa.
O objetivo era colar no petebista a pecha de anti-Eduardo, ampliando sua rejeição.
Na semana derradeira, de acordo com os dados da pesquisa Nassau, a rejeição de Armando era tão elevada (21%) que rivalizava com nanicos, como PSOL, PSTU e PCO.
Paulo Câmara tinha metade disto (16%).
No dia a dia, em entrevistas às rádios locais, o trabalho foi entregue ao prefeito do Recife, Geraldo Júlio, de modo a acentuar o sentimento de ingratidão, afinal Armando Monteiro Neto havia sido eleito com a ajuda de Eduardo Campos.
A diferença é que os socialistas, de modo inteligente, nunca chamaram o petebista de traidor, como os petistas se cansaram de chamar Eduardo Campos, assim que anunciou seu afastamento da base de Dilma, para disputar.
Para que se tenha uma ideia da força do nome de Eduardo Campos, a citação do nome do ex-governador na Veja entre os supostos beneficiados pelo ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa não surtiu efeito algum.
Os adversários não ousaram explorar o tema na campanha.
Nada colava no neto do mito Miguel Arraes, que faleceu no mesmo dia do avô e foi enterrado ao seu lado, no Cemitério de Santo Amaro, Zona Central do Recife.
O que foi tentado, mais pareceu um tiro no pé, como a tentativa de associar o candidato Paulo Câmara ao avião que derrubou o ex-candidato a presidente.
Depois da tragédia em Santos, os adversários de Campos disseram que sua morte mudou radicalmente a eleição.
Não é verdade.
Salvo se a argumentação servir de desculpa.
A morte de Eduardo Campos, a rigor, antecipou o conhecimento do candidato Paulo Câmara.
O cientista político Adriano Oliveira é um dos que não acredita que a comoção tenha viabilizado a candidatura do afilhado político. “Paulo era desconhecido do eleitorado na primeira pesquisa, antes da morte de Eduardo, aparecendo com 10%.
Mas, já naquele momento, os entrevistados reconheciam a boa gestão de Eduardo.
O efeito após a tragédia foi apenas acelerar o processo de conhecimento de Paulo como o candidato do ex-governador”, afirmou, na quinta-feira, quando saiu mais uma rodada de pesquisas. “Aconteceu o que todos aqueles que não têm a cabeça presa aos mecanismos da velha política previam: deu a lógica.
Como poderia, quem representa um projeto exitoso em execução no Estado, quem tem a mais ampla e sólida base de apoio social e política, quem é melhor preparado e bem sucedidamente experiente em gestão pública, perder para um adversário que não reúne nenhum desses requisitos?
Todos sabiam que quando Pernambuco começasse a descobrir essas diferenças iria estourar a bolha que levou o adversário a começar na frente.
Foi um sonho que durou três dias, como diria o poeta.
O adversário na verdade só esteve à frente das pesquisas no começo do jogo, quando estava jogando sozinho e Pernambuco ainda não conhecia Paulo e, portanto, ainda não tinha percebido o que cada candidatura significava.
A campanha tratou de colocar os pingos nos is”, argumentou Waldemar Borges, líder do governo do PSB na Assembleia Legislativa.
O candidato Armando Monteiro, no derradeiro debate, na TV Globo, reclamou que Paulo Câmara fez campanha ‘na sombra’ de Eduardo, dando oportunidade que o socialista, mais uma vez, o trata-se como anti-Eduardo, ao afirmar que não era ele que iria dizer quando e como homenagearia o líder do PSB.
Na reta final, o PTB de Armando Monteiro Neto tentou colar a imagem a Dilma, depois de sua recuperação nas pesquisas, defendendo a tese do alinhamento com o governo Federal, com as parcerias.
O ex-presidente Lula colocou a cara, com depoimentos gravados, chegou a vir fazer comício em Brasília Teimosa, mas não foi páreo.
Desde as primeiras sondagens, o Instituto de Pesquisas Maurício de Nassau já mostrava que Eduardo Campos era o principal cabo eleitoral nas eleições estaduais, batendo Lula e Dilma.
Além de um governo bem avaliado, as pessoas atribuíam a ele os avanços do Estado.
O fato é que o PSB acabou o PT em Pernambuco.
Definitivamente, nunca um morto influenciou tanto uma eleição.