Foto: BlogImagem Por Gustavo Krause, especial para o Blog de Jamildo Hesitei em escrever algumas linhas sobre Eduardo Campos.

Tudo foi dito e bem dito por todos que, próximos ou distantes com ele viveram, conviveram e testemunharam a tragédia.

Confesso que o silêncio resultava da minha desimportância e, mais ainda, era a medida de um transtorno emocional em que o sentir toma conta da capacidade de pensar.

Acordei.

Mais um dia para fazer funcionar a implacável máquina do tempo e mover a roda da vida.

Acordei, mas o pesadelo continuou e me veio o que é guardado neste arquivo, cada dia, mais pesado e longo, que é a memória, o tempo dos velhos.

Quarenta e três anos me separam da morte do meu pai, eu com vinte e cinco anos e ele com cinquenta e quatro.

A sensação de orfandade permanece; as lembranças do homem simples, alegre e espirituoso operam o milagre da ressurreição; ele vive, só que não posso abraçá-lo e sentir o calor do seu corpo.

Não consigo me libertar da imaginação nostálgica e melancólica.

Desde o primeiro momento do desastre, não me largou o pensamento a mãe se despedindo do filho, a dor mais profunda e a maior crueldade do destino; a mulher, Renata, em quem percebi, por dentro, a solidez granítica e, por fora, a leveza e a ternura da flor; os filhos que representam a projeção de uma vida que vence a morte quando se deixam pensamentos, palavras, obras e sonhos marcantes como exemplo pessoal e como patrimônio para ajudar na construção do futuro da nação brasileira.

Não podiam ser diferentes em mim que sou um feixe de nervos, disfarçado por uma máscara de racionalidade, os efeitos do evento devastador.

Afinal, colocado de lado divergências políticas e a distância geracional, muitas coisas nos aproximavam: a mais simples e indiscutível, como ele, somos humanos; somos pais de cinco filhos; tivemos pontos de contato na carreira política com a ressalva de que ele era, de longe, mais talentoso e competente; coração alvirrubro me permitam os discordantes; e por fim, fui testemunha ocular da posse de Eduardo na Secretaria da Fazenda (na época era Ministro e ele teve a gentileza de fazer o convite pessoalmente, no meu apartamento, para comparecer à cerimônia).

No último contato que tive com o Governador Eduardo Campos foi por conta de um projeto do qual fui encarregado de fazer a exposição.

Antes de iniciar perguntei: “Governador, quanto tempo o Senhor dispõe”; ele respondeu “Krause, se você continuar me chamando de Senhor e Governador e vou chamá-lo de Senhor e Governador, vai ser uma conversa chata e, quanto ao tempo, o que for necessário”.

Deu uma significativa risada e fiz a exposição a um interlocutor atento e decisor ágil.

A propósito outras gentilezas foram praticadas no campo do relacionamento pessoal.

Registradas para sempre.

Neste pesadelo, entretanto, a esperança venceu a tristeza.

Duas mulheres de força arrebatadora mantêm acesa a plenitude existencial de uma passagem luminosa pela vida do filho e do marido: Ana, nome de origem hebraica que significa graciosa, cheia de graça; Renata, nome de origem latina que significa renascida.

Não é a toa que o nascimento e o renascimento sejam obras da mulher.

E hoje, nascida, é dia de cantar parabéns para a renascida pelo aniversário, Renata: um coral de vozes composto pelo Pai, pelos Filhos, pelo Espírito Santo.

Gustavo Krause é ex-ministro da Fazenda, ex-governador de Pernambuco e ex-prefeito do Recife.