Por Roberta Soares, repórter do Jornal do Commercio Não existe almoço de graça.
Desde que comecei a cobrir o setor de transporte, doze anos atrás, passei a ouvir essa expressão com frequência.
Bastante usada no meio econômico, significa dizer que alguém paga a conta.
Sempre, em qualquer situação.
E no transporte público não é diferente.
Ao contrário, é um dos setores onde ela mais faz sentido.
A conta pode ser paga de três formas.
Pelo Estado (gestor do sistema de transporte, no caso de Pernambuco), com a decisão de subsidiar o sistema, ou convencendo, através de pressão ou contratos legais, os empresários a reduzirem o lucro do negócio (na RMR gira em torno de 12%, dizem).
Pelos empresários, que abririam mão do percentual do lucro, mesmo estando no setor para gerir um negócio e, logicamente, lucrar.
Ou, por último, pela população, de duas formas: pagando o reajuste das passagens, dado porque o Estado não subsidia o sistema nem os empresários abrem mão do lucro, ou perdendo qualidade do serviço, comprometido pela redução da frota.
Alguém, de fato, tem que pagar o almoço.
Sendo assim, deixemos de hipocrisia.
Lá atrás, quando o governo do Estado, no início da gestão Eduardo Campos, decidiu indexar o reajuste das tarifas de ônibus ao IPCA, índice que nem de longe cobria as despesas do sistema, a população vibrou e a política, mais uma vez, lucrou.
Eduardo também estabeleceu, justamente, que as passagens da RMR subiriam apenas uma vez por ano – e não mais duas e até três vezes como aconteceu várias vezes na gestão de Jarbas Vasconcelos.
Lucrou mais uma vez, enquanto os empresários de ônibus, acuados, mantinham o silêncio, sem criar polêmicas, e os técnicos do setor, mesmo sabendo que a conta chegaria, calaram-se.
Para completar, o aumento das passagens dado em janeiro de 2013 foi retirado em junho, depois dos protestos que tomaram conta do Brasil.
E em janeiro de 2014 ninguém falou em aumento.
Ou seja, o último reajuste tarifária da RMR foi dado em janeiro de 2012.
Não estou aqui defendendo o aumento das passagens.
Mas volto a argumentar: não existe almoço de graça.
E quem vai pagar o preço é o passageiro, de um jeito ou de outro.
A não ser que venha o subsídio.
Enquanto isso, o déficit do sistema vem se acumulando e, de algum tempo para cá, começou a pipocar.
A receita do sistema não cobre o custo há muito tempo.
E qual a solução quando se tem muita despesa e pouco dinheiro para cobri-la?
Ou se aumenta a receita ou se reduz o custo.
Como o governo do Estado não tomou a decisão de subsidiar o sistema de transporte (o fará para bancar a operação do BRT, que custa caro pela qualidade dos equipamentos e estações), a saída é reduzir o custo.
E como se reduz custo em transporte?
Reduzindo a operação.
E como se reduz a operação?
Tirando ônibus das ruas.
E qual o resultado: veículos abarrotados de gente. É fato que a falta de prioridade ao ônibus nas ruas provoca a perda de viagens, mas é fato também que algumas linhas estão operando ainda com a frota das férias de janeiro, sem que a reposição dos veículos tenha sido feita.
E tudo com o conhecimento do Grande Recife Consórcio de Transporte.
As informações são de bastidores. É claro que operadores e gestores vão negar.
E fica difícil para a mídia confirmar que os 30% retirados de circulação durante as férias são repostos na sequência.
Quem vive o setor de transporte sabe que todos os dias, sem exceção, o passageiro reclama do serviço oferecido.
Especialmente nos terminais integrados e nos subúrbios. É lá onde está o perigo, longe dos olhos da classe média (que não anda de transporte público) e dos políticos (principalmente).
A questão é que esses problemas são potencializados sempre nos meses de junho/julho/agosto, período do dissídio dos rodoviários – é tanto que eles estão em estado de greve.
Não é à toa que, este ano, o setor empresarial chamou o Grande Recife Consórcio para sentar à mesa na negociação salarial com motoristas, cobradores e fiscais.
Agora, com a licitação do sistema, o GRCT passou a ser um órgão regulador, totalmente responsável, inclusive judicialmente, pelo equilíbrio econômico-financeiro do setor.
A pressão está grande e a conta não fecha.
Nos países sérios, onde o transporte público coletivo é visto como prioridade, os sistemas são subsidiados pelos governos, pouco importa se municipal, estadual ou federal, ou todos juntos.
Por isso, deixemos de hipocrisia.
Ou se subsidia o setor, reduz lucros, ou se dá aumento de passagem.
Alguém terá que pagar o almoço.
Que não sobre, mais uma vez, para a população – seja com o reajuste tarifário ou com a redução da oferta de serviço.