Editorial do Jornal do Commercio desta sexta-feira (16).

O mais chocante nas imagens de saques realizados às lojas de Abreu e Lima e em Paulista, no Grande Recife, não foi a violência de uma turba descontrolada de vândalos - e sim, a naturalidade com que adolescentes, homens e mulheres praticavam o crime, carregando aparelhos de TV, máquinas de lavar e telefones celulares em nítida euforia.

O sorriso escancarado de um jovem assaltante contrastou com o choro de uma senhora, que jamais tinha presenciado brutalidade parecida.

Depois da reportagem ir ao ar na TV Jornal, a apresentadora Graça Araújo nãoconteve o espanto, e perguntou: tem que ter polícia nas ruas para o cidadão ser honesto?

Noutras palavras, a ética é abandonada diante da certeza da impunidade?

A greve dos policiais militares foi considerada ilegal pela Justiça.

O Governo de Pernambuco já havia afirmado que não negociaria as reivindicações, entre elas, percentuais de reajuste salarial inviáveis.

Embora não se possa atribuir aos grevistas o clima de guerra civil, também não dá para eximir a corporação da responsabilidade pelas consequências do movimento paredista.

O caos não surge do nada.

E para que o pânico que se alastrou tomasse corpo, uma sequência de omissões percorreu seu curso, produzindo o ambiente ideal para o que estamos vivendo.

A tristeza que surge de uma situação além de todos os limites vem da percepção de que parcela da população parece ter anulado qualquer senso de discernimento entre o certo e o errado.

Senso que deveria ser trazido da educação familiar e escolar, e fortalecido no exemplo de personalidades que deveriam encarnar o valor das instituições.

Já sabemos que no Brasil falta educação de todos os tipos e em todos os níveis.

E que os exemplos de personagens públicos não têm sido o melhor espelho - especialmente na política, onde a corrupção é vista como traço generalizado e quase obrigatório.

Os últimos dias entram para a galeria dos piores momentos da história pernambucana.

Lojas e centros comerciais fechados, escolas e universidades com aulas suspensas, assaltos relatados em vários locais e, para piorar, uma onda de boatos sobre arrastões fizeram com que o medo comandasse um toque de recolher que esvaziou as ruas do Recife e de outras cidades da Região Metropolitana em pleno dia.

Autoridades ainda tentaram restabelecer a confiança coletiva, em vão: a credibilidade dos atores políticos anda tão em baixa quanto a capacidade real de intervir num problema dessa natureza.

Ficou demonstrada a vulnerabilidade do cidadão sem a presença da polícia - e a própria segurança pública foi posta em xeque, diante do ataque de massas livres de freios de inibição.

Há muita, muita coisa errada num País que se gaba de ter melhorado a distribuição de renda, num Estado que ostenta índices de crescimento econômico acima da média nacional - e a violência de um saque é assumida pelo povo como atitude normal em face de uma greve policial.