Por Assuero Gomes Lembrar D.
Helder deve ser mais que simplesmente ter uma boa recordação afetiva.
A saudade amorosa de uma pessoa que esteve entre nós e já partiu.
Fazer isso com um profeta é trair sua memória.
Há exatos 50 anos ele chegava aqui em Olinda e Recife, num momento conturbado e tenebroso da nossa história pátria.
Seu discurso de posse já deixava bem claro, na época, a que ele veio.
Tornou-se um baluarte na defesa dos perseguidos.
Via além de seu tempo.
A questão do comunismo e do capitalismo, então no auge, ele a via em segundo plano.
Rejeitava as ditaduras e as violência, ou da direita ou da esquerda.
Sua ação sempre foi centrada na justiça.
Na questão dos muito pobres e os muito ricos.
Hoje em dia é muito bonito, elogiável e até faz bem para o marketing pessoal ser defensor de D.
Helder, ser seu amigo e muito mais seu seguidor, mas até bem pouco tempo era perigoso e poucos se atreviam a ostentar tal amizade.
Infelizmente o que vejo hoje são alguns procurarem mais o brilho do holofote e da mídia, do que a luz da verdade que iluminou o Dom.
Alguns que ainda tentam manter sua memória a custo de muito sacrifício e desprendimento, focam suas ações no restauro e resgate da obra escrita e fotográfica, porém todos cometem uma grande traição memorial quando descartam o Pobre da vida do Dom.
Ora, afastar D.
Helder dos pobres e os pobres de D.
Helder, é romper de maneira rude com a sua memória e com sua presença real entre nós.
Não vejo mais ninguém preocupado em acolher os pobres em nome do Pastor, nem dar-lhe abrigo ou cidadania.
Francisco de Assis, Vicente de Paulo e tantos outros sobrevivem até hoje na memória dos pobres.
O pobre é quem canoniza os santos, a canonização da instituição pode até ser dispensada, mas a daqueles a quem os santos serviram, não.
Não se chega a Deus a não ser pelos necessitados.
Elaborar documentos, mostras internacionais, congressos, debates, exposições, acervos, campanhas, comissões, celebrações, isso não reflete praticamente nada da vida de um profeta como Helder Camara.
Fico desencantado e muito preocupado quando constato que na totalidade absoluta das manifestações em memória do Dom a ausência de seus pobres é total.
Pergunto primeiro a mim mesmo e em seguida a todos e todas que tentam de alguma maneira sobreviver essa memória, o que estamos fazendo?
Já imaginaram Francisco de Assis sem o pobres?
Seria apenas um trovador galante medieval que encantou emotivamente uma bela Clara e fundou mais uma ordem, ou um Vicente de Paulo apenas um inteligente padre que fez carreira na coorte de França e chegou a conselheiro da rainha e fundou uma congregação.
A memória deles caberia num pequeno museu trancado e mofado, sem que o ar (Espírito) a vivificasse constantemente.
Fica um chamamento de consciência para mim e para quem tem ouvidos, vamos trazer de volta os pobres para D.
Helder, porque ele jamais saiu de perto deles.