Por Roberto Numeriano O anúncio do nome do novo ungido do ainda governador de Pernambuco deveria chocar o mundo político, por dentro e além de todos os espectros político-ideológicos.

Trata-se de um escárnio político tão chocante quanto a aparente naturalidade com que esse mesmo mundo político e seu jornalismo oficialista recebe a notícia do novo parto.

Chama-se, esse rebento, Paulo Câmara.

Nasce cevado pelo velho útero de uma política que se pretende nova.

E sai à luz com retoques de marketing embusteiro, afirmando ser esse novo nome do consórcio Eduardo Campos um “militante” político desde 1992, embora tenha se filiado apenas ano passado ao PSB.

Vê-se logo o tipo de militância que o homem sempre exerceu, dado que demorou 21 anos para se definir por um partido…

Não nos ocupamos, aqui, da crítica da escolha em si mesma. (Os cozinheiros escolhem seus ingredientes conforme o prato que pretendem servir).

O que queremos demonstrar é o perigo de uma política que na prática instrumentaliza vontades e rebaixa os seus atores. É essa, na essência, a nova política desse novo imperador da velha ordem.

Na qualidade de cientista político e militante desde os 21 anos (quando, ainda na clandestinidade, comecei a militar no PCB), gostaria muito de dizer que nada poderia me chocar na política, dado que vi e sofri quase tudo em 30 anos de estrada.

Mas o que estou vendo em Pernambuco é um dos mais perigosos processos de sequestro político-eleitoral e ideológico da história.

E perigoso porque não apenas evidencia a falência objetiva e ética do velho jogo liberal da disputa pelo poder político, mas sobretudo porque anula e bloqueia a mudança política mesmo nos termos e ambiente comuns às regras desse jogo.

O que estamos a sofrer é uma fantasia organizada que não merece ser chamada de disputa política e, muito menos, de uma nova política.

Esse senhor, Eduardo Campos, é a quintessência da maior operação de esvaziamento da política e do político como dimensão do dissenso, da crítica, da possibilidade de mudança.

O seu poderio e domínio é tão acachapante, tão absoluto, que eu não posso ver senão como covardia política o silêncio de seus homens-fortes, alguns com grandes serviços à causa pública e inegáveis capacidades gerenciais e políticas, a exemplo de um João Lyra Neto.

Esse poder absoluto traveste de político burocratas cuja maior capacidade é submeter-se à estratégia do padrinho, e transforma em meros “gerentes técnicos” homens políticos que pautaram suas vidas na carreira pública.

Eu, para além de qualquer militância política, não aceito que a política estadual esteja se transformando nessa perigosa fantasia organizada.

No fundo, sabemos que tudo isso é por força dos conchavos, do compadrio, das alianças por cargos e pelos projetos pessoais, que essa velha nova política transforma seus quadros em marionetes de um homem, de um projeto pessoal.

Se esse imperador lhes convence de que o céu é o limite em seu projeto de poder presidencial, não há o que fazer, pois contraditar César é suicídio político.

Mas acredito ser necessário reagir, como cidadão político, diante dessas práticas e desse discurso que transforma a política numa ferramenta instrumental, manipulatória das vontades, impositiva e impostora.

Quem esse homem pensa que é para investir contra a essência da política?

Um dos elementos do totalitarismo é a anulação de qualquer ideia de mudança possível.

Creio existir, ainda que difusamente, elementos simbólicos dessa negação do político e da política estaduais. É preciso resistir e criticar essa fantasia organizada da nova política, pois detrás de suas máscaras só há desalento e ilusão.

Roberto Numeriano é cientista político, jornalista, professor e dirigente estadual do PSOL/PE.