Longe de Calcutá Editorial da Folha de São Paulo Sem as assinaturas exigidas por lei, a Rede Solidariedade tornou-se “o primeiro partido clandestino criado em plena democracia”.
O floreio retórico, não dos mais convincentes, ornamentou o discurso de sua principal idealizadora, Marina Silva, na tarde em que anunciou sua decisão de filiar-se ao PSB de Eduardo Campos.
Frustrando seus correligionários mais puristas, Marina preferiu não seguir a estratégia de acumulação de forças e de organização subterrânea a que aludia a glamourosa hipérbole de seu pronunciamento.
Entre a difícil maturação de um projeto coletivo e o fortalecimento de sua própria trajetória individual, Marina Silva fez sua escolha –bastante surpreendente.
Não há motivos para criticá-la com especial severidade por isso.
Não quis ser “uma Madre Teresa de Calcutá da política”, afirmou.
Talvez se esperasse dela exatamente isso.
Todavia, levando em conta seus 26% de intenções de voto na última pesquisa Datafolha, a lógica inerente a qualquer atividade política real excluía tal caminho.
Como poderia ser diferente?
A pergunta terá de ressoar nos ouvidos dos marinistas menos pragmáticos até ser absorvida.
Mas não era para ser diferente?
Eis o que poderiam retrucar os inconformados.
Enquanto isso, outras questões começam a ser formuladas.
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, apresenta-se como candidato permeável às urgências do desenvolvimento industrial.
Não é o caso de sua nova aliada.
Estaria em curso uma espécie de “frente ampla”, destinada a romper com mais de uma década de predomínio petista?
Campos e Marina mencionaram as manifestações de junho como fenômeno inspirador de sua aliança. É superpor um enigma a outro –não se sabe o quanto daquelas múltiplas e legítimas insatisfações sobreviverá até o próximo pleito e de que modo poderão se traduzir numa plataforma coerente.
Mais uma incógnita se expressa na sentença de Marina, segundo a qual sua filiação ao PSB adensa “uma candidatura já posta”.
Qual?
A de Eduardo Campos, dir-se-á.
Mas o governador tem apenas 8% das preferências do eleitorado, menos de um terço, portanto, do índice de sua suposta vice.
Faz sentido, assim, que ambos deixem as definições só para 2014.
A permanência de Marina na disputa cria um grupo em tese capaz de quebrar a polarização PT-PSDB e assegura um debate mais profundo e consistente.
Canaliza, ademais, expectativas a que nenhum dos demais postulantes poderia atender com legitimidade.
Ao mesmo tempo, a aliança com o PSB intensifica a impressão de artificialidade e improviso que marca a política brasileira.
Seria exigir demais de uma líder que, sozinha, num prazo exíguo, resolvesse esse dilema.