Por Paulo Rubem Santiago Deputado Federal (PDT-PE) No dia 6 de setembro, participei de uma Mesa de Debates, na sede da Associação Municipalista de Pernambuco (AMUPE), no Recife, em evento promovido pela VIRTÙ, Empresa Junior criada por estudantes do Curso de Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
O tema em discussão foi a reforma política e as implicações das coligações partidárias no aprimoramento ou não do processo democrático brasileiro.
Em 2014, o país completará 32 anos de eleições ininterruptas.
Em 1982, o calendário eleitoral foi retomado com as disputas pelos governos estaduais.
Em 1985, nas capitais e cidades consideradas áreas de segurança nacional e, em 1989, com as eleições presidenciais.
De lá para cá, partidos políticos nasceram e cresceram, houve fusões e incorporações, outros se mantiveram na cena política nacional com expressão média e muitas siglas sumiram do mapa.
Porém, o que marca de forma preocupante esse longo período de eleições consideradas democráticas é o abuso de poder econômico praticado pelo financiamento de campanhas e partidos pelas pessoas jurídicas inscritas no país.
Segundo prestação de contas publicada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2006, 55% dos eleitos para o Congresso Nacional, naquele ano, haviam sido financiados por doações oriundas de 220 corporações empresariais.
Em 2010, os valores se ampliaram.
Nesse contexto, o debate das coligações e da fidelidade partidária precisa ser feito com outros olhares.
Criticam-se as coligações proporcionais sob o argumento de que misturam alhos e bugalhos, alimentam partidos sem nitidez programática e ideologia, movidos apenas por contas eleitorais, sob controle de dirigentes perpétuos, cujas agremiações sequer fazem regularmente suas convenções partidárias com o voto direto de seus filiados.
Em suma, um grande negócio. É verdade que esse “monstro eleitoral” existe e sempre aparece nos palanques.
Acontece que os grandes acordos e interesses recíprocos entre os partidos não são costurados nos palanques de Vereadores e Deputados, mas, nos palanques majoritários, de Prefeitos a Presidentes da República.
Ali se forjam gigantescos palanques com os tempos de televisão e rádio de cada legenda, negociam-se previamente, em futuros governos, espaços em secretarias, empresas públicas e ministérios.
Ali, muitas vezes, são firmados compromissos de campanha que, depois, são solenemente esquecidos ou substituídos pelos interesses dos partidos e coligações na máquina pública.
Quem votou em FHC, em 1994, não ouviu daquela coligação que iria privatizar empresas públicas.
Quem votou em Lula, em 2002, não ouviu dos petistas e seus aliados, em campanha, um só discurso afirmando que adotariam as mesmas diretrizes econômicas do governo anterior, em especial, jogando os juros para o espaço no combate à inflação.
Por isso, o debate da fidelidade partidária, hoje restrito às relações entre os eleitos e seus partidos, deve ser deslocado para outro universo: aquele que expressa a fidelidade dos partidos em relação a seus eleitores.
Afirma-se que os mandatos são dos partidos.
Quando há mudança de sigla pelos eleitos, sem justa causa reconhecida pela Justiça Eleitoral, os detentores desses mandatos podem perdê-los.
O que acontece, entretanto, quando um Prefeito, um Governador ou um Presidente decide governar com medidas que não foram expostas em campanha e, muitas vezes, são até contrárias às opiniões e expectativas de seus eleitores?
Não há, nesses casos, a figura da infidelidade dos partidos a seus eleitores.
Por isso, a reforma política deve avançar em algumas direções.
A primeira delas é obrigar os partidos a terem convenções regulares obrigatórias, com direções eleitas pelos filiados, com mandatos estáveis.
Basta de partidos cujos dirigentes locais e estaduais são autênticos interventores, nomeados pelos dirigentes nacionais ad eternum, sem convenções oficiais.
A cada eleição, negociam palanques, apoios, cargos e seus interesses, sem a consulta aos filiados da legenda.
Em segundo lugar, os programas partidários devem ser registrados em cartório, como escrituras, títulos públicos, para que seus filiados e eleitores tenham a segurança mínima e o direito de cobrar os caminhos que os eleitos trilham ao chegarem aos governos.
O descumprimento desse programa ou sua substituição por medidas opostas deverão implicar na abertura de processo de infidelidade eleitoral, provocado por um determinado percentual de filiados ou de eleitores.
Por fim, a soberania do voto popular não pode ser substituída por “listas fechadas” feitas por cúpulas de partidos que sequer cultivam a própria democracia interna.
Retomada em 1982, a democracia foi tomada de assalto pelo capital privado no financiamento abusivo. É tutelada pelas máquinas governamentais repletas de cargos comissionados a serem oferecidos a aliados e pelos vícios inerentes ao processo de reeleição.
Se não houver mudanças, a democracia, hoje violentada, será apenas um simulacro de participação, caldo de cultura para negócios fabulosos, crimes meticulosos e pela lastimável apropriação do público pelo privado.