Por Noélia Brito Impressiona que depois de toda a repúdia demonstrada pela sociedade e pelos meios de comunicação de massa, sem falar da opinião públcia, por intermédio das Redes Sociais, inclusive com repercussão nacional, contra a censura imposta pelo presidente da Assembleia Legislativa, o deputado Guilherme Uchoa, utilizando-se do aparato judicial para tanto, ainda existam magistrados que insistem em descumprir a Constituição Federal, reeditando o vetusto expediente do “Cale-se”, de modo a criar verdadeiras situações de blindagem em favor de figuras públicas e em desfavor da democracia, da transparência e da sociedade.

Refiro-me à decisão do excelentíssimo Juiz da 24ª Vara Cível da Capital, Dr.

Gabriel de Oliveira Cavalcanti Filho, que acatando pedido da atual secretária de Educação de Ipojuca, Sra.

Margareth Zaponi, censurou dois professores da rede municipal de ensino daquela cidade e um comunicador, mandando que tomem “as providências para remover do facebook, bem como de outros meios eletrônicos de suas responsabilidade, toda e qualquer postagem que mencione o nome da autora ou a ela se refira, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) pelo descumprimento da ordem judicial.” A teratológica decisão foi proferida nos autos da ação 0074064-76.2013.8.17.0001, movida por Margareth Zaponi contra os professores Marilene Maria Lins Xavier, Leônidas Dantas de Castro e o comunicador Luan Carvalho Aprahamian.

A mesma agente pública, no caso, a secretária de Educação de Ipojuca, Margareth Zaponi, também tentou calar esta articulista, por meio de ação assemelhada, mas não obteve êxito, pois o nobre Juiz da 20ª Vara Cível da capital, Dr.

Paulo Torres P. da Silva, na ação de nº 0074071-68.2013.8.17.0001, negou a possibilidade da censura perseguida pela secretária de Educação de Ipojuca e ex-secretária executiva de Educação do governo Eduardo Campos, uma vez que, seguindo a pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, reconhece que “tem a Demandada o livre-arbítrio de manter ou retirar suas postagens, ou até mesmo postar outros, não sendo lícito ao Juízo interferir nesta decisão, sob pena de malferir preceito cogente de natureza constitucional.” Além disso, afirma em elogiável compasso com a jurisprudência de nossa mais Alta Corte de Justiça que “em nosso país, estas manifestações estão acobertadas pela Lei Maior, não devendo seu autor, sob nenhum pretexto, sofrer qualquer censura senão a responsabilidade, diante da contrapartida de poder ser condenado para que proceda a devida reparação caso esteja violando algum bem juridicamente protegido.” Ao final, recusando o papel de censor que alguns magistrados têm insistido em incorporar, ao arrepio da Lei Fundamental e da democracia que “Por isto, não sendo possível a este Juízo silenciar a Demandada, impõe-se a rejeição do pleito antecipatório.” O que causa admiração é que ambos os Juízes são experientes na análise desse tipo de matéria, porque ambos atuaram como juízes-coordenadores da Propaganda Eleitoral, durante pleitos dessa natureza.

Assim, não podemos descuidar que ambos estão mais que preparados para enfrentar e rechaçar qualquer tentativa pusilânime de reinstaurar a censura e a polícia política, mesmo que pela via judicial, contra a livre manifestação do pensamento e o livre acesso às informações, princípios que não podem ser desprezados em prol de blindagens a figuras públicas , que ao exercerem cargos ou funções públicas, notadamente se em escalões elevados e próximos ao poder central, têm dever de transparência, publicidade e probidade perante a opinião pública, devendo prestar contas, sim, à sociedade, quanto a todos os atos que estejam relacionados com a atividade pública exercida.

A jurisprudência, ao tratar da matéria, inclusive, destaca que figuras públicas estão muito mais sujeitas ao recebimento de críticas, mesmo que ácidas, que os demais cidadãos. É óbvio que aqui não se estar a defender a devassa de vidas privadas, mas em se tratando da vida pública, qual seja, aquela relacionada com o exercício de qualquer munus publico, essas críticas hão de ser toleradas.

Há de se rechaçar, com muito mais vigor, quaisquer tentativas, seja porque meio for, de criar imunidades como a concedida pelo Juiz da 24ª Vara Cível à secretária de Educação de Ipojuca e ex-assessora do governador Eduardo Campos.

Portanto, agiu em perfeita consonância com os princípios garantidores de nosso regime constitucional-democrático, o douto Juiz da 20ª Vara Cível da Capital, Dr.

Paulo Torres, ao negar tais abomináveis privilégios a essa ocupante de cargos públicos específica e que, nessa qualidade, toma decisões e administra políticas públicas e dinheiros também públicos.

Blindá-la, como fez o MM.

Juiz da 24ª Vara é o mesmo que proibir os cidadãos e os demais servidores públicos, no caso dos professores, de fiscalizarem e denunciarem quaisquer desvios seja de recursos, seja na própria política implantada, por ventura detectados na atuação da secretária.

A simples leitura da decisão do Dr.

Gabriel Cavalcanti demonstra que ali se perpetrou pesado golpe contra a democracia, quando determina que sejam excluído todos e quaisquer comentários que façam menção ao nome da secretária de Educação de Ipojuca, por parte dos professores Marilene Maria Lins Xavier, Leônidas Dantas de Castro e do comunicador Luan Carvalho Aprahamian, sem sequer avaliar se há qualquer ofensa à honra da secretária, o que, segundo o Juiz da 20ª Vara Cível, Dr.

Paulo Torres, que negou os privilégios pretendidos por Margareth Zaponi na ação movida contra esta que vos fala, só poderiam ser tidos e havidos como de conteúdo difamatório ou calunioso após decisão penal com trânsito em julgado: “Ao mesmo tempo, não é possível também admitir que as notícias tenham conteúdo difamatório ou calunioso, já que implicaria em juízo de valor de matéria penal, o que, sem uma decisão transitada em julgado, não é possível de ser entendido como tal.” Isso demonstra que a decisão censora do Juiz da 24º Vara Cível, Dr.

Gabriel Cavalcanti, comete pecados mortais contra a Constituição e contra a jurisprudência da Corte Suprema, portanto, contra a democracia.

Que o nobre Juiz nos perdoe a sinceridade, mas é a jurisprudência da mais Alta Corte de Justiça do País quem nos respalda.

A rigor, portanto, não é possível censurar o conteúdo das postagens feitas pelos professores e pelo comunicador, todos da cidade de Ipojuca, mas ainda assim, acaso constatada a ocorrência de eventuais crimes contra a honra da secretária, caberia ao magistrado indicar uma a uma as postagens a serem excluídas, por estarem dotadas dessa mácula e não, de forma genérica, mandar excluir toda e qualquer citação contendo o nome ou o cargo da secretária Margareth Zaponi, pois sua decisão findou por atribuir à secretária Margareth Zaponi uma redoma protetiva que somente pessoas altamente privilegiadas e próximas ao governador Eduardo Campos obtiveram do Judiciário pernambucano, falo do presidente da Assembleia Legislativa de Pernambuco, Guilherme Uchoa e do marqueteiro do PSB, o banqueiro, publicitário e empreiteiro Antônio Lavareda.

A justiça que cria privilégios se transmuta, facilmente, em injustiça e é por isso que repugna a todos nós, cidadãos comuns e contribuintes da pesada carga tributária que a banca, ver a justiça desviada de sua razão de existir.

O que quer esconder a secretária Zaponi, a ponto de levá-la a procurar a Justiça para censurar quem ousa sequer mencionar seu nome?

Talvez a resposta esteja na própria decisão proferida pelo Juiz Paulo Torres, na ação que a secretária Zaponi move contra mim, na tentativa vã de me calar: “Vale registrar que uma das notícias apenas menciona a existência de uma ação penal promovida contra a Demandante, o que, ante o caráter público de que se revestem as medidas judiciais, menos ainda pode ser objeto de censura.” Pois é, como podemos observar, a secretária Zaponi quer ocultar, da opinião pública, fatos e informações de caráter eminentemente públicos, como esse de que desde o dia 09 de maio deste ano, quando foi publicada a decisão do Juiz Federal Marllon Souza, da 11ª Vara Federal de Minas Gerais, no processo criminal nº 20631-89.2013.4.01.3800, destinado a apurar Crimes de Responsabilidade que teriam sido praticados por ela, juntamente com o prefeito cassado da cidade mineira de Ribeirão da Neves é ré em processo criminal.

O caso vinha sendo investigado desde 2004, pela Polícia Federal, por meio do Inquérito nº 757/2004.

Da decisão – pública - da Justiça, é possível apreender que “em relação à prática da conduta típica descrita no art. 1º, II, do Decreto-Lei 201/67, por Aílton de Oliveira, Margareth Costa Zaponi e Otávio Gouvêa Ferreira, estão presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, sendo cumpridos os requisitos formais do art. 41. do Código de Processo Penal.” O processo criminal a que responde a Secretária de Ipojuca, na Justiça Federal de Minas Gerais é pelo Crime de Responsabilidade por ter, segundo o MPF, juntamente com o prefeito tucano de Ribeirão das Neves, Aílton de Oliveira, utilizado, indevidamente, em proveito próprio ou alheio de bens, rendas ou serviços públicos.

Outra informação que a secretária de Educação de Ipojuca quer censurar é a de que o governador Eduardo Campos contratou a Universidade de Juiz de Fora por R$ 28,4 milhões, para prestar consultoria às Escolas estaduais.

O Convênio com a Universidade mineira foi celebrado durante a gestão de Margareth Zaponi como secretária executiva de Rede do governo do Estado, tendo contratado novamente a mesma entidade, só que desta feita já como secretária de Educação de Ipojuca, por exorbitantes R$ 2,2 milhões, agora para prestar consultoria à Rede Municipal de Ensino de Ipojuca.

Tudo sem licitação e publicado no Diário Oficial.

Tal atitude da secretária causa espécie, pois se estão no Diário Oficial do Estado, por que querê-las sigilosas a ponto de censurá-las por meio de decisão judicial?

Por fim, a secretária de Ipojuca também quer censurar a informação comprovada pela Ata de Reuniões de Monitoramento do governo do Estado de Pernambuco, relativa ao mês de agosto de 2011, de que durante a 3ª Reunião de Monitoramento que teve com o governador Eduardo Campos, no dia 09/08/2011, apresentou a proposta para os critérios de distribuição dos tablets ao Chefe do Poder Executivo e que, no dia 24/08, em reunião interna, apresentou proposta de custos e de distribuição dos mesmos tablets.

Ora, se a agenda oficial do governador e de seus subordinados é e deve ser pública e se o próprio governo Eduardo Campos defende a tese de que nenhuma irregularidade houve nos contratos de sua gestão com a IDEIA DIGITAL, empresa investigada, como todos sabem, pela Polícia Federal, na cidade de João Pessoa, utilizando-se supostamente de laranjas para fazer lavagem de dinheiro para campanhas eleitorais do PSB, então por que tanta preocupação da secretária Zaponi em censurar tais informações públicas?

Será que ela não confia na seriedade de tais contratos e por tal razão não quer seu nome associado a eles?

Tudo que não é transparente deixa dúvidas.

Se a secretária ou quem quer que seja não deve, não teme e não tem nada a esconder da opinião pública, por que usar o Judiciário para calar quem ousa divulgar - e não criar -, fatos, cuja publicidade é de sua própria natureza?

Ontem, este Blog divulgou a decisão do nobre Juiz da 20ª Vara Cível da Capital, Dr.

Paulo Torres, rechaçando a censura pretendida pela secretária de Educação de Ipojuca contra esta articulista e no título da matéria trazia o seguinte: “Justiça do Recife volta a defender liberdade em opinião em blogs”.

A decisão do Juiz Paulo Torres é exemplar e nos traz renovadas esperanças de uma justiça mais próxima da sociedade e mais distante dos poderosos e, assim, como na história do ferreiro que advertia o rei, um déspota que se dizia esclarecido e que queria atropelá-lo em seus direitos pelo simples fato de ser o rei, de que ainda havia juízes em Berlim, folga-nos saber que ainda existem juízes em Pernambuco.

Noelia Brito é advogada e procuradora do Município do Recife