Por Noelia Brito, advogada e procuradora do Recife O recrudescimento da violência policial observada nas últimas manifestações de rua, em Pernambuco, deixa claro que esse modus operandi não pode ser avaliado como resultado de ações individuais ou pontuais de alguns integrantes da corporação.
Por óbvio, policiais militares e até mesmo civis, acostumados e doutrinados dentro de rigorosa hierarquia, onde o mínimo descumprimento de ordens superiores ocasiona severas punições e, em alguns acasos, até mesmo prisões administrativas, no caso da PM, não estariam praticando de forma sistemática os abusos flagrados pelas câmeras da imprensa, de populares e da própria Secretaria de Defesa Social, sem falar do que tem sido documentado em termos e boletins de ocorrências policiais, reportagens e depoimentos de vítimas e testemunhas, se não estivessem cumprindo ordens emanadas da cadeia de comando da própria polícia, que tem no topo o secretário de Defesa Social, Wilson Damásio e o governador do Estado, Eduardo Campos.
O governo Eduardo Campos sempre se gabou de manter todos os serviços públicos sob sua rigorosa fiscalização, através de monitoramentos e reuniões onde são exigidas prestações de contas e índices de produtividade que demonstrem, para a opinião pública, a excelência do governador Eduardo Campos, como gestor, a ponto de estar qualificado para, como presidente da República, “fazer mais e melhor”.
Ora, se é assim, como crer que vários policiais venham realizando arbitrariedades, conforme registrado, repito, pela própria imprensa, esta também, muitas das vezes, inclusive, vítima dessas arbitrariedades, sem que o governador e seu secretário tenham conhecimento?
A cidade está toda monitorada por câmeras da SDS, principalmente, o centro da cidade.
Como, então, o secretário e o governador podem afirmar que não tinham conhecimento de que, não de hoje, esses abusos vinham sendo cometidos?
De duas uma: ou o secretário Wilson Damásio e o governador Eduardo Campos sabiam e estavam se omitindo com relação a esses abusos e agressões praticadas pela polícia sob seu comando, o que comprova acefalia da segurança pública do Estado ou partiam, deles próprios, as ordens para que tais abusos fossem praticados.
O que mais nos chama a atenção no modus operandi da polícia pernambucana, nos últimos protestos e manifestações de rua, é sua total desinibição em atuar de forma truculenta e arbitrária contra manifestantes – e não falo apenas quanto aos jovens que têm protestado pelo “passe livre”.
Em Olinda, recentemente e só para dar mais um exemplo, estudantes que protestavam exigindo o término de obras de reforma em uma escola pública, foram brutalmente reprimidos, na base do cassetete, pela mesma polícia que reprime as manifestações pela melhoria do transporte público.
Mesmo cientes de que as agressões estão sendo registradas em vídeo, fotos e acompanhadas ao vivo e a cores por seus superiores hierárquicos, através das câmeras de monitoramento da SDS, policiais, inclusive com patente, agem de modo violento e desrespeitoso, como que seguros de sua impunidade.
Se agem assim, quando na frente das câmeras, da imprensa e dos próprios superiores hierárquicos, como não agirão nas periferias da cidade, onde tais registros não são corriqueiros?
O que temos assistido, horrorizados, durante os protestos e manifestações de estudantes por melhorias no transporte, na educação e na saúde, ou seja, nos serviços públicos básicos, é apenas uma amostra do que essa mesma polícia pratica contra a juventude nos subúrbios.
O descaso do governo Eduardo com a juventude e que ele tenta mascarar com apresentação de índices e mais estatísticas de um “Pacto pela Vida” que efetivamente não corresponde à realidade vivida pelos cidadãos pernambucanos, a cada dia mais familiarizados com a violência, inclusive policial, é patente quando observamos que jovens precisam protestar para que uma reforma de uma escola seja finalizada, para que a transferência da gestão das escolas estaduais para os municípios, sem que para isso os maiores interessados sejam consultados ou informados previamente, seja sustada e analisada democraticamente pela comunidade e para que o acesso à escola e ao lazer seja efetivo, inclusive com a implantação do “passe livre”.
O que dizer dos jovens recolhidos nas unidades da FUNASE?
Denúncias de maus tratos, rebeliões, mortes e até decaptações são a realidade dos jovens ali recolhidos e que, em tese, estão ali para ressocialização e reeducação.
Que tipo de ressocialização o governo Eduardo está oferecendo aos menores infratores, se o ambiente em que se encontram recolhidos para reeducação e posterior reinserção na sociedade é totalmente degenerado e só contribui para uma maior marginalização desses jovens, quando de seu retorno ao convívio social?
Quais as ações efetivas do governo Eduardo Campos contra o crack, por exemplo, que ceifa a vida de nossos jovens em progressão que se observa geométrica?
Se para os jovens que protestam por uma vida mais digna, a solução oferecida pelo governo Eduardo é a chibata e a repressão mediante prisões arbitrárias, como acreditar que para os jovens infratores e em situação de risco pelo vício ou pelo tráfico ou pela prostituição, o tratamento seja diferenciado?
A política de Eduardo Campos para a juventude deve ser, a partir do que se tem observado nos recentes protestos, onde reina a repressão e a difamação contra os integrantes dessas manifestações de cidadania, chamados de bandidos, terroristas, vândalos, para justificar o arbítrio estatal de um governo que por cooptar partidos políticos, autoridades e parlamentares desaprendeu, se é que um dia soube, a conviver com a diversidade e a oposição, deve ser alvo de não apenas uma reflexão, mas de uma profunda e urgente auditoria, pois se os jovens tomam as ruas para expressar sua insatisfação com as políticas públicas de um governo é porque há muita coisa errada que o marketing estatal não consegue mais esconder.
E essa é a grande raiva de Eduardo Campos contra esses jovens, sua incapacidade de cooptá-los.