O então dirigente maior do Ministério Público do Estado de Pernambuco, Paulo Varejão, tentou, sem sucesso, constranger o Blog de Jamildo, entrando com uma ação na Justiça do Estado pedindo danos morais por informações divulgadas pela coluna eletrônica, durante as eleições para o comando da instituição, em 2011.

A vitória do blog ocorreu em agosto passado e está sendo revelada agora aqui para mostrar que o caso Guilherme Uchoa não é algo isolado.

A vitória na Justiça mostra a firmeza do Judiciário local na defesa da liberdade de informação.

Na mesma ação, foi ajuizado o portal JC Online, que pertence ao sistema JC como o Blog de Jamildo.

Após pressão, Guilherme Uchôa retira ação de censura contra Jornal do Commercio Na sentença, o Juiz de Direito Isaías Andrade Lins Neto, da 33.ª Vara Cível da Comarca da Capital, ressalta que censurar ou desencorajar a atuação da imprensa nesse sentido, além de confrontar diretamente o direito à liberdade de imprensa, limitaria o direito à informação dos administrados, que são os maiores interessados em fiscalizar a possível ocorrência de ingerências na atuação do Poder Público. “O episódio descrito nos autos, iniciado com a denúncia feita na reportagem e seguido dos esclarecimentos do Ministério Público, serviu apenas para dar transparência ao momento político vivenciado pelo órgão, precisamente na época das eleições para o cargo de direção da instituição.

Posto isto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO e condeno os autores ao pagamento das custas processuais (já satisfeitas) e honorários advocatícios que arbitro em R$ 700,00 (setecentos reais)”, escreveu o magistrado.

O magistrado esmiuça uma questão fundamental, falando que a jurisprudência da Corte Superior firmou-se no sentido de que não se configura o dano moral quando a matéria jornalística limita-se a tecer críticas prudentes - animus criticandi - ou a narrar fatos de interesse público - animus narrandi.

Há, nesses casos, exercício regular do direito de informação. “O administrador público sabe que está exposto às mais duras críticas, cabendo ao mesmo prestar à sociedade os esclarecimentos necessários, tendo, na hipótese posta em pretório, havido a colocação do mesmo veículo de informação à disposição dos envolvidos, com a necessária manifestação do Procurador Geral de Justiça e dos integrantes da Comissão de Licitação do Ministério Público”. “Cabe salientar que um dos importantes papéis desempenhados pela mídia é dar publicidade aos atos praticados pelos gestores e agentes públicos, facilitando a ciência dos administrados sobre aqueles que são praticados no seio da administração pública.

De fato, a conduta abusiva caracterizada pela publicação de matérias desabonadoras, que ofendam a honra objetiva e subjetiva da pessoa, não pode ser tolerada, uma vez que se estaria permitindo o abuso do direito de liberdade de expressão em detrimento do direito à imagem.

Ocorre, porém, que a reportagem de autoria do primeiro demandante, em sentido contrário à tese defendida na peça inaugural, possuiu a clara finalidade de narrar os fatos descritos em denúncias, expondo ao público a possibilidade da existência de irregularidades no Ministério Público, dando ao Órgão Ministerial a oportunidade de esclarecer à sociedade os fatos ocorridos", descreve. “Não há indícios de que o primeiro demandado teria agido com a intenção necessária à caracterização do dano indenizável, limitando-se a narrar o conteúdo de denúncias.

Ressalte-se, ainda, que além de ter baseado sua matéria em denúncias, o autor da reportagem oportunizou aos demandantes o direito à resposta, sendo esta publicada no próprio blog dos demandados, um dia após a divulgação da matéria aqui discutida”, afirma.

Qual a relação possível com o caso do presidente da Assembleia Legislativa?

O juiz Isaías Andrade Lins Neto cita uma vasta jurisprudência mostrando que os homens públicos não estão imunes ao questionamentos. “É necessário salientar que a proteção ao direito da imagem dos agentes públicos não merece tanto rigor quanto àquela conferida aos que não exercem tais funções, uma vez que se poderia colocar em risco a própria transparência dos atos praticados no seio da administração pública”, cita. “A doutrina já se manifestou acerca da mitigação parcial do direito à imagem dos agentes públicos: As pessoas sem notoriedade e que não exercem atividade pública merecem proteção à honra em maior latitude que aquelas outras que, por uma razão ou outra, estão mais sujeitas a um controle rígido da sociedade, pela natureza da atividade que livremente escolheram.

Esta assertiva não implica dizer que os homens considerados públicos, não mereçam ter a honra tutelada e garantida contra ataques, mas que a proteção tem de ser mais débil. […]De ponderar que as pessoas que se tornam notórias, conhecidas pelo público em geral, normalmente atraem sobre si manifestações e juízos de valoração nem sempre favoráveis, por melhores que sejam tais pessoas. ( Dano moral indenizável., Antônio Jeová Santos, 3. ed.

São Paulo: Método, 2001, p. 356-358).

Observe-se também que “as pessoas públicas estão mais expostas às críticas, de modo que devem ter a proteção de sua imagem mitigada em relação às pessoas sem essa notoriedade.”, cita.

Mais doutrina O Supremo Tribunal Federal tem destacado, de modo singular, em seu magistério jurisprudencial, a necessidade de preservar-se a prática da liberdade de informação, resguardando-se, inclusive, o exercício do direito de crítica que dela emana, por tratar- se de prerrogativa essencial que se qualifica como um dos suportes axiológicos que conferem legitimação material à própria concepção do regime democrático. - Mostra-se incompatível com o pluralismo de idéias, que legitima a divergência de opiniões, a visão daqueles que pretendem negar, aos meios de comunicação social (e aos seus profissionais), o direito de buscar e de interpretar as informações, bem assim a prerrogativa de expender as críticas pertinentes.

Arbitrária, desse modo, e inconciliável com a proteção constitucional da informação, a repressão à crítica jornalística, pois o Estado - inclusive seus Juízes e Tribunais - não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais da Imprensa. - A liberdade de imprensa, enquanto projeção das liberdades de comunicação e de manifestação do pensamento, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar. - A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas ou as figuras notórias, exercentes, ou não, de cargos oficiais. - A crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade. - Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. - A matéria jornalística, mesmo de conteúdo sarcástico, divulgada no exercício do direito-dever inerente a profissão, não ofende a honra do indivíduo se não resta comprovado o abuso ou má-fé com o propósito de atingir a dignidade ou difamar o apelante, ainda mais quando somente reproduzindo o que era largamente veiculado por outros meios de comunicação, e fazendo críticas coerentes com o momento político vivido.

Entenda o caso “Na AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS aforada por PAULO BARTOLOMEU RODRIGUES VAREJÃO e outros em face de JAMILDO MELO e JC ONLINE (Sistema Jornal do Comercio de Comunicação), os autores alegam que os réus efetuaram publicação de informações que atingem a sua honra, por meio de uma matéria veiculada na internet”. “Segundo a tese sustentada na exordial, no dia 04/01/2011, o primeiro demandante publicou em seu blog uma matéria afirmando que, durante o período das eleições para a função de Procurador Geral de Justiça, diversos promotores do interior teriam sido beneficiados com novos carros oficiais.

Além disso, o autor da reportagem teria afirmado que a licitação para a locação dos veículos teria sido superfaturada, alcançando o montante de três milhões de reais.

Alegando que os veículos são utilizados apenas em missões oficiais e que não há qualquer denúncia formal perante os órgãos de fiscalização interna ou externa, postulam, ao final, a indenização pelos danos morais sofridos em razão da publicação da reportagem desabonadora.

Em sua contestação, os réus afirmam que foi dado o direito de resposta aos autores, tendo sido publicado, no dia 05/01/2011 uma nota oficial, exarada pelo Procurador Geral de Justiça.

Desta forma, não restou caracterizado qualquer dano moral ou conduta ilícita por parte dos demandados”. “A reportagem que levanta dúvidas sobre a lisura do processo licitatório, mesmo com o tom sarcástico, tratando-se de relevante interesse social, pois envolve o uso e a aplicação do dinheiro público e ocorreu exatamente na época das eleições da nova diretoria do órgão, não pode gerar o direito à indenização pretendida sob pena de implicar em tolher a atuação dos órgãos de comunicação, considerando que não houve afirmação de cometimento de ilícito por qualquer dos citados, mas apenas suspeita de irregularidade no processo como um todo.

E os fatos denunciados, como não poderia ser diferente, foram veementemente rebatidos pelo Procurador Geral e pela Comissão de Licitação, trazendo à sociedade todas as informações necessárias para esclarecer a questão e demonstrar a atuação competente e séria do Ministério Público de Pernambuco, cuja imagem, evidentemente, não restou maculada no episódio narrado nos autos”.

Assim, aproveito este post, além de enaltecer a lucidez do magistrado Isaías Andrade Lins Neto, para louvar a competência e qualidade da banca de advogados do JC, na pessoa da advogada Eveline Bacelar.

Por oportuno, destado ainda que nem tenho nem nunca tive nada pessoal contra Paulo Varejão.

Nem antes nem depois do episódio.

Outros blogs locais o fizeram e não tiveram o mesmo tratamento, a TV Globo local idem, nem se tem notícia de ação judicial.

Veja a decisão: