Por Manuela Dantas, especial para o Blog de Jamildo Há pouco li um depoimento de um amigo, que como eu também ficou paraplégico em um acidente.

O depoimento discorria sobre a dedicação, o amor e o companheirismo do seu pai.

As palavras dele me emocionaram, principalmente, por me fazerem refletir sobre a importância da presença da minha família na reabilitação que passei após o acidente que vivi.

Não foi fácil para mim receber o diagnóstico de paraplegia, como também não foi fácil para a minha família encarar o diagnóstico de deficiência em um filho, já que algo nessa proporção transforma e modifica a vida do filho, mas também dos seus pais.

Nesse momento todos os sentimentos se misturam: revolta, dor, indignação, negação, tristeza, melancolia, mas também, a união, a força, a fé, o carinho e muito amor.

Após essa confusão de sentimentos vem a determinação e a necessidade de lutar para conseguir reconquistar e se adaptar as novas condições do corpo e para isso precisamos freqüentar um centro de reabilitação, até termos conseguido reaprender a viver com essas novas condições do nosso corpo.

Após o período de reabilitação intensiva em um Centro específico para esse fim, o tratamento é continuo, não há prazo para acabar…

Mas há esperança, fé e a alegria de ver cada pequena conquista, como uma vitória sem precedentes.

O fato é que desde o acidente que vivenciei, a minha mãe abdicou da sua vida em companhia do meu pai em Picos (PI) para se dedicar a me acompanhar nos 10 meses que morei em hospitais e continua comigo até hoje…

Foi fundamental para minha recuperação contar com ela, como também com meu pai, meus irmãos, meus padrinhos durante a minha fase de adequação as limitações que meu corpo me impelia e mais importante ainda foi o apoio psicológico que uma mudança nessa proporção requer e que a confiança da presença da minha família me proporcionaram sobremaneira.

Lembro-me dos meus dias de reabilitação em um hospital em São Paulo e me chamou sempre a atenção a presença constante dos familiares dos outros pacientes e de como era fundamental a motivação que eles transmitiam e o amor com que tratavam seus entes queridos.

Não por acaso, chego a dizer que a família é a peça chave nessa reabilitação e na continuidade da vida saudável de integrantes que tenham passado por traumas tais quais lesão medular, AVC, traumatismo craniano, amputações e outras seqüelas graves de acidentes, doenças, violência urbana e tantas outras causas.

Devido as minhas novas necessidades, a minha mãe aprendeu e me estimula a fazer exercícios físicos todos os dias, como também aprendeu a fazer sondagem para me ajudar nas novas rotinas diárias, as quais tive que me adequar e a nova vida para a qual tive que me reinventar.

Mas como diria Abraham Lincoln: " Ser feliz não é ter uma vida perfeita, mas deixar de ser vítima dos problemas e se tornar o autor da própria história" .

A verdade é que nesse caminho de descobertas, em que minha vida ficou longe da perfeição e que tive que enfrentar uma rotina diária de problemas, tive, felizmente, a doçura dos cuidados da minha mãe, a racionalidade e a firmeza das palavras do meu pai, a companhia e os conselhos dos meus padrinhos e o carinho e a atenção da minha avó e irmãos.

Confesso que não saberia responder se teria conseguido superar com a mesma lucidez e firmeza o trauma, a dor da indiferença, as limitações de possibilidades e a ausência constante de acessibilidade em todos os lugares, se não houvesse a motivação e a presença da minha família.

E com essa motivação especial já recuperei parte dos meus movimentos perdidos e tenho nesses 3 anos sempre uma nova descoberta de pequenos ganhos, que podem ser mínimos para quem esteja distante da realidade, mas que para mim são enormes, nesse período aprendi a usar os movimentos preservados de forma mais ativa para possibilitar a minha independência diante da impossibilidade de andar, como também voltei a trabalhar e continuo me sentindo útil para a sociedade, escrevo sobre acessibilidade, participo de movimentos sociais e vivo, tal qual, Dom Quixote enfrentando meus moinhos de vento e lutando pela felicidade.

Por esta e outras razões quando vejo as famílias desistindo de lutar com os seus filhos com deficiência por melhorias da qualidade de vida dos mesmos, mesmo pequenas, por acharem não serem mais necessárias ou suficientes, lembro também da mãe de uma pequena garota de 10 anos que fazia ecoterapia comigo no Parque de exposição do Cordeiro e que pelo menos 1 vez por semana vinha com a criança nos braços de Vitória para Recife utilizando transporte público e que quando questionada se valia a pena todo aquele trabalho para levar a filha aquela terapia, ela sempre respondia que a alegria que sua filha ficava quando estava cavalgando não tinha preço.

Como também não tem preço valorizar os pequenos momentos de felicidade e fazê-los sobrepor as dificuldades diárias, apenas para lutar pela felicidade de um filho que pode não ter a autonomia esperada, mas garantem, com certeza, a maior alegria que a vida pode proporcionar, a alegria de serem, verdadeiramente, pais.