Foto: Clemilson Campos/JC Imagem Da Agência Estado Esquecida no agreste de Pernambuco, a cidade de Cupira é cenário da confluência de duas forças políticas que não conseguiram somar resultados.

Em 30 de agosto de 2011, a presidente Dilma Rousseff e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, visitaram a cidade para a assinatura da ordem de serviço de duas barragens que deveriam ter ficado prontas no ano passado.

Até hoje, os projetos mal saíram do papel.

A dobradinha entre Dilma e Campos, prováveis adversários em 2014 como candidatos do PT e do PSB, não conseguiu resolver o risco de enchentes a que estão expostos os moradores da região.

Problema que só não foi maior por causa do menor volume de chuvas neste inverno.

As barragens Panelas II e Gatos foram as primeiras obras que tiveram a ordem de serviço assinada por Dilma em cerimônia oficial.

Fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e somam R$ 65 milhões, bancados pela União (R$ 50 milhões) e por Pernambuco (R$ 15 milhões).

Cerca de 400 mil pessoas seriam beneficiadas pelo conjunto de barragens, que inclui a de Serro Azul, na mesma bacia hidrográfica e também inacabada. “Essa parceria com o governo do meu querido Eduardo Campos é a parceria da prevenção.

Estamos aqui para impedir que esta região seja outra vez assolada por essa catástrofe que desencadeia dramas humanos”, discursou Dilma na época.

Dois anos depois, a retórica política não rendeu frutos.

Visitados pelo Estado na terça-feira, os canteiros de Panelas II e Gatos são um cenário de máquinas paradas, poucos operários e terreno alagado pelas chuvas, que atrasam ainda mais o cronograma.

Em Panelas II, as precipitações têm atrapalhado a terraplenagem e dificultado o transporte de materiais.

Segundo engenheiros que atuam nas obras das barragens, só 5% de todo o planejamento já foi realizado. “Deus permita que essas barragens deem certo, porque se não der certo, não vamos ter para onde correr.

Vamos todos morrer”, afirmou a dona de casa Maria José dos Santos, de 44 anos.

Mãe de dois filhos e beneficiária do Bolsa Família, ela perdeu uma casa nas enchentes de 2010, quando uma catástrofe castigou Belém de Maria, cidade vizinha a Cupira que deve ser protegida pelas barragens. “Perder uma casa é como um filme de terror.

A gente acha que só acontece com os outros, que nunca vamos passar por aquilo. É um pesadelo”, disse Maria José.

A nova casa já teve uma parede derrubada pelas chuvas, que levaram a geladeira para o meio da rua.

Planejamento O caso de Panelas II é emblemático de como a falta de planejamento pode comprometer a realização de uma iniciativa.

O projeto básico da barragem continha uma série de falhas, conforme apontado por auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU).

Segundo o TCU, “a fragilidade da investigação geológica era de tal magnitude que (…), logo nas primeiras visitas ao local da obra, foi constada a impossibilidade de se manter o eixo da barragem”.

Para piorar, a planilha orçamentária continha itens com elevado sobrepreço. “Os problemas identificados no projeto básico já tiveram como reflexo o atraso no cronograma de execução das obras”, avaliou o TCU, em fiscalização concluída em abril de 2012. “A aprovação de projeto básico deficiente pelo Ministério da Integração Nacional (…) deu causa à presente irregularidade, na medida em que permitiu a transferência de recursos federais para a execução de um objeto com nível de precisão inadequado para caracterizar a obra, sem que houvesse certeza de sua viabilidade técnica e econômica.” O Ministério da Integração Nacional é comandado por Fernando Bezerra Coelho, do PSB - em janeiro de 2012, o Estado informou que Pernambuco, terra natal do ministro, concentrou 90% dos gastos da pasta destinados à prevenção de desastres naturais, em obras iniciadas em 2011, como as barragens.

Entrega A placa da obra de Panelas II informa que a barragem ficará pronta em março de 2014, mas o ministério e a Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos de Pernambuco, em resposta à reportagem, prometeram entregá-la em maio - Gatos ficaria pronta em junho. “A gente sabia desde o início que eles não iam conseguir fazer as barragens nesse prazo de um ano.

A presidente se empolgou com o governador”, disse o secretário de Governo de Cupira, José Edvan da Silva.

Além do atraso na obra, o agricultor José Cícero da Silva, de 48 anos, vizinho da futura barragem de Panelas II, se queixa do valor “constrangedor” da indenização paga pelo Estado - R$ 47 mil.

Seu colega Gilson Luciano, de 39, afirma ter visto pouca movimentação na obra desde que Dilma e Campos puseram os pés em Cupira. “Atrasado é pouco, está bem atrasado.

Isso aí é para 2020, visse?” Em andamento O Ministério da Integração Nacional informou que as obras de Panelas II e Gatos estão em “plena execução” e estão sendo elaboradas forças-tarefa que vão colocá-las “dentro do cronograma pactuado”.

Sobre Panelas II, a pasta alega que “o projeto básico foi elaborado em padrão compatível” com o de obras executadas em solos de características similares e que a aprovação do projeto é de responsabilidade do executor - o governo estadual.

A Secretaria de Recursos Hídricos e Energéticos de Pernambuco afirmou que, mesmo enfrentando um período de chuvas, os trabalhos não precisaram ser “paralisados, apenas sofreram adaptações”.

Houve distrato da licitação anterior de Panelas II e nova licitação foi realizada para o serviço.

Pernambuco pagou R$ 8,5 milhões pelos serviços da primeira empresa.