Por Paulo Rubem Santiago, deputado federal (PDT/PE) As manifestações que estão ocorrendo no país colocam, na pauta da mídia e dos partidos políticos, uma questão essencial: De que forma podem interferir nos rumos das políticas governamentais e na vida das organizações partidárias existentes hoje no Congresso Nacional?
Antes dos conflitos verificados em São Paulo, motivados pelas reações da população ao reajuste das tarifas de transporte dos ônibus urbanos, parecia que vivíamos em um contexto previsível.
A sociedade havia votado, a poucos meses, nos gestores municipais e nos vereadores, reelegendo alguns e elegendo novos gestores para quase todas as cidades brasileiras.
Sindicatos e centrais sindicais seguiam trabalhando com foco nas suas pautas salariais e pela aprovação de importantes projetos no Congresso Nacional.
Com as manifestações paulistas, entretanto, parece-nos que o que estava contido, reprimido e amordaçado, em várias frentes, veio à tona.
Um motivo?
Cito alguns.
As insatisfações decorrentes dos elevados gastos realizados com a reforma e construção de arenas para a realização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo, questões da educação e da saúde mal enfrentadas e atendidas pelos governos e a falta de ações amplas, preventivas e coordenadas contra a corrupção.
Fica, então, evidente que as dezenas de conferências nacionais, realizadas nos últimos anos, não foram suficientes para acolher as reivindicações e dar-lhes respostas efetivas em muitas das áreas debatidas.
Embora tenhamos avançado nessas práticas, espalhadas em milhares de cidades e dezenas de estados da Federação, percebe-se que há um hiato e uma frustração com essas mobilizações oficiais e o retorno de seus gritos na sociedade.
Educação insatisfatória, saúde precária e progressivamente privatizada, transporte inadequado e práticas de corrupção que não se esgotam em todos os níveis de governo fizeram com que a sociedade transmitisse um claro recado aos governantes, ao parlamento e aos partidos majoritários na gestão pública do país.
As manifestações provocaram também algumas sérias reflexões.
Por que, no país que elevou sua carga tributária de 24% para próximo de 40% em menos de 15 anos, as autoridades alegam não haver recursos para financiar, com qualidade, o acesso à educação e à saúde?
Por que, no país que se coloca entre as oito maiores economias do mundo, ainda há tão baixa participação dos salários na riqueza nacional?
Por que, no país da responsabilidade fiscal, 44% das receitas do tesouro estão comprometidas com juros e amortização da dívida pública, pela qual se desviam receitas da maioria da sociedade para a minoria que enfraquece a produção e fortalece a esfera financeira na acumulação de riquezas?
Por que?
Porque não temos democracia de fato na escolha das decisões e caminhos para a economia e as finanças brasileiras.
A economia, de forma distinta das demais áreas do conhecimento humano, desloca-se do campo da democracia e, mesmo, da influência do saber acadêmico, conduzindo-se por meio de dogmas, convenções, manias e modismos.
Tudo isso sob tutela de um seleto grupo de sábios que tomam decisões consideradas “técnicas” e “neutras” em termos de política econômica.
São os mesmos que falam em blindar essas decisões de “más” influências da política (e talvez considerem-nas, também, fruto da democracia).
Por que?
Porque vivemos, há quatro décadas, um novo modelo de acumulação do capital no país e no mundo.
As potências centrais redesenham a ocupação do palco da economia.
Alguns países são atores principais, movem fundos, capitais, produzem ciência e exportam bens de alta tecnologia.
Outros, secundários, exportam bens primários, capitais pela dívida pública e seguem periféricos, tal qual as colônias de Portugal e Espanha, no século XVI.
Para revertermos isso, precisamos de mais acesso às informações sobre o mundo e dos conflitos de interesse na economia.
O debate conduzido pela democracia e pela política deve gerar escolhas, em diálogo com entidades sociais e universidades, sem segredo e sem sábios que se isolam do povo.
Para tanto, os partidos políticos, as centrais sindicais e demais entidades sociais cumprirão papel fundamental se conseguirem se desamarrar de governos (os partidos) e de partidos (as centrais e entidades sociais) para exercerem a crítica coletiva capaz de lançar novos rumos para a Nação, sua economia e seu desenvolvimento.
As ruas falaram por mais democracia, mais e melhores direitos, hoje mal atendidos pela supremacia dos interesses das finanças privadas sobre as decisões econômicas e as contas públicas nacionais.
Desatrelar, pensar, analisar, debater e tomar decisões.
Esses são os caminhos em favor do país e do futuro.