O livro do jornalista Otávio Cabral sobre a vida de José Dirceu é excelente.
Numa das passagens, ele acaba revelando a origem das escaramuças públicas entre os dois ex-ministros de Lula.
O episódio está no capítulo 17, intitulado a primeira queda.
Depois das revelações do presidente do PTB, Roberto Jefferson, à Folha de São Paulo explicando o funcionamento do Mensalão, em junho de 2005, o ex-ministro da Casa Civil começa a cair em desgraça com Lula e tenta a todo custo impedir a instalação de uma CPI no Congresso, para apurar as primeiras notícias do escândalo.
Por uma causa maior, a sobrevivência do governo Lula, os ministros da Casa Civil (Dirceu) e da Coordenação Política (Aldo Rebelo) deixaram os quinze meses de conflito político de lado e naquela noite de 30 de maio, selaram um armistício.
Juntos, foram à casa do presidente do PTB com o objetivo de convencê-lo a retirar o apoio do seu partido á tentativa de instalar uma comissão parlamentar de inquérito para investigar as denúncias de corrupção nos Correios.
Além de Jefferson, outros 16 deputados petebistas já haviam assinado o pedido.
Jefferson estava revoltado por entender que o governo manobrava para poupar o PT, sobretudo Dirceu e Lula.
Ele já havia feito dois alertas ao presidente sobre a existência e extensão do Mensalão.
O que mais o chateou foi uma entrevista do então presidente do PT, José Genoíno, defendendo que o governo precisava “requalificar” sua base de apoio, como se apenas o PTB participasse de patifarias.
A estratégia de Dirceu para evitar a CPI era simples.
Os parlamentares do PT que assinassem a CPI seriam ameaçados de expulsão.
Os aliados receberiam verbas do orçamento e as nomeações que estavam represadas caso recuassem e os oposicionistas amigos seriam procurados pelo próprio Dirceu.
Já Lula tinha a avaliação inicial de que a CPI dos Correios poderia ser a oportunidade para se livrar do chefe da Casa Civil sem comprometer seriamente seu governo, mas depois Lula percebeu que corria o risco de perder a reeleição e mandou liberar R$ 200 milhões aos parlamentares.
A manobra fracassou.
Eduardo Campos Na noite de terça-feira, 7 de junho, de 2005, Dirceu recebeu em seu gabinete os ministros Aldo Rebelo e Eduardo Campos, na época na Ciência e Tecnologia.
Os dois vinham do Congresso, onde tentaram, sem sucesso, impedir a criação da CPI. “Fizemos o que era possível, mas não era possível impedir a CPI.
Vamos ter que estudar como enfrentar esse problema”, afirmou Eduardo, conforme relato do hoje governador ao autor.
Dirceu estava irritado e disse, ainda segundo Eduardo Campos, que a CPI seria o começo do seu fim.
Deprimido e preocupado com a CPI, Dirceu foi jantar, depois do encontro na Casa Civil, com Eduardo Campos e Aldo no Piantella, onde tratou de planos para a eleição do ano seguinte. “No final da noite, viraria para Eduardo, que sonhava ser governador de Pernambuco, e avisaria.
Você sabe que, em Pernambuco, o jogo do PT é como Jarbas Vasconcelos, né?
Pode desistir desta história de ser governador”.
O ministro da Ciência e Tecnologia ficou indignado.
Se o PT pretendia apoiar seu principal rival, Eduardo não tinha porque passar dias e noites no Congresso tentando salvar a pele de Dirceu. “E o meu jogo não é com o PT.
Eu não preciso do PT para ser governador.
A única pessoa a quem eu tenho que dar satisfação é o presidente Lula”, reagiria, de acordo com relato feito pelo governador ao autor do livro. “O jantar terminou em clima de hostilidade”, dis o jornalista.
No ano seguinte, Eduardo Campos se elegeu governador de Pernambuco derrotando o PT e o candidato de Jarbas Vasconcelos, Mendonça Filho.