Por Michel Zaidan 0 professor Luis Vicente Vieira, do Departamento de Filosofia (UFPE), acaba de lançar um livro que fere diretamente a questão do dia: Processos Constituintes Na América Latina.
Coordenador há vários anos de um Núcleo de Estudos sobre as democracias em nosso continente, Vieira lança uma questão inquietadora: por que olhar os processos constituintes da Europa e do Oriente Médio, para buscar inspiração para o caso brasileiro, quando temos perto de nós vários exemplos de processos constituintes verdadeiramente populares e originais? - Basta ver os exemplos da Bolívia, da Argentina, do Equador, para entender que a América Latina tem muito a nos ensinar sobre a matéria: soberania popular.
No entanto, a referência ao nosso continente é sempre acompanhada de vícios e perversões caudilhescas e autoritárias, como se só houvesse democracia no Norte e no Leste. É verdade que nunca nos sentimos latinoamericanos.
Nossas afinidades políticas, economicas e culturais eram com os europeus, até a primeira guerra mundial, e depois com os americanos.
Nunca com os vizinhos latinos, de quem sempre levantamos suspeitas.
A diplomacia sul-sul é coisa recente entre nós, sobretudo depois da mudança da agenda da política externa norteamericana.
Com o deslocamento do seu interesse para a Asia central, a America Latina ganhou uma janela de oportunidades para formular um processo de integração regional, nunca visto antes.
E que de fato materializou-se com o Mercosul, que continua ainda hoje como uma união aduaneira imperfeita e base de operação para os negócios intrafirma das empresas multinacionais.
O governo Lula procurou bancar o processo de integração regional, a partir do financiamento de grandes obras de infra-estrutura.
Infelizmente, os processos políticos revolucionários, as mudanças de governo e a crise economica internacional sabotaram as iniciativas multilaterais do primeiro governo petista, despertando nos vizinhos uma suspeita pela busca de hegemonia continental da diplomacia brasileira.
De toda maneira, há muito o que se aprender com a experiencia constituinte e popular dos nossos parceiros latinos.
O desenho, a fisionomia, a modelagem desse arremedo de consulta popular para fazer a reforma política no Brasil pode levar a uma desmoralização dos instrumentos da democracia direta (referendum, plebiscito).
Se é para dar a palavra (e o poder constituinte originário)ao povo brasileiro, é melhor obedecer às vozes da rua.
Fazer de conta, mudar ou usar como mera homologação das decisões do Congresso, a vontade p opular é dar um golpe na democracia e sacramentar de vez o caráter oligárquico, elitista da nossa representação parlamentar.