Por Jônatas Campos Jornalista, ex-correspondente em Caracas, ligado ao PT e aos movimentos sociais Há que se sentir maravilhado com toda essa movimentação política que tem ocorrido no Brasil nas últimas duas semanas, apesar da descarada infiltração de grupos de extrema-direita de viés golpista nas manifestações populares.
Impressiona como apenas duas semanas nos separam do marasmo político e dos cálculos eleitorais à efervescência desorganizada e viva das massas na rua.
Saímos de um protesto contra aumento das passagens, passando pelas grandes passeatas do último dia 20 até a agenda de transformações políticas propostas pela presidenta Dilma Rousseff nesta segunda-feira (24).
Junho de 2013 é um mês que ficará para a história brasileira.
Quem militou no movimento estudantil e nos movimentos populares entende bem a ironia desse momento.
Gente debatendo política nos bares, ônibus e lojas, para não falar das redes sociais, ambiente que deu início a tudo que está acontecendo agora.
Enganam-se os analistas engravatados com suas afirmações de que fomos pegos de calças curtas ou estamos perdidos.
Entendam vocês: há 13 anos defendíamos um plebiscito sobre a dívida externa brasileira.
Veio de nós a iniciativa de fazer um plebiscito popular sobre a anulação da venda da Companhia Vale do Rio Doce.
Nós estamos há 20 anos falando de piso nacional para os professores, de destinar 10% do PIB brasileiro para educação. Éramos motivo de piada quando falávamos em tipificar corrupção como crime hediondo.
Em Recife, nossos protestos contra o aumento de passagens eram tratados como o jeito “Coronel Meira” de ser.
Foram os movimentos do campo mais a CNBB quem propuseram a Lei de Iniciativa Popular da Ficha Limpa.
Não se enganem.
Nós queremos esse debate.
Estive em um congresso chamado Professional Fellows (companheiros profissionais), em março do ano passado, em Washington D.C., capital dos EUA, onde a participação social nas decisões políticas era vista como um fator de ampliação da democracia.
Era sobre isso que falávamos por lá, gente de mais de 50 países debando participação e democracia.
Lembro-me também de uma palestra da cônsul norte-americana em Recife, Usha Pitts, explicando que o Estado da Califórnia fazia consultas populares conjuntamente com eleições estaduais.
Ela dizia que lá, no pleito para governador, havia uma lista de perguntas acerca de diversos assuntos de interesse coletivo, onde o cidadão iria decidir pela validade de sua implantação.
A mim não me parece que referendos ou plebiscitos tornaram “autoritária” a democracia dos Estados Unidos.
Entre junho e dezembro, trabalhei como correspondente na Venezuela, a tal ditadura onde jornais diários de oposição ao governo circulam livremente, onde o presidente pode ser destituído por um referendo popular e onde a Constituição é orgulho nacional, vendida em toda esquina como suvenir e lida nas ruas e salas de aula.
Nos últimos 14 anos, a Venezuela realizou seis referendos para promover modificações na constituição do país e um, proposto pela oposição, questionando a permanência do então presidente Hugo Chávez.
O que pude perceber um povo, governista ou opositor, que discutia política em qualquer lugar e que sabia a importância de sua participação individual para uma causa coletiva.
Fico nesses dois exemplos porque são os mais próximos de mim.
Mas poderíamos falar da Suíça, França e outros países da Europa onde plebiscito é chique, moderno e importante.
Entendo que estamos diante de uma janela de oportunidades para o definitivo empoderamento das pessoas nas decisões que dizem respeito a si próprias e aos rumos da nação brasileira.
Quem sabe não poderemos ter um plebiscito por ano?
Um plebiscito ou um referendo acompanhando as eleições para governadores, prefeitos e presidente?
Quiçá o próximo debate poderá questionar as razões do voto obrigatório, porque em democracia viva e participativa, ninguém deve ser obrigado a votar, ao contrário, deve entender a importância de sua participação e fazê-lo por livre e espontânea vontade.