Por Otávio Luiz Machado O dia 17 de junho de 2013 marcou o Brasil não somente pelas cenas de parcelas significativas de cidadãos tomando as ruas reivindicando direitos e fazendo muito barulho.

Mas pelo significado que tais protestos impingem ao cenário urbano complexo, na contraposição direta ao discurso oficial dos governantes e na mobilização de parcelas significativas de concidadãos que até então se encontravam apáticos, desprotegidos, desiludidos e calados.

O que inicialmente focava no preço absurdo das passagens de onibus ganhou novas reivindicações e pautas ampliadas, como a não-aprovação da PEC-37 (que limita o trabalho do Ministério Público), o não-uso de recursos federais para o financiamento da Copa, o aumento de verbas públicas para as áreas de educação e saúde, o fim da violência contra os movimentos sociais, para o direito de protestar sem violência, etc Em Recife, na Avenida Conde da Boa Vista e em outras vias, por exemplo, o que se viu foi um “esquenta” para o grande protesto marcado para o dia 20 de junho de 2013, dando assim um indicativo de que a solidariedade aos protestos em outros Estados se transforma em adesão para a construção de protestos locais em seu próprio território antenados com as reivindicações gerais que acontecem pelo Brasil afora.

Várias cidades do exterior também tiveram protestos em apoio aos protestos no Brasil no mesmo dia.

Do norte ao sul do País, com alcance praticamente à metade dos Estados da federação, o que se viu nas ruas foram legiões de cidadãos que ganharam as ruas e praças em protestos para tratar de temas que diretamente atingiam suas cidades ou o País como um todo, mas também para prestar solidariedade aos participantes de protestos da capital paulista, que sofreram uma das mais duras repressões (mesmo sob a vigência de um sistema democrático em grande avanço nos dias anteriores).

O perigo para o sistema não está nas ruas fechadas, nos prédios públicos “atacados” e na imagem arranhada para muitas autoridades públicas.

Está na solidariedade que tais protestos geram no conjunto da sociedade, o que impõe incertezas quanto ao grau de ruptura ou de estragos que podem trazer ao status quo com novas adesões e maior alcance dos protestos, sendo de difícil controle e sem possibilidades de previsão sobre quais estruturas solidificadas poderão ser abaladas ou derrubadas.

Muito menos a quem se pode atingir em cheio primeiro, seja o sistema econômico, seja o sistema político, o sistema dos oligopólios internacionais ou os sistemas de comunicação de massa controlados por uma minoria.

Nos tempos controversos da Guerra Fria, o que mais afligia os cabeças dos países que orbitavam nos dois pólos era o perigo da chamada solidariedade mundial, o que exigia a mobilização de recursos financeiros infindáveis para quebrar qualquer possibilidade da construção dessa solidariedade universal entre os povos.

Os protestos nos últimos tempos ganharam novos atores, diferentes estratégias de mobilização e de organização e construíram pautas e temas de multiplicidades, enquanto a repressão a eles não inovou em nada: é a mesma truculência, o mesmo discurso autoritário em defesa da força em detrimento ao diálogo e o mesmo engodo de que uma minoria impõe à maioria os seus desejos e intentos.

O desgaste no sistema político é tão enorme, que cada medida tomada por seus representantes no sentido de se segurar ou de se equilibrar nesses momentos de tensão torna-se um combustível de qualidade superiormente inflamável.

O sistema político pode aparentemente manter diferenças nas suas composições internas, mas quando a situação coloca em risco todo o seu sistema, o que se vê são alianças e acordos entre todos que são sua parte.

No caso da democracia brasileira, PT, PMDB, PSDB, PSD, PSB, PC do B, etc., nessas horas falam a mesma língua, se posicionam com os instrumentos políticos em comum e costumam não compartilhar dos interesses maiores do País, porque a tendência é de proteção e de blindagem dos próprios interesses.

O desconforto não está nos alvos de insatisfação que já estão indicados nos protestos, mas nos que podem ressurgir e demonstrar que o ponto de saturação de parcelas significativas dos brasileiras finalmente aconteceu.

Por isso que os protestos já são vitoriosos, porque deixaram o sistema político sem saber o que fazer, ficando sem rumo e em compasso de espera.

O fato é que a repressão não segurou por muito tempo as mudanças das sociedades.

O próximo caminho escolhido é que vai dar o tom da vitória dos protestos, o ritmo da mudança, o atestado de que novas agendas serão abertas e guiadas pelo total poder dos cidadãos e cidadãs de nosso País. É pesquisador, escritor, educador e documentarista.

E-mail: otaviomachado3@yahoo.com.br