Em acórdão do Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE) sobre a prestação de contas da Prefeitura de Santa Cruz do Capibaribe referente ao ano de 2010 (processo nº 1140104-7), o procurador Marcos Severino Lima classificou como “um grande golpe de estelionatário” a ação do escritório de advocacia Bernardo Vidal Consultoria Ltda, com sede no Recife e escritórios também em São Paulo e Porto Alegre.

O relatório sobre a prestação de contas da Prefeitura de Santa Cruz do Capibaribe destaca, entre as irregularidades, o pagamento indevido de honorários advocatícios.

Segundo o documento, o escritório Bernardo Vidal teria oferecido serviços irregulares não só em Santa Cruz, mas em vários outros municípios de Pernambuco.

Com contratos de risco ou com valores antecipadamente estipulados, o escritório se propunha “fazer uma compensação com o INSS”. “Aquilo que vocês pagaram a mais em um determinado período nós vamos fazer um levantamento, vamos organizar, vamos dar entrada no INSS”.

O relatório do procurador Marcos Severino Lima acrescenta: “O grande problema é que ao final de tudo percebeu-se que se tratava de grande golpe de estelionatário”.

Em Santa Cruz, o escritório levou 20% do “economizado” pelo município.

Severino Lima explica detalhadamente como funcionava o golpe. “Eles faziam o levantamento da planilha, às vezes era Câmara, às vezes era Prefeitura, não tinha nem recolhido, eles lançavam como se recolhido fosse e fazia essa compensação.

Outras vezes se tratava de créditos já prescritos.

Também lançavam como não prescritos fossem e davam entrada no processo administrativo junto à Receita, comunicavam ao gestor e o gestor, a partir desse momento, deixava de recolher, abatia aquele valor que tinha sido informado pelo escritório, já que havia o processo administrativo de compensação, e antes da homologação da Receita já emitia nota fiscal e solicitava seus honorários.

Muitos gestores assim fizeram”, afirma.

Em 2011 a Câmara Municipal de Jaboatão esteve envolvida num caso de estelionato com o mesmo escritório, por serviços contratados em 2009 e 2010.

Após grande debate na segunda câmara do TCE, ficou definido que o responsável por pagar os danos à Receita Federal seria o município.

Mas Marcos Severino Lima chama a atenção para o fato de casos como estes, envolvento o mesmo escritório, não serem isolados.

Segundo o procurador, o mesmo escritório Bernardo Vidal Consultoria Ltda. teria atuado da mesma forma na Paraíba. “Esse escritório atuou na Paraíba e, posso dizer, enganou cerca de 49 gestores só no estado da Paraíba”, dispara.

Entre as cidades vitimadas na Paraíba está a capital João Pessoa, que tem procuradoria-municipal organizada, com muito mais estrutura que os pequenos municípios do interior.

O Tribunal de Contas da Paraíba, no parecer sobre a prestação de contas do ano de 2009 da prefeitura de Fagundes, destaca, no item H) da página 2, entre as irregularidades, a “falta de pagamento de obrigações previdenciárias patronais ao INSS, no montante de R$ 848.660,40” e, no item M), o “contrato irregular e despesa insuficientemente comprovadas, no montante de R$ 32.106,48, com a empresa Bernardo Vidal Advogados e Bernardo Vidal e Associados (para recuperação de créditos previdenciários)”.

No item 3 da página 4, na decisão do relator, é determinado que o TCE da Paraíba “impute débito ao referido Prefeito (…) R$ 127.139,74 relativo à serviços contratados junto às firmas Bernardo Vidal Advogados (CNPJ nº 09.138.544/0001-99) e Bernardo Vidal e Associados (CNPJ nº 10.656.468/0001-92), em razão da ausência da comprovação efetiva da recuperação de créditos previdenciários”.

E determina, no item 6, que o caso seja comunicado à Receita Federal do Brasil.

Leia abaixo o parecer do TCE da Paraíba. parecer_TCE_PB_paraiba_Fagundes_2009 from Vinícius Sobreira O relatório do TCE de Pernambuco afirma também que o número de municípios prejudicados em terras pernambucanas chegou a 20.

Municípios do Rio Grande do Norte e de Alagoas também teriam sido prejudicados.

A soma, segundo o procurador, pode chegar a 100 os prefeitos de municípios nordestinos que “foram ludibriados na boa-fé de fazer suas compensações”.

Matéria de 2011 do Zero Hora, jornal de maior circulação no Rio Grande do Sul, afirma que o TCE-RS determinou que a Prefeitura de Uruguaiana “suspenda os pagamentos ao escritório Bernardo Vidal Advogados, do Recife, especializado em recuperação de créditos previdenciários”.

E acrescenta que “o escritório (…) é investigado em 52 municípios brasileiros”.

No acórdão de Santa Cruz, o procurador Marcos Severino Lima acrescenta que “havia essa ilusão de que seria líquido e certo, só que depois vinha a cobrança por parte da Receita Federal dizendo que o processo não tinha sido homologado e estava aí a administração com prejuízo em suas mãos”.

E segue. “Ao contrário do que o Relatório da Auditoria colocou, dizendo que foi uma espécie de negligência do gestor, veja-se que foi um golpe articulado, que pegou quase 100 ordenadores de despesas, quase 100 prefeitos ou presidentes de Câmaras, mostrando histórico de serviços prestados, histórico de compensações”.

Numa decisão de maio deste ano de 2013, referente à prestação de contas de 2009 de Araripina (processo nº 1080080-3), o TCE de Pernambuco determina que o “advogado contratado Dr.

Bernardo Vidal Domingues dos Santos” pague um valor de R$ 288.428,24 aos cofres do município sertanejo.

Junto com ele, o então prefeito Luiz Wilson Ulisses Sampaio é condenado a pagar um valor próximo dos R$ 6 milhões.

Leia o acórdão do TCE no caso de Araripina. acordao_TCE_PE_Pernambuco_2013_contas_Araripina_2009 from Vinícius Sobreira Ao tratar do caso de Santa Cruz do Capibaribe, onde os cofres públicos pagaram R$ 83.299,59 ao escritório Bernardo Vidal, o afirma que “o prefeito é muito mais vítima” em vez de ser “o grande responsável” pelo dano. “Seria muito mais consentâneo com a realidade dos fatos a determinação de que a administração atual, se já não o fez, entre com uma ação de cobrança contra o escritório e as pessoas físicas para o ressarcimento, em vez da imputação pura e simples ao ordenador de despesas que, repito, me parece ser muito mais uma vítima das circunstancias”.

O conselheiro Marcos Loreto subescreve concordando com o Procurador, defendendo o ex-prefeito de Santa Cruz do Capibaribe e destacando a repercussão da atuação do escritório na Paraíba.

O conselheiro Dirceu Rodolfo elogia as observações e o resgate histórico relativos ao escritório de advocacia feitos pelo procurador Marcos Severino Lima, mas ressalva que “o gestor não está indene à responsabilização pelo ressarcimento se praticar seu ato sem verificar a prudência que deve ter e, principalmente, ele deve atuar nessas questões mais temerárias, porque é uma operação temerária, com todas as cautelas, com todas as precauções”.

Ele sugere ainda a determinação de que a administração municipal entre com uma ação judicial de cobrança contra o escritório.

Na decisão, Marcos Loreto mantem a multa de R$ 551.827,00 ao prefeito Antônio Figueiroa de Siqueira.

O valor deve ser devolvido aos cofres públicos.

Outras irregularidades nas contas de Santa Cruz também são condenadas, com as devidas punições.

Câmara de Jaboatão O relatório afirma que, assim como noutras cidades onde o suposto golpe teria sido aplicado, em Jaboatão o caso ainda tramita na Justiça.

O documento afirma que após o então presidente da Câmara de Jaboatão, Neco, ter percebido que muita verba havia sido “economizada”, teria achado aquilo tão bom que ficou desconfiado.

Após constatar o golpe, teria entrado com ação de cobrança ao escritório.

Em contato com o Blog, Neco afirmou que quando descobriu o golpe, acionou a Receita Federal. “Não descobri a tempo.

Mas quando descobri fiz tudo o que tinha condições de fazer para ir buscar o prejuízo”, afirmou.

A ação cobrando o ressarcimento dos valores ainda tramita na Justiça.

O Blog entrou em contato com o escritório da Bernardo Vidal no Recife, mas o escritório informou que só enviará resposta ao Blog após consultar o setor jurídico.

Leia a resposta do escritório, enviada nesta quinta-feira (13): Bernardo Vidal diz que casos citados na matéria são “residuais” e lamenta “desinformação” de autoridades do TCE Leia a íntegra do acórdão do conselheiro Marcos Loreto, do TCE-PE, sobre as contas de Santa Cruz do Capibaribe do exercício de 2010. acordao_santacruzdocapibaribe_tce_pernambuco_contas2012 from Vinícius Sobreira