Deu no Jornal do Commercio desta sexta-feira (31) “Coronelismo, enxada e voto” Por Tadeu Alencar, procurador da Fazenda Nacional e secretário da Casa Civil de Pernambuco O Brasil mudou, mas as disparidades regionais e as desigualdades continuam gritantes.

O arcabouço tributário brasileiro foi desenhado sob inspiração ditatorial, pelas mãos de Otávio Gouveia de Bulhões e Roberto Campos.

O resultado foi a grande concentração de tributos na União, vis-à-vis os demais entes, o que não se compadece com o necessário equilíbrio federativo.

Em 1988 ficou assentado que 77% dos recursos arrecadados seriam compartilhados com Estados e Municípios.

Ocorre que tal divisão foi radicalmente desfigurada, sendo compartilhados, no ano de 2012, apenas 37% das receitas da União, fazendo tabula rasa à Carta Política de 1988.

Dois os fatores que impuseram graves danos ao federalismo brasileiro, sobretudo porque Estados e municípios se viram forçados a assumir novas obrigações, de responsabilidade da União.

Crescendo a volúpia arrecadatória, os governos da União, de diversos matizes, investiram no aumento da carga tributária pela via das contribuições sociais, diminuindo o peso dos impostos, uma vez que aquelas não são compartilhadas com as esferas subnacionais.

Acresce que, a partir de 2008, o Fundo de Participação dos Estados e o dos Municípios viram-se atingidos pela desoneração dos impostos federais, política anticíclica que, à época, produziu inegável efeito para estimular o consumo, a manutenção dos empregos e a produção, fazendo com que o Brasil passasse ao largo da crise de então.

Com o recrudescimento dessa mesma crise, em 2011, e o consequente desaquecimento da economia, verificou-se uma brutal frustração de receitas de Estados e Municípios, materializando o chamado “federalismo de pires na mão”.

Igualmente crucial ao federalismo brasileiro são as desigualdades regionais.

A despeito dos avanços econômicos e sociais vivenciados pelo Brasil, as desigualdades entre as suas regiões ainda marcam a sua combalida geografia.

Desta forma, a redução da atividade econômica, a mudança no perfil do bolo tributário a ser dividido, as políticas de desoneração tributária, agravadas pela maior estiagem dos últimos 60 anos e pelas desigualdades regionais, tornaram a situação de Estados e municípios, no Nordeste, de manifesta vulnerabilidade.

Em Pernambuco, onde sopra o branco-azul da liberdade, o governo do Estado criou este ano o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Municipal, uma forma inovadora, engenhosa, de apoiar os municípios em tempos de crise, para dinamizar a economia local e assegurar recursos em áreas estratégicas.

Além do mais, os recursos são repassados fundo a fundo, o que permite vencer os gargalos burocráticos, sem fragilizar os controles, o que garante a sua justa distribuição e o equilíbrio entre as diversas regiões, dando concreção ao grito por um novo Pacto Federativo, empunhado, com autoridade, pelo governador Eduardo Campos.

Lembrou-me agora, decerto impropriamente, o excepcional trabalho de Vitor Nunes Leal, Coronelismo, Enxada e Voto, que nos faz pensar nas razões pelas quais, historicamente, sempre houve dependência entre as províncias e o poder central, em face da troca de favores que durante muito tempo foi a base do Estado brasileiro, em especial na República Velha.

O Brasil experimenta o mais longo período democrático de sua história, mas, enquanto as políticas públicas a cargo de Estados e municípios se mantiverem na dependência de transferências voluntárias da União, é o caso de se pensar que ainda vivemos tempos de vassalagem.

Ainda bem que Pernambuco “só se curva para agradecer”.