Por Pedro Henrique Reynaldo Alves, presidente da OAB-PE A advocacia, enquanto atividade econômica que é, está sujeita a regime tributário semelhante ao de outras atividades civis ou mesmo empresariais, embora com peculiaridades inerentes à natureza pública de sua finalidade.
Sendo o advogado “indispensável à administração da justiça”, como preconiza o art. 133 da Constituição Federal, certamente todas as obrigações, inclusive tributárias, que limitem, onerem ou restrinjam o exercício da advocacia trazem consequente gravame à realização da justiça, missão constitucional das mais importantes de nosso Estado.
Certamente que as receitas de honorários advocatícios, tal como os subsídios dos membros do Poder Judiciário e Ministério Público, estão sujeitos ao imposto sobre a renda e se porventura auferidos por pessoa jurídica (faturamento das sociedades de advogados), também constituem fato gerador das contribuições sociais legalmente instituídas (PIS, Contribuição Social sobre o Lucro e CONFINS), exações que incidem de forma direta nos proventos dos advogados.
Descabe falar em isenções ou imunidades tributárias para o exercício da advocacia, à medida que, ao revelar capacidade contributiva, o advogado assim como qualquer outro profissional, deve contribuir para o financiamento das atividades públicas e seguridade social.
Contudo, a tributação que merece maior atenção da advocacia é justamente o ISS – Imposto Sobre Serviços, que, por se caracterizar de um imposto indireto que grava o consumo, constitui um valor que se agrega ao custo do serviço prestado, vindo a ser suportado pelo tomador do serviço, o jurisdicionado seja ele cidadão ou empresa.
Quando um tributo – como o ISS – incide sobre o serviço advocatício, consequentemente se está impondo uma carga tributária que afeta e onera o acesso à justiça, dificultando ainda mais a concretização do já deficitário princípio da universalidade da jurisdição.
Os honorários advocatícios não podem ser equiparados a receitas de prestadores de outros serviços, sejam gráficos, financeiros, tecnológicos etc., porquanto não expressam resultado de uma operação empresarial que tenha o lucro como finalidade.
Não quero com isso ignorar a existência de grandes sociedades de advogados que certamente auferem lucros, mas mesmo estas estão a prestar relevantíssimo serviço público ao envidar seus indispensáveis serviços para a realização da justiça.
O advogado, seja ele profissional liberal autônomo ou associado a outros pares em grandes escritórios, exerce um mister público que não se coaduna com o lucro, ou ao menos não tem este como objetivo, sendo a sua renda uma derivação natural de seu desforço honroso (origem de “honorários”) em favor da justiça.
Portanto, não sem fundamentada razão, os Municípios brasileiros se valem da contribuição individual do advogado, em valor fixo, através de Cadastro Municipal Individual, para tributar a advocacia, o que assegura ao fisco o controle e fiscalização do sujeito passivo, no caso o advogado, sem comprometer de forma muito significativa o custo dos serviços jurídicos.
Colocar o interesse arrecadatório do erário acima do interesse público de uma justiça mais acessível aos cidadãos certamente não corresponderia ao ideal democrático consagrado em nossa Constituição.
A despeito dessa conformação jurídica satisfatória, aqui e ali surgem iniciativas reprováveis de municipalidades que pretendem onerar os serviços jurídicos, através de projetos de lei para submeter a advocacia ao recolhimento de percentual sobre o faturamento dos advogados.
Ocorreu em tempos atrás no município do Rio de Janeiro e mais recentemente em Salvador, mas em ambos os casos predominou o bom senso, diante da evidência da impropriedade das propostas, bem combatidas que foram pela OAB e pelo CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados.
Nos últimos dias esse fantasma voltou a pairar sob a advocacia, agora em esfera nacional.
Tramita no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, proposta de revisão da Lei Complementar nº 116/2003, que regula o ISS para todos os municípios brasileiros.
A intenção primordial do projeto é mitigar a guerra fiscal entre os municípios, estabelecendo-se alíquota mínima (2%), e modernizar alguns institutos e fenômenos tributários.
Por iniciativa creditada nos bastidores ao Prefeito de São Paulo, o Projeto cuidaria, ainda, de afastar a advocacia do recolhimento do simples pelo método da contribuição fixa individual, sujeitando-a à incidência do ISS sobre o faturamento.
Agindo com a urgência e proficiência recomendadas ao caso, o presidente Nacional do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coelho, procurou por nosso intermédio entabular diálogo com o Relator da matéria, o Senador Armando Monteiro (PTB-PE), o que foi feito com a companhia de nossa atuante bancada pernambucana no Conselho Federal, e Comissão Nacional de Acompanhamento Legislativo da OAB.
Sensível aos argumentos de nossa classe, e, sobretudo, revelando seu elevado espírito público e compromisso com a justiça fiscal, o ilustre senador pernambucano acolheu o pleito da OAB, evitando a oneração dos custos de acesso à justiça.
A matéria restou definitivamente sacramentada após tratativas com o presidente da CAE, Senador Lindbergh Faria (PT-RJ), que igualmente assegurou a manutenção do atual regime de tributação dos serviços advocatícios.
A OAB que há anos vem lutando pela desoneração tributária, não poderia silenciar diante de mais uma investida do Poder Público contra os contribuintes, na busca de hipertrofiar ainda mais a arrecadação tributária, em sacrifício dos setores produtivos, muito menos quando, por ironia, o setor alvejado pelo “leão” do fisco foi justamente o da justiça.