Por Michel Zaidan A revista Carta Capital, desta semana, traz uma manchete desalentadora sobre o trabalho da Comissão da Verdade e da Justiça: afirma que as atividades da comissão estão entre a inoperância e a irrelevância social. É inquietante uma opinião como essa.
Há muita expectativa da sociedade civil (e particularmente, dos familiares dos chamados “desaparecidos políticos”) em relação aos resultados da comissão.
Sabe-se que ela não tem poder de ajuizar ou julgar os autores de crimes contra os direitos humanos e contra a humanidade.
Por outro lado, sabe-se que divergências entre os membros da comissão sobre o que fazer com os resultados.
Uns acham que não devem ser publicizados e apenas entregues aos interessados para as medidas cabíveis.Outros, entre os quais o presidente da comissão, acham que não, que deve sim ser dada a maior divulgação possível.
De toda maneira, parece que as comissões são feitas no Bras il, para não funcionarem.
Daí a divergência e a inoperância.
Os principais prejudicados são - como sempre - os familiares dos militantes assassinados pela Ditadura Militar e a sociedade civil brasileira que espera por informações e esclarecimentos sobre o paradeiro (e as circunstâncias) dos desaparecidos políticos.
Poderia afirmar simplesmente que os crimes cometidos contra a humanidade ou atentatórios aos direitos humanos são imprescritíveis, segundo todos os tratados internacionais.
Mas importante é a lei de Antígona: os familiares têm direito de enterrar seus mortos.
E para o interesse histórico do povo brasileiro, nenhuma anistia prevalece.
A história tem de ser contada e a sociedade tem o direito de saber o que, um dia, aconteceu neste país.
Conheço o trabalho - como historiador - do professor Paulo Sérgio Pinheiro, desde a época em que ele ainda se interessava pela história do comunismo brasileiro e pela ANL e as desventuras dos revolucionários de 35.
Sei que vem daí o seu interesse crescente pela defesa dos direitos humanos.
Foi assim que se tornou articulista das revistas semanais e funcionário internacional da ONU.
Sei também que ele não é de aceitar compromissos ou condições, quando se trata de fazer justiça à memória dos assassinados e torturados.
Mas, há juristas na comissão que, por deformação profissional, não concordam com a posição do historiador e militante dos direitos humanos.
São mais apegados à lei e as instruções normativas que regem o trabalho da comissão.
Imagino que isso seja um elemento de embaraço para o progresso dos trabalhos e de desinteresse por parte de alguns.
Mas séria é a situação dos estados, onde a constituição da Comissão da justiça e da Verdade obedeceu sobretudo à conveniencia política e estratégica dos governadores, na base da conciliação e do compromisso político, muitas vezes fazendo que torturadores de ontem sejam os juízes das torturas de hoje. ou os que serviram a ex-governadores para perseguir opositores, integrem sem mais as comissões.
Tudo isso só pode embaraçar e neutralizar a autonomia, a liberdade e a coragem dessas comissões em levar adiante tarefa tão difícil e tão importante.
Mas é a sociedade civil, a imprensa, o ministério públicos e as famílias dos atingidos pelo regime que devem ser a maior interessada em que este trabalho ande e produza os frutos tão almejados por todos.
Esses atores são fundamentais para garantirem a seriedade e a radicalidade das investigações e ouvidas, independentemente das conveniencias e estratégias políticas dos governantes.