Por Pedro Henrique Reynaldo Alves, presidente da OAB-PE, especial para o Blog de Jamildo Você já imaginou um hospital público fechar suas portas durante toda a manhã, para atendimento em regime de meio expediente, obrigando os enfermos a aguardar a parte da tarde para serem socorridos?!

E o que falar das delegacias ou unidades da Polícia Militar?

Será que seria admissível que só estivessem abertas ao público por metade do expediente, enquanto no outro turno a sociedade ficaria à espera da disponibilidade de acesso ao aparelho de segurança pública?!

Estes serviços não devem nem podem parar, pois são essenciais para a normalidade pública na dinâmica da vida em sociedade, se constituindo missões primordiais do Estado.

As tragédias, fatalidades, doenças, assim como os conflitos, delitos, tumultos, não têm hora programada para acontecer, e por isso mesmo cabe ao Estado disponibilizar, por meio de seus competentes órgãos, o atendimento 24 horas do dia, nos 7 dias da semana, da população.

TJPE reduz horário de atendimento ao público alegando medida de economia Admitir que tais serviços podem ser disponibilizados de forma ou em tempo apenas parcial, por consequência lógica, implica em reconhecer que os mesmos, assim como os agentes públicos que os prestam (médicos, policiais, delegados), são parcialmente prescindíveis e dispensáveis, pois poderiam ser substituídos ou relevados nas horas de sua indisponibilidade.

A Corte Especial do Tribunal de Justiça de Pernambuco, na última segunda-feira, aprovou Resolução reduzindo o expediente forense de atendimento ao público para meia jornada, o que fez por razões de ordem econômica, dentre as quais se destaca um drástico corte orçamentário perpetrado pelo Poder Executivo.

Dentre as motivações de tal medida, destacaram Ss.

Exas. o fato do Fórum do Recife ser muito pouco procurado pelos advogados e sociedade no turno da manhã, e, ainda, uma pesquisa realizada com os magistrados.

Seria então a justiça, assim como os magistrados, parcialmente prescindíveis em nossa sociedade?!

Afinal, como já tivemos oportunidade de mencionar em artigo anterior, existem municípios do interior do Estado que estão sem qualquer juiz há vários meses e até anos, como no exemplo da Comarca de Floresta.

A OAB-PE reconhece como verdadeiras as premissas da exiguidade de recursos orçamentários e até mesmo da pouca quantidade de advogados e jurisdicionados transitando pelos fóruns na parte da manhã, sendo certo que esta baixa frequência se dá justamente pela ausência quase que total de juízes em tal turno.

Contudo, vislumbramos nesta atitude de reduzir o expediente dos Fóruns um grande equívoco, com uma drástica conotação de cerceamento de acesso à justiça.

Se a justiça estadual de Pernambuco já estava na UTI, dentro de 60 dias, data de vigência da citada Resolução, esta UTI só estará funcionando pela metade.

Acontece que a verdade inconveniente que está por traz desta discussão acerca do horário de funcionamento dos Fóruns, é que lamentavelmente uma parcela significativa dos magistrados apenas trabalha meio expediente, e olhe lá…!

Não irei aqui incorrer no erro da generalização, que tanto abomino, a exemplo do que fez o Ministro Joaquim Barbosa em sua recente infeliz declaração, de que existiria conluio nas relações de juízes com advogados, pois não posso ser injusto com uma parte muito expressiva dos magistrados pernambucanos que se dedica plenamente, manhã, tarde e noite, à causa da justiça.

Mas não podemos ignorar que esta inoportuna Resolução do TJPE veio bem a calhar para os não poucos juízes que costumam chegar ao Fórum após 14h e sair às 18h, e que sempre conseguem acobertar sua pequena produtividade dentro do contexto geral do volume hercúleo de trabalho e de um ambiente de judicialização crescente das demandas sociais.

Ainda que ignorássemos esse lamentável efeito de conformação jurídica da meia-jornada dos juízes menos dedicados, e admitíssemos, seja por ingenuidade ou por excesso de otimismo, que quase todos os magistrados passariam a produzir ainda mais a partir do fechamento dos Fóruns para o público, mesmo assim a Resolução não seria justificada, pelo simples fato de restringir ainda mais o já precário acesso da sociedade à justiça. É preciso compreender que se alguma pesquisa pudesse amparar ou instruir esse tipo de decisão, ela precisaria ter uma abrangência bem maior que a mera consulta aos magistrados, como foi feita.

Além dos advogados, promotores e servidores, indispensável seria a oitiva da sociedade, pois a ela é destinada, e apenas por ela se justifica a existência, de toda a estrutura do Poder Judiciário.

Outro aspecto que precisa ser urgentemente revisto pelo nosso Judiciário estadual, diz respeito ao regime de plantão, que também não funciona de forma plena e adequada.

No final do ano passado, em um sábado, pelas 22h, fui procurado por um colega advogado que muito estimo.

Visivelmente atordoado, ele tentava um internamento de sua mãe na rede hospitalar privada, em razão de uma urgência médica, mas, como em tantos conhecidos e lamentáveis casos, o procedimento foi negado pelo plano de saúde, só lhe restando buscar uma tutela judicial de urgência, para atendimento através de uma decisão liminar.

A angústia de nosso colega foi agravada pelo fato de, ao recorrer ao Poder Judiciário, última e maior esperança do cidadão diante de abusos como aquele que estava sofrendo, foi informado pelo porteiro do Tribunal de Justiça que não havia juiz algum para apreciar seu pedido.

Ao indagar sobre o Juiz plantonista, foi solenemente informado que o magistrado encerrou seu expediente às 18h, e não havia como se comunicar com o mesmo.

Ou seja, em nossa Justiça Estadual, diferentemente do que ocorre na Justiça Federal, o plantonista não é bem um plantonista, pois, após determinada hora ele simplesmente fica incomunicável, e os cidadãos ou advogados que necessitarem de um atendimento de urgência de nossa justiça, terão de se deparar com as portas fechadas de nossos Fóruns e Tribunal, tendo de se conformar em tratar com um Policial Militar ou porteiro que esteja guardando o prédio. Àqueles advogados mais influentes e de maior conhecimento da Corte, que têm acesso aos magistrados por meio de seus telefones pessoais, este tipo de problema é minimizado, pois certamente não tardam em localizar o juiz plantonista em sua residência ou no celular.

No entanto, para a grande maioria da classe e da sociedade, esta situação revela simplesmente uma impossibilidade de acesso à justiça, justamente em uma situação de emergência, como a aqui narrada.

Expus essa situação insustentável ao Presidente do Tribunal, que, como sempre, se mostrou bastante sensível à questão e se comprometeu a analisar o pleito da OAB-PE de implementar um plantão mais efetivo, com a disponibilização dos telefones e endereços onde se possa encontrar o juiz plantonista por qualquer cidadão ou advogado que dele necessite os préstimos de magistrado.

No que concerne à Resolução do TJPE de redução do expediente público dos Fóruns, estamos ingressando com requerimento perante o Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, no sentido de pugnar pelo rápido julgamento do mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil – AMB, que teve o efeito de suspender, em caráter liminar e precário, a vigência da Resolução nº 130 do CNJ, que determina o funcionamento em horário integral dos Fóruns brasileiros, na esperança de que a OAB, mais uma vez, faça valer perante o STF a autoridade das decisões e normas do Conselho Nacional de Justiça.

No presente caso, o julgamento improcedente da Adin teria o efeito de nulificar a Resolução do TJ de redução de expediente dos Fóruns.

Acreditamos que teremos revistas e sanadas estas situações aqui expostas, que em nada contribuem para a boa imagem de nosso sistema de justiça e que também não traduzem o espírito de superação e luta dos operadores do Direito em nosso Estado, mas de uma forma ou de outra, convém refletirmos se realmente podemos ou não prescindir de uma justiça por inteiro.