Por Thaís Sánchez Repórter Multimídia do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação “Num lugar onde há umas décadas funcionou um abrigo religioso, um convento de freiras, onde mulheres “tão abençoadas e próximas de Deus” se afastavam um pouco do mundo lá fora, tão podre, tão corrompido; hoje, funciona a Colônia Penal Feminina (CPF) do Bom Pastor, no bairro da Iputinga, Zona Oeste do Recife.

Destoando completamente do seu próprosito inicial, o abrigo do Bom Pastor, que deveria abrigar, de acordo com sua capacidade oficial, 204 detentas, acolhe mais que o dobro desse número.

Setecentas e trinta e duas mulheres, negras, brancas, ricas ou pobres dividem, juntas, a mesma ansiedade: a liberação das suas sentenças.

A maioria, por não poder pagar um advogado sequer, depende da Defensoria Pública.

Há quem esteja esperando quatro anos e meio por uma resposta.

Sem esperanças, sem perspectiva.

Luciana Palmeira, 24 anos, há oito meses teve sua vida interrompida.

Separou-se do marido e da igreja (evangélica), e decidiu morar só.

Com cinco filhos, a pensão do ex-companheiro não se fazia suficiente para sustentá-la: “O leite era caro”, comentou abaixando a cabeça, numa tentativa de justificar o erro.

Certo dia, a “esperança” bateu à sua porta: uma colega de rua, lá da comunidade da Mangueira, no bairro da Mustardinha, na Zona Oeste, lhe ofereceu um trabalho simples que seria o suficiente para cobrir os débitos dos meses atrasados de aluguel. “Cheguei aqui dois dias depois de descobrir que estava grávida de quase dois meses.

Foi um susto.

Não sabia o que pensar na hora”, relembrou Luciana que está sendo acusada de acordo com o artigo 33 da lei 11.343/2006 do Código Penal Brasileiro: tráfico de drogas.

A proposta foi quase irrecusável diante da sua situação financeira.

Sua amiga propôs que ela guardasse na sua casa um pacote de drogas, para um traficante da área, e ela assim o fez em troca de um dinheiro que cobria todas as suas dívidas do aluguel.

Quatro dias depois, cinco policiais invadiram sua casa e encontraram o saco com meio quilo de maconha. “No momento estava com minha filha de três anos, ela não entendeu o que estava acontecendo, mas chorou.

Me viu chorar… foi traumatizante”, explicou a jovem.

Hoje, a menina, que tem quatro anos, faz tratamento psicológico porque tem medo de pessoas fardadas: “ela acha que os policiais são ‘bichos’ e ‘monstros’ que me levaram para longe”.

Com sua filha de dois meses de idade, Luciana divide o alojamento do berçário com mais treze mães. “Depois que fui presa, reatei meu relacionamento com meu marido e, hoje, só ele é quem vem me visitar.

Ele, e minha filha mais velha, de 9 anos”, falou Luciana em tom saudoso.

O que mais pesa para as mulheres que tem filho na cadeia, é a separação.

A vida lá fora foi interrompida e um novo começo, uma nova vida, foi engatada dentro das celas da prisão.

O filho nasce, e, ao completar seis meses de vida, a mãe tem que se separar dele: a criança vai, agora, conhecer o mundo, que, talvez, não seja tão aconchegante quanto aquele que o recebeu calorosamente nos seus primeiros dias de vida, nos braços das mães.

O recém-nascido vai para os cuidados dos avós, do pai, ou de algum outro responsável da família.

Como muitas ali no Bom Pastor, Luciana Palmeira é analfabeta: “Estudei até a 4ª série, mas não sei ler nem escrever.

Só sei assinar meu nome”.

As dificuldades de uma vida limitada na comunidade da Mangueira se intensificam entre os altos muros da Colônia Penal.

Sem dinheiro para pagar advogado e dependendo da defensoria pública, segurando uma pequena Bíblia ela comentou “meu ‘adêvogado’ é ‘jesuis’”.

Uma pergunta dura e até sem muito sentido para ela, a fez respirar fundo e esboçar um sorriso: “E se você saísse daqui amanhã?”.

Sem hesitar, a mulher “artigo 33” respondeu: eu só quero criar meus filhos.

Luciana Palmeira, 24 anos, presa há 8 meses em flagrante, não tem ainda audiência marcada.”