No Córrego da Areia, MPPE já tentou fechar escola com apenas três salas de aula.
Por Vinícius Sobreira, repórter do Blog Nesta quarta-feira (6) cerca de 150 mil estudantes do Recife iniciam o ano letivo de 2013 na Rede Municipal de Ensino.
No entanto, apenas uma reduzida minoria tem acesso ao que lhe é de direito, por Lei.
Os educadores tampouco.
Os debates entre Sindicato e Prefeitura revelam uma série de entraves estruturais que dificultam o cumprimento da Lei nas escolas da rede pública da capital pernambucana.
O cumprimento da Lei do Piso e das regras da aula-atividade, tal qual a garantia de uma educação digna para as crianças e jovens do Recife, são inviáveis hoje por uma série de decisões equivocadas nas últimas décadas.
Seja por falta de conhecimento sobre o tema, à época, ou por falta de atenção, mais recentemente.
Quando, no início dos anos 2000, foi decidido que a Rede Municipal teria papel ativo na universalização da educação no Brasil, professores foram para praça pública matricular alunos.
A prioridade, naquele momento, era colocar as crianças e jovens nas escolas.
A Prefeitura correu atrás de prédios que comportassem aquela nova demanda, alugando-os ou comprando e transformando-os em escolas ou anexos.
A infraestrutura adequada viria depois.
Viria.
Mais de 10 anos se passaram e o poder público se acomodou ao modelo emergencial de escola, que hoje passa longe de atender sequer ao que exige à Lei.
O Blog visitou cinco escolas da Rede Municipal, o suficiente para constatar grandes absurdos.
No Recife, cidade cujo prefeito prometeu dar tablets aos alunos, crianças têm aulas a poucos palmos de pontos de tráfico de crack, que ficam literalmente no teto da escola.
Infelizmente o ponto também é usado pelos viciados para - diante dos olhos e ovidos dos alunos - se drogarem e fazerem sexo, além de dirigirem ameaças às crianças da escola.
Escola Municipal da Mangabeira convive com tráfico de drogas no telhado Na Mangabeira, corrente foi colocada para evitar novas invasões de traficantes na escola.
A situação é absurda.
Mas infelizmente esta escola na Mangabeira não é a única que tem sofrido com a ausência do poder público municipal.
A Escola Municipal Nossa Senhora do Pilar, a apenas 500 metros da Prefeitura, também passou ignorada pelos últimos gestores.
Calçadas destruídas, fachada já sem cor e um quintal amazônico são provas disso.
A Emlurb, órgão municipal responsável pela capinação e limpeza do terreno, não faz uma visita há 7 meses.
Os vidros quebrados e o ferrugem que devora as grades completam o visual de abandono daquela casa - que já não tem condições de abrigar uma escola.
A 500 metros da Prefeitura, escola municipal vive de doações Uma outra instituição, no Córrego da Areia, tem apenas 3 cubículos onde são ministradas as aulas.
Neles, as crianças dão os primeiros passos para a alfabetização, recebem merenda e ainda têm aulas de informática - com notebooks que vão até as salas.
Tudo sem descolar da cadeira.
Eles sequer têm recreio, porque não há espaço físico para isso.
Educação física, artes e música, todos previstos em Lei, passam longe daquele casebre.
Por perto mesmo só o forte cheiro dos produtos de cabelo, aplicados num salão de beleza que funciona dentro do terreno da escola..
MPPE já tentou fechar escola com apenas três salas de aula, no Córrego da Areia Do outro lado da rua funciona uma outra escola municipal, homônima, da qual um dia este casebre foi anexo.
Se somadas, ainda não conseguiremos uma instituição de ensino estruturada.
Nesta, os alunos sofrem com o calor, têm atividades de informática ministradas por estagiários de ensino médio (entre 16 e 18 anos) e têm aulas de dança dentro do refeitório.
Na Zona Norte, escola sem estrutura deixa alunos desconcentrados com o calor A falta de estrutura física, consequência dos precários investimentos em Educação, são o principal entrave para a aplicação da Lei do Piso, que prevê um terço da aula-atividade do professor para o planejamento das atividades para sala de aula.
Sem a garantia - já que a aplicação da Lei foi suspensa pelo TJPE a pedido do novo prefeito Geraldo Julio -, será afetada diretamente a qualidade das aulas ministradas pelos educadores e/ou a qualidade de vida dos mesmos. “Não temos a intenção de prejudicar os professores”, se defende o prefeito. “A Lei já não era cumprida”, afirma.
Bem próximo à Prefeitura, escola sofre com abandono do poder público.
Claro que diante do infeliz cenário da educação do Recife, o cumprimento da Lei não poderá acontecer da noite para o dia. É necessário um período para uma construção das condições para o cumprimento das regras da aula-atividade.
O prazo solicitado pela PCR inicialmente foi de 6 meses, mas o Sindicato Municipal dos Profissionais do Ensino do Recife (Simpere) exigiu menor tempo e o secretário de Educação, Valmar Corrêa, baixou o prazo para três meses.
Na próxima quarta-feira (6), na Fafire, será realizada assembleia de professores para decidir pelas normas de criação de uma comissão (com composição também definida na assembleia) para planejar a implementação da aula-atividade dos educadores.
A comissão terá 90 dias para traçar o planejamento e, findado o prazo, inicia-se o processo de implementação do que prevê a Lei.
A secretária-Geral do Simpere, Eunice Nascimento, avisa que o caminho é a contratação de profissionais de educação física, arte-educadores e professores especializados em informática.
Com estes profissionais, os professores de sala de aula terão o devido tempo para planejar suas aulas e provas.
Mas, além da elevação do grupo de educadores, a Secretaria de Educação precisa viabilizar a atuação destes contratados. “O primeiro passo é reestruturar o parque escolar, implantando laboratórios de informática, novas salas, quadras.
Fica inviável implementar as aulas sem estrutura”, alertou. “Isso vai enriquecer mais ainda o currículo do aluno.
Será um salto na qualificação municipal do Recife”, previu Eunice.
Só no mês de janeiro, o secretário de Educação do Recife, Valmar Corrêa, teve quatro encontros com o Simpere para acalmar os ânimos - que ficaram exaltados após a decisão do TJPE de suspender a Lei do Piso.
O fracasso do sistema onde as escolas não oferecem estrutura se reflete nas baixas notas da rede municipal do Recife na avaliação do IDEB.
Os centros de ensino são, em boa parte, arranjos que foram chamados de escolas.
Eram casas, oficinas, galpões de festa que foram apropriados - muitos ainda são alugados - pela Prefeitura para dar aulas.
Também no Córrego da Areia, aulas de dança e música são ministradas no refeitório.
Hoje, a Rede Municipal do Recife conta com 222 escolas, das quais 213 contam com “laboratórios de informática” - mas alguns não são bem isso.
Estes laboratórios têm entre 10 e 25 máquinas.
As atividades de informática, que deveriam ser ministradas pelo professor da sala de aula com auxílio dos estagiários, muitas vezes são ministradas por estes, que são em sua maioria jovens entre 16 e 19 anos, sem preparo para serem educadores.
A universalização das aulas de informática está previsto no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), no Plano Nacional da Educação (PNE) para o decênio 2011-2020.
A obrigatoriedade das aulas de Educação Física estão previstas na Lei nº 10.793, de 2003.
No entanto, na capital pernambucana, apenas 28 das 222 escolas possuem quadra poliesportiva coberta.
Há ainda 21 unidades com quadra descoberta.
Mas e professores de educação física?!
Em boa parte destas instituições, os equipamentos servem apenas para os alunos baterem bola fora do horário escolar.
Há também as escolas que colocam os professores de sala para ministrar as atividades de educação física.
Também acontece de o educador dar a bola para os alunos brincarem.
Há ainda as escolas com quadra, mas sem aula de educação física, porque a violência no bairro e/ou entre os alunos é tão grande que os dirigentes escolares temem perder o controle da situação.
No Prado, escola sem biblioteca improvisa usando caixas de madeira de 60 cm.
Aulas de artes e música são ainda menos frequentes.
Estas só são ofertadas - às vezes por estagiários - através do programa Mais Educação, onde o interessado em ministrar a aula procura a escola, que faz o intermédio com a Prefeitura para a contratação dos serviços da pessoa, por R$ 240,00.
Neste formato, só uma minoria tem acesso às aulas - que também são garantidas pela Lei Federal nº 11.769 -, além de deixar clara a indisposição da PCR em buscar profissionais qualificados para servir à educação municipal.
Bibliotecas, direito do estudante, também garantido por Lei Federal, a Lei nº 12.244 de 2010, estão presentes em apenas 124 escolas, das 222.
O baixo índice se reflete na escassa leitura, que contribui para o alto número de analfabetos funcionais - equivalente a 20% dos brasileiros.
Há ainda 70 escolas que dispõem de sala de leitura e ainda uma que dispõe de caixas de madeira.
Limitada pela infraestrutura, uma diretora resolveu fazer bibliotecas “móveis”, de tábua, numa tentativa, pequena, mas preciosa, de dar àquelas crianças novas perspectivas através da leitura.
No Prado, população espera há anos que escola seja transferida Confira a galeria com os registros das visitas nas Escolas Municipais.
Fotos do repórter do Blog, Vinícius Sobreira.