Por Thiago Norões, especial para o Blog de Jamildo A Constituição Federal determina que parte do produto da arrecadação da União com o Imposto de Renda – IR e o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI pertence aos Estados e ao Distrito Federal.

Esses recursos constituem o chamado “Fundo de Participação dos Estados” (o FPE).

Todavia, nossa mais alta lei não estabeleceu como esse bolo deve ser dividido entre os Estados.

Ela delegou essa espinhosa tarefa ao Congresso Nacional.

Com essa finalidade, em dezembro de 1989 foi editada a Lei Complementar nº 62 que procurou fixar os critérios para esse rateio.

Como é muito difícil atender a todos numa partilha como essa, vários Estados, alegando diversas razões, insurgiram-se perante o Supremo Tribunal Federal contra essa lei complementar.

Em fevereiro de 2010, nossa mais alta corte apreciou a questão e declarou a inconstitucionalidade por omissão da lei.

Nessa decisão, concluiu que ela não disciplinava o rateio da forma determinada pela Constituição e determinou que o Congresso Nacional o fizesse até 31 de dezembro de 2012.

Para que não houvesse a interrupção da partilha desses recursos entre os Estados, o STF estabeleceu no mesmo julgamento que, até o fim de 2012, ela deveria ocorrer de acordo com os critérios que estabelecia a LC 62. 31 de dezembro de 2012 chegou sem que o Congresso Nacional apreciasse a matéria.

Ora, os recursos do FPE constituem importante fonte de receita para os Estados.

Os Estados mais pobres e menos populosos dela dependem quase que integralmente.

Assim, para evitar o agravamento da crise financeira dos Estados o Tribunal de Contas da União, responsável pelo cálculo das parcelas a serem atribuídas a cada Estado, iniciou a distribuição em 2013 com base nos critérios revogados pelo Supremo.

Inconformados com essa fragilidade institucional, os governos dos Estados do Maranhão, Bahia, Minas Gerais e Pernambuco ingressaram na segunda-feira passada com uma nova ação no STF para que seja determinado ao Congresso Nacional que trate da questão.

Na quarta-feira, o presidente em exercício do STF, ministro Ricardo Lewandowski, deferiu liminar nessa ação, prorrogando por cento e cinquenta dias a vigência dos critérios de rateio da LC 62.

A questão que surge é o Congresso conseguirá resolver o problema em cento e cinquenta dias, se não o fez em mais de vinte anos?

A primeira observação que se coloca é que não é por simples inércia de nossos legisladores que essa solução não foi encontrada até hoje.

Existem sobre o assunto dez projetos em tramitação no Senado e dezenove na Câmara dos Deputados.

O que ocorre é que a questão é dificílima.

Como deve ser feita essa divisão, considerando-se as enormes diferenças existentes entre os Estados?

Que critérios devem governar esse rateio?

A única “pista” que nos dá a Constituição é que a divisão deve ser feita de modo a “promover o equilíbrio socioeconômico entre Estados e entre Municípios”.

Mas que indicadores devem governar a busca desse equilíbrio?

Outra questão ainda mais grave que esse problema do FPE levanta é a das imperfeições de nosso Pacto Federativo.

O Brasil é uma república federativa baseada eminentemente em compartilhamento de receitas e responsabilidades, o que se convencionou chamar de “federalismo cooperativo”.

Embora União, Estados, Distrito Federal e Municípios tenham competência para instituir e cobrar seus próprios tributos, parte do que é arrecadado pela União pertence aos demais entes federativos.

O mesmo ocorre com a receita dos Estados com o ICMS: 25% pertencem aos Municípios.

Da mesma forma, o financiamento da atividade estatal deve ser repartida entre essas três esferas de governo.

O que se questiona nesse modelo é se essa repartição de receitas e responsabilidades é feita de forma justa.

Muitos defendem que não e que mecanismos que deveriam servir para mitigar desigualdades acabam por agravar os desequilíbrios existentes neste nosso país continental.

Essas e outras questões devem ser levadas em conta quando se pauta a discussão dos critérios de rateio do FPE entre os Estados.

Esse debate não pode ser feito de forma isolada e ele não será resolvido com a edição de uma nova lei complementar que venha a estabelecer o formato dessa partilha.

A discussão que deve ser feita é que papel deve caber à União, Estados, Distrito Federal e Municípios em nossa federação e de que formas o “equilíbrio socioeconômico entre Estados e entre Municípios” a que se refere a nossa Constituição pode efetivamente ser alcançado.