Por Ronnie Preus Duarte Desde que me entendo por gente, sou usuário de planos de saúde.

Sou de um tempo em que os planos faziam clientes, nunca vítimas.

Sou de uma época na qual praticamente todos os bons médicos tinham orgulho de participar da rede credenciada das seguradoras.

Sou de quando o cliente particular, pagador da consulta, recebia a mesma atenção dispensada ao cliente-segurado.

O quadro atual é sombrio, e pelo que se percebe, ainda há de ficar ainda mais soturno.

Lembro que, há uns dois anos, necessitei de um exame dos mais óbvios, uma radiografia (ou “raio-x”, como habitualmente chamamos).

Dirigi-me a clínica e perdi uma tarde inteira na interminável fila de pacientes de uma das maiores clínicas do Recife.

Senti-me, na ocasião, como um personagem de enredo passado em alguma unidade bastante concorrida do Sistema Único de Saúde.

Era o início de uma ladeira descendente que se torna, a cada instante, mais íngreme.

Na última semana, ouvi de uma colega grávida que, necessitando de um exame tomográfico, teve a marcação dos exames para dali a 90 (noventa) longos dias, equivalentes a uma terça parte da sua gestação.

Três meses de espera, a depender do mal, pode fazer do doente um defunto.

E daí?

Um exame e uma despesa a menos, pensarão os gestores do novo modelo de gestão de saúde privada.

As operadoras dos planos de saúde, sempre pródigas em negativas de cobertura, são sabedores que as estatísticas garantem o incremento dos respectivos ganhos: apenas uma minoria recorre à Justiça e, quando perdem a demanda ajuizada, são geralmente condenadas apenas ao atendimento que foi primitivamente subtraído do usuário.

A condenação em danos morais, em casos tais, pode ser útil na repressão à lastimável conduta, que atinge as operadoras em ponto sensível: o bolso.

Na mesma toada, os nebulosos critérios para os reajustes nas mensalidades.

Após desestimularem economicamente a contratação de planos individuais (cujos índices de reajuste são impostos pela ANS), as seguradoras passaram a investir na formação de “grupos”, que permitem a declamação do mantra dos “índices de sinistralidade” para justificar aumentos abusivos e incompreendidos pela maioria das suas vítimas.

Nenhum esclarecimento, nenhuma planilha, nenhum comitê de fiscalização pelos usuários. É o boleto bancário que escancara, de supetão, o vergonhoso acréscimo.

A inércia do Poder Público no exercício da atividade reguladora leva a um acelerado decréscimo qualitativo do atendimento, deixando usuários, médicos e hospitais profundamente insatisfeitos.

Todos, menos as seguradoras, sofrem com o modelo vigente.

Mais uma vez, são os grandes grupos financeiros que findam por gargalhar de todos nós, que pagamos caro por um atendimento que se aproxima a passos largos daquele prestado na assoberbada rede pública.

A continuar o atual estado de coisas, a próxima corrente de migração da sofrida “clientela” há de ser para a rede do SUS que, a despeito de se situar muito aquém do desejável, pelo menos é gratuita.

Pela saúde dos nossos filhos e netos, devemos agir.

Ronnie Preus Duarte é Presidente da Caixa de Assistência do Advogado (CAA) da OAB-PE (*)