(Charge: Miguel) O SENTIMENTO DE “BOM DIA, VIETNÃ!” NO PÓS ELEIÇÃO EM RECIFE 2012 Por Otávio Luiz Machado* A segunda-feira amanheceu em Recife nada convidativa para os que acreditavam que a luta eleitoral iria continuar no segundo turno.

Se num dos filmes de guerra a cena do soldado gritando “bom dia, Vietnã!” indicava um pouco o estado de espírito dos combatentes naquela ocasião, acredito que tal imagem pode ser transposta para um “bom dia, Recife!” para muitos de nós.

Um sintoma de que o projeto político diferente era exigido pela população de Recife ficou claro na eleição presidencial de 2010, quando Dilma por pouco não perdeu para Marina Silva na cidade do Recife, cuja gestão do PT já estava delimitada há uma década.

A eleição de 2010 já demonstrou isso.

O resultado do PT é ultrajante, porque acabou tendo um resultado parecido que Serra teve por aqui em 2010.

O PT recifense, que ficou fragilizado através do cometimento de inúmeros erros, também não sobreviveu à primeira grande batalha diante do poderio bélico da chamada Frente Popular.

Não deixou ser esmagado por completo, embora se encontre com muitos mortos e feridos.

Também apresentou muitos desertores, como é o caso do prefeito João da Costa, que não só desertou, mas passou para o lado “inimigo”.

Mas as derrotas também são didáticas.

O caso do governador Eduardo Campos é um exemplo, porque lá atrás viveu esse drama.

A diferença é que aprendeu.

A maior delas é que o governo precisa trabalhar para o cidadão, inclusive aplicando a eficiência na gestão pública, que foi um conceito muito questionado por setores da esquerda pois para eles isso representava um discurso neoliberal e de direita.

Não será difícil para o prefeito eleito Geraldo Júlio fazer uma gestão melhor que a do atual prefeito João da Costa, que diga-se de passagem foi um dos maiores cabos eleitorais do candidato do PSB, seja no exemplo a não ser seguido que foi explorado na propaganda eleitoral, seja na sua atitude de “neutralidade” no posicionamento dos candidatos.

O abandono da cidade, que se acentuou nesse período eleitoral só pode ser proposital.

Ao não chegar nem a 20% do eleitorado, a candidatura do PT com Humberto Costa e João Paulo só mostrou que algo precisa ser feito para que o PT não se definhe ainda mais.

A candidatura de Daniel Coelho foi de fato a grande vencedora nessas eleições, porque foi aquela que convenceu o eleitor utilizando-se a apresentação de propostas no diálogo mais direto com a população sem grandes esquemas de campanha ou de apoios de terceiros.

Ao que tudo indica só em 2014 teremos efetivamente o primeiro saldo dessa verdadeira guerra, que não termina agora.

Só vai ser um recomeçar de tudo internamente em partidos como o PT, mas é possível que entre os partidos isso também não fique atrás.

No Recife Daniel Coelho teve sua vitória política e pessoal, embora eleitoralmente foi derrotado.

Geraldo Júlio pode contabilizar uma vitória eleitoral, enquanto Humberto Costa e João Paulo sofreram uma derrocada não tão esperada.

No todo só o futuro vai indicar como essas vitórias eleitorais, pessoais e políticas serão absorvidas e canalizadas para o projeto político que cada um deles representam.

No balanço do Brasil, ainda é cedo para dizer qual legenda foi a grande vitoriosa, embora não se poder negar o protagonismo do governador Eduardo Campos e do ex-Presidente Lula em condições de igualdade.

O PT perdeu em Belo Horizonte para o PSB-PSDB, embora conquistou vitórias em cidades importantes como Uberlândia e Valadares e foi para o segundo turno em Juiz de Fora, que é populosa e estratégica no eixo político Minas-Rio-São Paulo.

O PSB penetrou em importantes cidades do interior de São Paulo e disputa no segundo capitais importantes como Florianópolis e Fortaleza.

O PT pode manter uma posição consolidada se ganhar em São Paulo contra o PSDB e em Salvador contra o DEM, que se encontram no ranking dos cinco maiores colégios eleitorais do País.

Ainda tem Manaus para o PT pintar o mapa geral do Brasil.

O PSB conquistando Recife ganhou um importante espaço no Nordeste, embora a derrota do PT foi algo localizada – se comparada com as demais capitais – diante dos inúmeros e permanentes erros oriundos da falta de unidade política.

Não foi uma derrota do candidato Humberto Costa (com João Paulo) pura e simples.

Foi a derrota do projeto político, o que é mais grave, sendo sim responsabilidade de muitos.

O saldo positivo dessas eleições é que além da guerra suja pelo poder também existem condições objetivas para que o cidadão não seja apenas representado no poder, mas que definitiva e concretamente exerça o poder estatal.

A retirada do candidato ficha-suja é um exemplo disso, porque veio da mobilização popular, sem contar a inserção na agenda dos candidatos propostas que reconhecem direitos e que não terão como ser esquecidas na gestão.

O ponto final ao projeto do PT e a renovação significativa na Câmara Municipal bem expresso nas escolhas eleitorais também significa que a capacidade de moldar uma cidade sob outras bases pode ser só o começo de tudo.

Os resultados pífios dos últimos três anos – tanto de todo o executivo quanto de boa parte do legislativo – tiveram uma resposta forte do eleitorado, o que significa que estamos sim a cada dia mais amadurecidos democraticamente.

Independentemente da posição que cada um de nós tivemos nessas eleições, o que importa agora é continuarmos dando nossa contribuição naquilo que possamos contribuir para a sociedade dentro de nossos respectivos lugares sociais, porque não é só um grupo político que vai fazer tudo pelo conjunto da cidade.

A sociedade civil – e cada cidadão em particular – precisa continuar demonstrar sua força para que as coisas mudem.

O que vai além dessas eleições! *Otávio Luiz Machado é educador, pesquisador, escritor e documentarista.

E-mail: otaviomachado3@yahoo.com.br Veja também: No Recife, discurso petista no dia das eleições é marcado pela autofagia Humberto e João Paulo reconhecem derrota eleitoral, mas não política