(Foto: JC Imagem) Por Gilvan Oliveira e Paulo Sérgio Scarpa No Jornal do Commercio deste domingo Às vésperas dos 79 anos (dia 17), Roberto Magalhães, advogado, ex-governador, ex-prefeito do Recife e ex-deputado federal, lança dia 10, às 19h, no Museu do Estado, o seu livro “Memórias, As Virtudes do Tempo” (Bagaço). “Não é uma autobiografia, é livro de reflexão”, adverte.

Ele fala da infância, da formação “eminentemente sertaneja”, defende seus princípios e justifica as opções partidárias. “Estão esperando um livro polêmico, não tem nada disso, mas falo a verdade”, adiantou a Gilvan Oliveira e Paulo Sérgio Scarpa.

Leia trechos da entrevista.

JORNAL DO COMMERCIO - O que o motivou a escrever um livro de memórias?

ROBERTO MAGALHÃES - Pretendi narrar com fidelidade minha experiência de vida com o intuito de esclarecer, retificar ou interpretar fatos e circunstâncias.

Esses escritos refletem apenas o desejo, talvez o dever, de deixar um depoimento sobre os caminhos que trilhei e porque foram eles e não outros os escolhidos.

JC - O livro tem fotos?

MAGALHÃES - Começa com um retrato meu aos 11 anos.

Acho engraçado colocar um bebê nu, como fazem (mas não fiz).

Tem fotos com Tancredo Neves, em 1984, na campanha ao Colégio Eleitoral, poucas fotos com a família, minha mulher e filhos, meus pais, eu prefeito do Recife.

Mas a mais significativa é uma em Jerusalém, ao plantar uma árvore, uma deferência deles (Estado de Israel), quando visitava o Museu do Holocausto.

JC - O que é o seu livro?

MAGALHÃES – Não é uma biografia, que é mais apropriada a grandes presidentes ou intelectuais e ganhadores do Prêmio Nobel.

Eu não me sentiria motivado a fazer uma biografia, mas me motivei a escrever o livro para contar um pouco de biografia.

E vi que não podia fazer isso sem falar de política e da minha trajetória.

Por isso, o primeiro capítulo é Minhas Origens.

Pensei em falar de minhas origens porque elas explicam muito sobre a minha formação e alguns valores em relação aos quais jamais transigi.

Minha educação foi eminentemente sertaneja.

Meu pai, de Floresta, minha mãe, de Serra Talhada.

JC - Uma educação rígida.

MAGALHÃES - Não só. É não levar desaforo para casa. É ter atitudes incompreendidas, como aquela minha reação na praia (campanha pela reeleição em 2000), quando ouvi, com minha mulher, os piores palavrões de uma malta petista.

Tudo uma armação e tudo está no livro, onde defendo minhas posições.

Não no caso da minha ida ao Jornal do Commercio (quando entrou armado na redação em 1999), que reconheço foi um erro grave.

Um erro muito grave.

JC - Foi seu maior erro político?

MAGALHÃES - Talvez tenha sido, talvez tenha sido.

Mas tudo provocado por esquemas que me levaram a isso, apostaram no meu temperamento e nessa minha formação.

Eu nunca me preparei para ser político, para ouvir um desaforo e fazer que não ouvi e rir.

Me preparei para ser advogado e professor.

JC - O gosto pela política surgiu quando foi secretário estadual da Educação?

MAGALHÃES - Tudo aconteceu num acidente.

Estava no Fórum do Recife quando recebi recado do governador Nilo Coelho, queria falar comigo.

Ele já tinha me dado algumas missões no interior, ele me conheceu menino.

Fui e ele me disse que queria me convidar para ser seu secretário de Educação com a renúncia do Barreto Guimarães. “Quanto tempo tenho para pensar?”, perguntei. “Nenhum. É para ontem”, disse ele. “Tem de ser noticiado amanhã com a demissão de Barreto e sua nomeação”.

No livro eu conto porque aceitei.

JC - Alguém sugeriu que escrevesse?

MAGALHÃES - Algumas pessoas falaram que eu tinha que escrever, mas eu achava que não era a hora.

Tinha de pensar.

Mas se o livro não for didático, principalmente para os políticos mais jovens, não valeu a pena escrevê-lo.

JC - O senhor foi identificado com a ala conservadora, entrou no PSDB para ser vice de Mário Covas e saiu do partido.

Por quê?

MAGALHÃES - Está tudo no livro. É a primeira vez que conto tudo, as razões de minha saída do partido e a renúncia à vice.

Embora tenha militado em partido conservador, não sou conservador.

Gosto de conservar o que deve ser conservado.

JC - O senhor publica os nomes dos pernambucanos que forçaram a sua saída do PSDB?

MAGALHÃES - Cristina Tavares era a líder, todos sabiam, mas não cito o nome dela.

Estão esperando um livro polêmico, mas não tem nada disso.

Mas eu escrevo a verdade.

As pessoas inteligentes irão saber que eu perdi a eleição para senador porque fui vencido pela força de Miguel Arraes, mas existe um depoimento do jornalista Ney Figueiredo, autor da orelha do livro, que me disse na época que eu não venceria a eleição porque praticamente não tinha propaganda própria, eu vivia apenas do meu retrospecto.

JC - As pesquisas mentiram que estava eleito?

MAGALHÃES - Ninguém mentiu, faltou apoio.

Em um momento, eu me senti só.

Eu não acuso ninguém porque diziam “o dr.

Roberto está eleito”, mas todo mundo sabe que ninguém se elege na véspera.

O partido (PFL) não se empenhou na minha eleição.

Havia quem não quisesse a minha eleição?

Não sei.

Havia alguém que correu porque achava que eu estava eleito? É possível.

Para o bom entendedor, está tudo no livro.

JC - Detectou a falta de apoio a Margarida Cantarelli?

MAGALHÃES - Não, ela era novata na política e precisavam fazer força por ela.

Margarida (disputava a 2ª vaga no Senado) teve muito apoio.

JC - No final de 1986, o senhor explicou a derrota ao dizer que o pernambucano devora quem mais ama.

Ainda pensa assim?

MAGALHÃES - Curiosamente, não me lembro disso, tem um certo viés de razão porque nunca fui tão forte em política como quando perdi a eleição.

As pessoas vinham falar comigo nas ruas, foi uma comoção.

Parecia até que estava eleito.

Tanto que, nas eleições presidenciais, tive três convites para ser vice: de Paulo Maluf, de Aureliano Chaves e de Mário Covas.

JC - O senhor analisa o Brasil?

MAGALHÃES - Não quis um livro apenas sobre o passado.

O livro tem 364 páginas, a partir da 320ª falo do Brasil e do futuro, em diversos capítulos: Pensando o Brasil, os governos entre 1964 e 1985, sobre os quais não faço apreciação já que, hoje, não se fala nem das suas obras, mas digo que os governos FHC e Lula, embora bem avaliados, serão julgados pela História.

Trato das reformas constitucionais, da corrupção na sociedade e no Estado, sobre o processo eleitoral, a globalização e encerro com as novas gerações.

Nós, brasileiros, devemos acreditar no futuro e apostar nas novas gerações.

Digo isso porque acredito que consertar o Brasil a curto prazo é impossível.

JC - Por que o pessimismo?

MAGALHÃES - Porque o País é muito grande, é uma Federação e carrega uma carga de mazelas que só tem se agravado.

A evolução no Brasil, porém, tem sido permanente.

JC - Sua primeira referência política foi Agamenon Magalhães?

MAGALHÃES - Sim.

Sou da geração de meninos da Segunda Guerra Mundial e falo disso no livro.

Então, Agamenon foi o primeiro político que vi de perto e com o qual pude conversar, apesar de menino.

Era da estirpe de um chanceler, Santiago Dantas, de quem fui aluno, que mantinha uma distância natural das pessoas, até dos mais íntimos.

JC - O que ficou de Agamenon?

MAGALHÃES - Ele teve sempre um grande respeito pela coisa pública.

Quando morreu, deixou a Folha da Manhã, jornal que marcou o Estado porque Agamenon escrevia artigos, quase sempre bem pequenos.

Quando governador, pedi a Nilo Pereira que fizesse uma coletânea dos artigos.

Quem me mandou trabalhar no Rio de Janeiro foi o PSD, quem me trouxe de volta ao Recife foi a UDN.

Toda a história está no livro.