Por Gustavo Krause, especial para o Blog de Jamildo No Recife, prevaleceu o imponderável.

Em grandes proporções e com rapidez inusitada.

Os partidos governistas e hegemônicos implodiram a Frente Popular.

A oposição teve a chance de fazer o caminho inverso: o caminho da unidade.

Não conseguiu.

A política, como o coração, tem razões que a própria razão desconhece.

Se um atento observador da cena política acordasse hoje, depois de submetido a uma sonoterapia de, vamos lá, 60 dias, não acreditaria no que está vendo e, precisaria de tempo para ruminar e entender o que, à primeira vista, pareceria o famoso “samba do crioulo doido”.

Pelo menos, duvidaria da “natureza científica” da política.

Aos poucos, todavia, o observador perceberia que o cenário tem lógica, lógica perversa que obedece a roteiro (dez) arrazoado: 1.

A Política é a busca pelo poder.

A História, o relato dessa busca. 2.

O discurso que jura que o poder é meio, o instrumento capaz de colocar em prática valores, princípios, ideias e ações transformadoras é uma canção de ninar bovinos sonolentos. 3.

No caso do Recife, o poder municipal é o que menos importa.

Olhos, corpo e alma dos atores já se deslocaram em direção a 2014, ano da graça, para as pretensões e projetos estaduais e presidenciais. 4.

Desta forma, é insuficiente qualquer nome que se queira dar às estranhas desavenças e aos novos ajuntamentos: a verdade é que miram as eleições de 2014.

No atacado, tocam fogo nas ambições que movem projetos nacionais e, no varejo, atendem ao salve-se quem puder das conveniências pessoais. 5.

Por sua vez, a implosão do concubinato entre várias siglas e o PT foi decorrência do risco da reeleição do atual prefeito.

A candidatura sofria rejeição popular e falta de suporte político das lideranças do PT e partidos aliados.

O medo de perder o poder e suas benesses transformou a luta política no sangrento vale-tudo que culminou com o uso de métodos stalinistas no aniquilamento da candidatura de João da Costa.

Abriu-se a avenida para desfilar dois estandartes: o “jeito petista de governar” e o “jeito socialista de governar”.

O que antes era uma fusão, sob as bênçãos do dístico “paz e amor”, transformou-se numa cisão alimentada pelo sentimento de “guerra e ódio”.

O Planalto tomou conta da planície recifense.

No Cais do Apolo, o palácio Capibaribe e a vida do cidadão recifense são meros detalhes. 6.

Em outras palavras, os sócios do empreendimento que era governar Recife desconstruíram completamente a gestão.

Assim, deram total razão à aguerrida voz da oposição na Câmara Municipal. 7.

A propósito, o que está posto diante do povo do Recife subverte a retórica universal da competição eleitoral: quem está no poder defende a CONTINUIDADE da gestão; quem está na oposição defende a MUDANÇA da gestão.

Ou seja, o contorcionismo verbal, a retórica ilusionista, a propaganda enganosa, tudo será usado para superar a clássica questão SER OU NÃO SER e convencer o eleitor de que é possível SER E NÃO SER ao mesmo tempo. 8.

Neste quadro, há dois fatos irrecusáveis.

Primeiro, o candidato Mendonça Filho não tem explicações a dar.

Não precisa desconstruir ou desqualificar o mau governo.

Os aliados já fizeram.

Cuspiram, diz o povo, no prato onde comeram.

Segundo, neste processo existem duas vítimas, agredidas, desrespeitadas e visceralmente ligadas: o povo e a cidade do Recife. 9.

Logo, o candidato Mendonça pode e deve articular o discurso propositivo e o esforço de campanha com foco nos problemas da cidade, agravados pelas más gestões.

Experiência e conhecimento sobram no candidato.

Nada mirabolante e falacioso como propostas.

O que é factível está à vista e é percebido por todos os cidadãos.

O candidato tem atestado de bom gestor lavrado no cartório da credibilidade política.

Já foi provado e aprovado.

O compromisso de fazer e fazer bem devem ser turbinados por doses maciças de amor pelo Recife. É fundamental nunca esquecer que a cidade é o mundo real e um organismo vivo.

Portanto, um feixe de nervos e emoções. 10.

Com a palavra, pois, o eleitor, soberano juiz da peleja democrática.

A ele cabe escolher se decide com discernimento ou, se tratado como rebanho, abdica da tradição de uma cidade politizada, entidade constitucionalmente autônoma, e se transforma servilmente numa repartição subordinada ao governo do Estado ao a um partido que transformou a gestão num aparelho partidário.

Por fim, cabe registrar que o desenho do processo político na sucessão do Recife foi marcado pela prevalência das conveniências sobre as convicções e do pragmático sobre o programático.

Para dizer o mínimo.