Por Hélder Lopes Bandeiras vermelhas, camisas pintadas, rostos felizes, gritos, brindes e gargalhadas.

Foi o que se viu na noite de ontem, já entrando pela madrugada, na Rua da Hora, no bairro do Espinheiro, num bar reduto certo de petistas da corrente Construindo um Novo Brasil.

Era o bacanal de Herodes.

A literatura que remete àquele tempo costuma registrar que nas festas promovidas por ele se extrapolava tanto a ponto de cada convidado manter sempre ao seu lado um balde para vomitar, e tornar a comer e beber.

Em nome de que?

Em nome de quem?

No conto de Flaubert, numa dessas festas, Salomé, filha de Herodes, depois de seduzí-lo pede ao pai a cabeça de São João Batista.

Apesar de não haver motivos para decapitá-lo, Herodes, com o balde cheio de vômitos e gargalhadas, executa o prisioneiro.

Também a filha não sabia porque queria vê-lo morto.

Na mesma bandeja que serviam comidas, a cabeça ensanguentada é exposta no bacanal, um verdadeiro troféu para Herodíade, esposa do todo poderoso e encarnação da “introspecção saturada” redescoberta a cada vazio diante do espelho.

Demorei para crer que o aglomerado no Espinheiro era mesmo uma festa.

Demorei para crer que se comemorava uma intervenção anti-democrática e violenta.

Demorei para crer que serviam cabeças, no lugar de comidas e bebidas.

Em nome de que?

Em nome de quem?

Em nome da manutenção de uma aristocracia falida e derrotada.

Em nome de um senador frustrado que há décadas tenta se lançar majoritário e é limado ora pelo partido, ora pela Frente, ora pela sociedade.

Em nome de um deputado federal que promoveu um leilão de si mesmo mas não encontrou ninguém disposto a dar um lance sequer por ele.

Em nome de um projeto que não é nosso, que não é do Partido dos Trabalhadores.

A festa é dos sem vergonha.

Ou melhor, dos envergonhados.

Fecharam-se em seus casulos para não serem obrigados a ouvirem de alguém ao lado: “vocês estão comemorando o que?”. É melhor não correr o risco de ter que se justificar.

Companheiros, cubram seus rostos com essas bandeiras.

Bebam e vomitem o quanto puderem.

Comemorem a derrota dos “maloqueiros”.

Decepem as cabeças dos kamikases.

Vibrem, muito.

Mas não esqueçam que estamos vivos.

Que a cabeça exposta na bandeja não é nossa.

Estamos bem próximos de vocês, estamos estampados nas camisas que vocês derramaram uísque, nas bandeiras que usaram para limpar a boca e as mãos sujas de sangue.