Com palavras conciliadoras e um encontro na residência do ministro Gilmar Mendes, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto, atuou como bombeiro para abafar a crise que colocou a Corte em rota de colisão com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na noite de terça-feira (29), horas depois de ter se encontrado com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, o presidente do Supremo foi à casa de Gilmar Mendes. “Não fui lá para me solidarizar ou recriminar.

Fui conversar com ele”, disse nesta quarta-feira (30) Britto. “Foi uma iniciativa minha.

Trocamos umas ideias”, acrescentou o presidente do Supremo. “Ele (Mendes) estava razoavelmente bem.” A reunião ocorreu após a posse do ministro José Antonio Dias Toffoli no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e depois de uma cerimônia na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Esperado na solenidade do TSE, Gilmar Mendes não apareceu.

Horas antes, em entrevista coletiva a jornalistas, Mendes tinha feito várias acusações a Lula e a pessoas que, na opinião do ministro, tentam atrapalhar o julgamento do mensalão ao espalharem boatos de que uma viagem a Berlim teria sido paga pelo esquema do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.

Mendes diz que o Supremo arcou com parte dos custos, pois se tratava de viagem oficial, e que ele próprio pagou os demais valores.

Antes de falar com Mendes, Ayres Britto conversou com todos os integrantes do STF, pessoalmente ou por telefone.

Ministros confidenciaram que a imagem do tribunal passou por um desgaste com essa crise e que era preciso estancar o processo.

Mas a maioria concluiu que não era o caso de o Supremo defender publicamente Mendes, até porque uma nota oficial do STF acrescentaria tensão ao caso, em vez de esvaziá-lo.

Indagado sobre a falta de uma manifestação oficial do tribunal em defesa de Mendes, Britto disse que o colega não pediu nada e ninguém tomou a iniciativa “porque entendeu que não há gravidade suficiente para isso”.

Mas, a pessoas próximas, Mendes disse ter comentado com Ayres Britto que o sangue subira à sua cabeça.

Nesta quarta, menos de 24 horas após o “desabafo” de Mendes, o ministro chegou à sessão plenária do STF sem querer dar entrevista, numa demonstração de que Ayres Britto teria conseguido convencê-lo a maneirar nas acusações.

Ayres Britto, por sua vez, negou que o ocorrido tenha desgastado a imagem da Justiça. “O Judiciário está imune a esses dissensos.

Tenho dito reiteradamente que somos experimentados em enfrentamento de situações de toda ordem.

Isso não nos tira do eixo.

Não perdemos o foco que o nosso dever é julgar todo e qualquer processo, inclusive esse chamado de mensalão, com objetividade, imparcialidade, serenidade, enfim, atentos todos nós às provas dos autos.” O presidente do STF disse que não há risco de uma crise institucional. “Não vejo por esse prisma de nenhum modo.

O Supremo Tribunal Federal é sobranceiro, altivo, independente, consciente de sua função institucional.

E não se afasta disso.” Ayres Britto negou que tenha conversado com a presidente Dilma Rousseff sobre o episódio.

Na terça-feira, os dois estiveram juntos. “Conversamos sobre assuntos variados da administração pública, que diz respeito aos dois poderes, mas focadamente discutimos a Rio +20.

Sua Excelência me convidou para fazer parte da delegação”, disse, sobre o encontro que durou mais de uma hora.

O presidente do Supremo defendeu que o julgamento do mensalão seja marcado, até para evitar mais desgaste.

Mas disse que isso somente ocorrerá após o ministro revisor do processo, Ricardo Lewandowski, concluir o seu voto.

A expectativa é de que isso ocorra em meados de junho.