Hélio quer ser padre e é devoto de Santa Rita de Cássia (Foto: Blog de Jamildo) Gabriela López, repórter do Blog de Jamildo Em setembro, a vida do estudante José Hélio Vieira, 17 anos, deve mudar completamente.
O adolescente ganhou uma bolsa para estudar no México pelo programa de intercâmbio Rotary, dedicado a identificar e incentivar a liderança em jovens.
Ele deixará a casa onde vive desde que nasceu com a mãe e a avó em Afogados, na Zona Norte do Recife, para morar com uma família que o adotará durante um ano.
Tudo será novidade, já que uma das viagens mais longa que fez foi para Surubim, no Agreste do Estado, nas últimas férias.
A oportunidade chegou do jeito de Hélio: simples.
Em 2010, durante um seminário da Rotary na Escola Nossa Senhora de Fátima, onde estudou, a maioria dos alunos assistiram às palestras indiferente.
Hélio, não.
Contestou uma das palestrantes. “Ela disse que Lula tinha reduzido o desmatamento.
Eu disse que ele ajudou os ruralistas a explorar as terras.
Eu não imaginava que poderia ganhar uma bolsa com aquilo.
Debati com a palestrante porque sempre fui muito crítico com os problemas ambientais”, lembra.
Uma atitude corriqueira para Hélio impressionou a presidente da Comissão de Novas Gerações do Rotary, Celma Antonino. “No seminário, descobrimos um menino fora de sério, que é muito bem entendido sobre as coisas, muito educado e com muita firmeza das coisas que faz”, comenta Celma.
Depois disso, veio o convite para uma viagem totalmente financiada pelo Rotary. “Ele fez uma entrevista e foi aprovado.
Todos gostaram dele.
E isto é importante.
Não podemos mandar uma pessoa sem qualidade para representar o Brasil lá fora”.
José Hélio não é mesmo um adolescente comum.
Ignora as histórias dos colegas, de gente que desiste dos estudos, que entra na criminalidade.
Em vez disso, exibe boas notas e é o representante da turma.
Pelo menos três vezes por semana vai à igreja.
Quer ser padre.
Não se vê fazendo outra coisa, assevera.
Aliás, quando voltar do México, onde deve terminar o ensino médio, já planeja entrar no Seminário. É coroinha e ajuda a manter a capelinha do bairro, em homenagem a Santa Rita de Cássia, localizada a 200 metros da casa dele.
Aos 8 anos, pedia para ir à escola sozinho.
Aos 10, organizou uma procissão na comunidade.
Apesar de ser devoto de Santa Rita de Cássia, invocada para as causas impossíveis, a palavra “impossível” não consta no vocabulário de vida dele.
Quando terminou a alfabetização em uma escola particular, a mãe diarista não tinha mais dinheiro para bancar a educação do filho e precisou colocá-lo no sistema público.
Ao terminar o ensino fundamental na Escola Nossa Senhora de Fátima passou no teste para estudar na escola técnica e de ensino integral Cícero Dias - referência no Estado -, em Boa Viagem, zona Sul.
Ele podia ir para a Amaury de Medeiros, mas não, escolheu a melhor.
Hoje, pega dois metrôs e quatro ônibus para ir e voltar do colégio.
Acorda às 5h e só chega em casa por volta das 19h.
E não reclama. “Eu agradeço por ser de escola pública.
Pude ver a vida dura que meus amigos levam e compartilhar a minha com eles.
Acho que isso me tornou uma pessoa melhor.
Se eu tivesse sido de escola particular, talvez nunca conheceria a vida dura e poderia ser prepotente”.
A ideia inicial era ir aos Estados Unidos, mas a idade de Hélio foi incompatível com a exigência do país.
Daí veio o México, que, claro, o jovem não recusou.
Há cerca de quatro meses, ele participa de reuniões semanais para saber as regras do intercâmbio, como não tomar bebidas alcoólicas nem dirigir.
Mas manter a disciplina não é tarefa difícil para o jeito pacato e simples de Hélio.
Nos fins de semana, quando não está na Igreja, gosta de tocar violão.
Um dos maiores medos que têm da viagem?
A comida. “Já li que tudo lá é bem picante e que, se você recursar, eles ficam chateados.
Mas eu tenho gastrite”, brinca.
Ainda nos planejamentos para o embarque, está se programando para estudar espanhol com uma amiga.
Tudo isto o adolescente conta à reportagem ao lado dos ouvidos atentos da mãe.
Dona Edione Vieira da Silva, 47, criou o filho sozinha e não esconde o aperto no coração com a viagem. “No começo, eu não queria que ele fosse, mas ele disse que ia nem que fugisse de casa”, diz em tom de brincadeira. “Hoje eu estou muito feliz por ele. É uma oportunidade que eu nunca poderia dar e tenho muito orgulho do meu filho.
Nunca me deu problemas.
Ele aprendeu a ler sozinho”, conta orgulhosa.
Mas Hélio já deu um jeito na saudade da mãe.
Adotou uma gatinha da rua.
Chiquinha deverá ocupar um pouquinho do vazio que Hélio vai deixar na vida da mãe e dos amigos para levar sua simplicidade e fé na vida para outro país.