No Recife, contrato de lixo originou rompimento de prefeito e sucessor Por Murillo Camarotto, do Recife Um conturbado processo de licitação para serviços de coleta de lixo e limpeza urbana pode estar por trás de uma das disputas políticas mais acirradas já vistas no Recife.

No centro da polêmica estão dois petistas: o prefeito, João da Costa, e o antecessor, o deputado João Paulo Lima e Silva.

De aliados siameses, eles passaram a inimigos ferrenhos e agora estão em lados opostos na virulenta disputa interna em curso do PT pernambucano.

Prefeito entre 2001 e 2008, João Paulo peitou os principais caciques petistas do Estado ao nomear a sua sucessão o então secretário João da Costa, eleito em primeiro turno.

Nos primeiros meses o novo prefeito enfrentou grave crise na coleta de lixo, que desgastou precocemente sua imagem e gerou as primeiras críticas públicas do antecessor.

Quando João da Costa assumiu, a coleta de lixo era feita Qualix, controlada pelo grupo argentino Macri.

O contrato de cinco anos venceria alguns dias depois e não poderia mais ser prorrogado.

Para evitar a paralisação, o novo prefeito dispensou licitação para manter a empresa - que prestava o serviço no Recife desde 1985 - por mais seis meses.

Nova licitação foi aberta para que o contrato definitivo pudesse ser assinado em julho de 2009.

Contudo, questionamentos do Tribunal de Contas do Estado (TCE) postergaram a licitação.

Segundo o órgão, alguns serviços estavam com valores até 50% superiores aos do mercado.

Sem garantias de renovação, a Qualix segurou os investimentos e comprometeu a qualidade do serviço.

A crise marcou o início do inferno astral do atual prefeito, que recebeu mal as críticas do antecessor.

Após o rompimento, se isolou e quase perdeu o direito de disputar a reeleição.

Teve de passar pela prévia partidária, realizada ontem.

A vitória, no entanto, tem de ser homologada pela cúpula do PT. (Ver reportagem abaixo) Após instaurar auditoria no contrato, o TCE questionou também o modelo de licitação, pelo qual apenas duas empresas ficam responsáveis por toda a cidade, sendo uma delas com 80% do território.

O tribunal defendia mais concorrência para derrubar os preços.

Em cautelar, reduziu os valores dos serviços.

O imbróglio se estendeu e resultou em nova dispensa de licitação, desta vez com outra empresa à frente.

Em agosto de 2009 assumiu a Vital Engenharia, controlada pela Queiroz Galvão, um dos maiores grupos pernambucanos.

A troca de concessionária é tida nos bastidores como a real motivação da briga entre prefeito e antecessor, que apesar da constante troca de farpas, se recusam a revelar por que romperam.

Diante da limitação de preços imposta pelo TCE, a empresa acionou a Justiça e conseguiu liminar para retomar os preços originais.

Na avaliação de José Ricardo de Oliveira, inspetor de obras públicas do TCE pernambucano, a situação “extrapola o razoável” e desconsidera o papel do Tribunal de Contas. “A Procuradoria do Estado entra com recurso, mas os desembargadores não analisam o mérito, alegam apenas que o contrato deve ser cumprido”, queixa-se.

A vereadora Priscila Krause (DEM) diz que a prefeitura, maior interessada em pagar menos pelo serviço, não recorreu da decisão. “A Queiroz Galvão é quem toca hoje a maior obra da prefeitura”, afirma, sobre a Via Mangue, complexo viário de centenas de milhões de reais.

A Prefeitura do Recife informa que recorreu da decisão sem sucesso.

Já a Vital alega que os preços maiores refletem o patamar diferenciado dos serviços que oferece, citando os caminhões mais modernos e o maior contingente de garis.

O contrato definitivo com a Vital, vencedora da concorrência, foi assinado em outubro de 2010, quase nove meses após o fim do prazo definido para a segunda dispensa de licitação.

A empresa é responsável pela coleta de lixo e limpeza urbana em 80% da capital até outubro de 2015 e receberá R$ 449 milhões.

Os 20% (R$ 132 milhões) restantes ficaram como a Coelho Andrade Engenharia.