Por Edilson Silva Governava ainda a cidade o ex-prefeito Roberto Magalhães, quando às terças-feiras via-se o meu sempre querido companheiro Adeildo (eram muitos e cito Adeildo para simbolizar aquela geração) e outros, como eu, no pagode do Didi - por trás dos Correios, na Guararapes -, fazendo um esforço para criar um espaço unificado, de referência e resistência político-cultural do povo negro na cidade.

Nascia ali a Terça Negra, com a presença de Maracatus, Afoxés, Côcos e outras expressões artísticas e religiosas do povo negro e das periferias da cidade.

Lembro-me com orgulho e com carinho das não poucas vezes em que se passava a sacolinha entre os presentes nas atividades para pagar as kombis que traziam o povo das periferias para tocar naquelas terças.

Com a chegada do PT à prefeitura, com o importante apoio do movimento negro organizado da cidade, a Terça Negra foi para o Pátio de São Pedro, não como um favor, portanto, mas como uma conquista do povo negro da cidade.

Pensávamos, eu inclusive – mesmo a certa distância, pois já não era do PT, que nossa resistência tinha nos colocado em patamar distinto.

Iríamos resignificar a Terça, passando esta a ser espaço de vivência e visibilidade, de denúncia organizada e de construção de soluções, trazendo as periferias para o centro da cidade e do poder, como parte de uma política pública da prefeitura.

Nestes mais de 12 anos que nos separam daquelas terças no Pagode do Didi, a Terça Negra virou uma marca, um evento que já faz parte da agenda cultural de nossa cidade.

Enganam-se, contudo, aqueles que pensam que este feito foi uma conquista da gestão petista.

Definitivamente, não foi.

O que a Terça Negra construiu de bom – ser uma referência cultural e territorial do povo negro da cidade, foi com o suor, a criatividade, o talento e o voluntariado de nossa gente.

Sim, voluntariado, pois os artistas populares que fazem este calendário cultural permanente na cidade o fazem a custo zero para a prefeitura.

Esta, só disponibiliza, desde sempre, palco e som, que até pouco tempo custava ao erário pouco mais de R$ 20 mil por ano.

Até o transporte é de responsabilidade dos artistas e do movimento negro.

Por outro lado, enquanto toda esta riqueza cultural é garantida de graça aos cofres da prefeitura, a gestão petista se nega também a fazer a outra parte que está sob sua responsabilidade: qualificar e valorizar aquele território.

Esta crítica deve recair, também e talvez principalmente, sobre os negros e negras que passaram a ocupar cargos na prefeitura exatamente com estas responsabilidades.

De que serve uma “Coordenadoria do Negro” na prefeitura se esta não se presta a garantir que a Terça Negra seja além de um palco com equipamentos de som, um espaço de pedagogia da história e da cultura afrodescendentes?

De que serve esta coordenadoria se não se presta a garantir que o tráfico de drogas não avance sobre os jovens negros que freqüentam a Terça, a partir de pelo menos uma política permanente de redução de danos no local?

De que serve uma coordenadoria que não garante sequer uma iluminação adequada, banheiros, segurança na área?

De que serve se não consegue sensibilizar o prefeito a transformar a Terça Negra, também, em um espaço privilegiado para se desenvolver o turismo étnico em nossa cidade, promovendo atividades que gerem emprego e renda para a população negra?

O descaso da gestão petista com a Terça Negra e o povo que a faz é absurdo.

Recentemente, enquanto se digladiam em suas prévias, a Terça ficou simplesmente sem existir, após o carnaval.

Foram cerca de dois meses sem o evento.

Um escárnio.

Enquanto trata o povo negro, sua cultura e suas conquistas com tamanho desprezo, não faltam milhões em subsídios e cachês da prefeitura para Fat Boy Slim, Sandy e Junior, Paul McCartney e outros milionários.

A justificativa, portanto, não é falta de recursos, mas a mais ultrajante discriminação.

Presidente do PSOL-PE