Um novo museu para São Paulo Por JOSÉ POLICE NETO, CHICO MACENA E ELISEU GABRIEL, na Folha de São Paulo O escritor inglês Aldous Huxley disse que a principal lição que a história ensina aos homens é que eles não aprendem com a história.
A capacidade de lembrar os eventos relevantes de um povo, assim, traz não só referência ao passado mas, principalmente, ilumina o futuro, quebrando a tradição de esquecimento.
Ela permite reflexões mais precisas e cuidadosas, ao projetar as esperanças sobre o que virá.
A progressiva substituição dos monumentos à guerra e aos lideres e regimes ligados a ela pelos memoriais à luta da sociedade para a conquista de objetivos mais abstratos, como a paz, a democracia, a tolerância e a condenação de ações vergonhosas do passado, tem sido uma importante tendência.
Assim, há monumentos na África do Sul sobre a luta pelo fim do apartheid, memoriais do Holocausto em Israel e na Europa, o Memorial dos Escravos no Senegal e monumentos lembrando os massacres de limpeza étnica nos Balcãs, só para citar os casos mais relevantes.
A primeira coisa a ser dita sobre a proposta do Memorial da Democracia está ligada diretamente a essa relevância da memória objetiva, desprovida (como devia ser todo debate político) das paixões momentâneas e facciosas de parte a parte.
Todas as sutilezas do debate, que é fundamental, não podem ocultar ou desviar a atenção do elemento essencial: a enorme relevância para a sociedade brasileira de um Memorial da Democracia.
Ao lado do Memorial da Resistência, tanto física quanto historicamente, o Memorial da Democracia nos conta uma história sobre o povo brasileiro: a acirrada luta pela democracia e o esforço para a sua consolidação e estabilização.
A segunda preocupação que se deve ter nas questões da memória nacional é ser capaz de ultrapassar os limites estreitos da luta cotidiana, separando aquilo que é efêmero do que é atemporal. É evidente que um homem público que ocupou por tantos anos a presidência da República tem algo de relevante a dizer e que a sua obra merece respeito.
A documentação de um mandato presidencial é uma importante e rica fonte de informação.
A tradição norte-americana das bibliotecas presidenciais demonstra a relevância desses memoriais como fonte de documentação -inclusive como fonte crítica para uma melhor análise e entendimento dos governos.
Há, portanto, um claro interesse público em receber o acervo do presidente Lula em um espaço público.
A documentação desse período histórico é rica.
O Memorial da Democracia seria relevante mesmo que a sua única função fosse disponibilizar esse material.
Mas a proposta vai além disto, como foi documentado e está sendo apresentado.
Toda a argumentação sobre o valor de mercado que a área pode vir a ter só lança penumbra sobre a discussão, uma vez que não se está transferindo a área.
Se ela não pode ser vendida, nenhum sentido faz falar em valor de mercado, como se fosse uma doação permanente.
A finalidade do espaço não é ser a sede do Instituto Lula.
Adicionalmente, é necessário ressaltar a relevância da existência do memorial como elemento de valorização de uma área degradada, trazendo público e circulação de pessoas na área.
O debate sobre a questão é válido, mas é preciso fazer isto sem mesquinharias que atentam mais contra a imagem de quem as faz do que contra seu alvo.
Se a democracia é a vontade popular, é preciso, inclusive aos adversários, respeitar a figura que a população escolheu para reger a nação em período tão relevante.
JOSÉ POLICE NETO, 39, vereador pelo PSD, é presidente da Câmara Municipal de São Paulo CHICO MACENA, 49, é líder da bancada do PT na Câmara Municipal ELISEU GABRIEL, 64, é líder do bloco PSB-PSD na Câmara Municipal