Editorial da Folha de São Paulo Acima de conveniências partidárias, elucidação do caso Cachoeira e julgamento do mensalão são de interesse crucial para toda a sociedade Foram tão variados e tentaculares os contatos de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com o mundo político que a CPI em torno de seu nome parece ao mesmo tempo ser conveniente para muitos e explosiva para outros tantos.

Sem dúvida, o PT investiu na possibilidade de contribuir para a desagregação de um já combalido partido oposicionista, o DEM, que com o caso Cachoeira foi atingido em uma de suas figuras mais destacadas, o senador Demóstenes Torres, já desfiliado.

No PSDB, é o governador Marconi Perillo, de Goiás, quem mais se aproxima de ser colhido no caudal das investigações.

Conviria aos petistas, ainda, lançar uma cortina de fumaça sobre o julgamento do mensalão no STF, previsto para os próximos meses.

A fumaça, todavia, já intoxica personagens do próprio PT, como o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, e um assessor do Planalto, Olavo Noleto.

Na Itália, país que acumula vasta experiência histórica com a corrupção e seu combate, conhece-se sob o nome de “partito trasversale” o tipo de agrupamento que, como tudo indica ser o caso do esquema Cachoeira, transita com seu poder de influência por todos os setores políticos, da esquerda à direita.

Transversais, com efeito, foram as atividades do lobista Marcos Valério.

Sua fluência no PSDB mineiro precedeu de alguns anos a que demonstrou, com ainda maior audácia, no caso do mensalão.

Oposicionistas e petistas, para nada falar do PMDB, entidade transversal por excelência, têm desse modo motivos para se ocupar, e para se preocupar, com a CPI do caso Cachoeira.

Pouco importa quem sai ganhando ou perdendo com as investigações.

A corrupção, como demonstra o noticiário de todos os dias, não discrimina nenhum dos principais partidos brasileiros.

Inquirir, revelar, aprofundar os seus meandros interessa a todo cidadão que paga impostos no Brasil.

No cálculo político dos envolvidos, a CPI do caso Cachoeira e o julgamento do mensalão podem certamente servir a conveniências opostas. É o mesmo raciocínio que faz com que, a cada escândalo revelado pela imprensa, os acusados se digam vítimas de preconceitos ideológicos e partidários.

Uma figura de relevo no PT celebrou a CPI como uma oportunidade para desmascarar os autores da “farsa do mensalão”. É de outra farsa, entretanto, que se trata: a farsa das supostas vítimas, seja a que partido pertençam, e dos moralistas de tribuna, só ativos quando distantes do poder.

Foram petistas, foram demistas, foram tucanos -estão em toda parte.

Que do seu conflito não resulte, como tantas vezes, a mera acomodação, mas o detalhamento da verdade e a punição dos envolvidos.

Aspiração que não é de nenhum partido -mas, sim, de toda a sociedade brasileira.