Foto: Agência Brasil Da Veja.com Getulismo, protecionismo, nacional-desenvolvimentismo.
Poderia ser um resumo de um livro de história sobre o Estado Novo, mas são referências da mais jovem legenda partidária do Brasil, o Partido Pátria Livre (PPL), que estreará nas urnas neste ano.
Com uma organização amadora, ideias ultrapassadas, nenhuma figura de renome e, até agora, zero voto, já que não disputou eleição, a legenda já recebe recursos do Fundo Partidário – em 2011, durante apenas três meses de existência, foi agraciada com mais de 120.000 reais.
O partido também começou a testar a paciência da população na propaganda gratuita no rádio e na TV.
Formado por ex-integrantes do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), que praticou crimes durante a ditadura e depois se transformou em uma facção do PMDB, o PPL tem tudo para se tornar um coadjuvante de terceira linha.
Mas, fiel à tradição nacional, já nasce apoiando o governo federal.
O nascimento do PPL é mais um sintoma da total anarquia do quadro partidário brasileiro, em que as siglas têm firmeza ideológica inversamente proporcional à fome de poder e de recursos públicos.
As legendas de direita sumiram do mapa ou abandonaram as próprias ideias.
Boa parte das de esquerda flexibilizou o discurso ao chegar ao poder na mega-aliança capitaneada pelo PT.
Os nanicos radicais e sem voto são cada vez mais numerosos: nesse time, o PPL se soma a PCB, PCO, PSTU e PSOL.
A fragmentação excessiva torna os governos reféns de amplas e heterogêneas coalizões, sem as quais não conseguiriam maioria no Congresso.
Os partidos aliados cobram seu preço: o loteamento dos cargos do Executivo.
Não é por acaso que o Brasil tem 39 ministérios e uma das menores oposições do mundo: ninguém quer ficar de fora.
O apetite por cargos, aliás, desencadeou uma crise envolvendo o governo da presidente Dilma Rousseff e a base aliada.
Comandados pelo PMDB, líderes governistas impuseram ao governo uma amarga derrota no Congresso ao rejeitar a recondução de Bernardo Figueiredo a diretor-geral da Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT) - indicação pessoal da presidente.
A votação do Código Florestal, na Câmara, será o grande teste da relação de Dilma com sua base.
Na ciência política, um regime em que haja mais de sete partidos no Congresso é considerado fortemente pluripartidário.
O Parlamento brasileiro tem 23 - só quatro são de oposição.
A livre criação de partidos foi retomada no país em 1981.
Com a primeira disputa presidencial, em 1989, o número de legendas se elevou.
Alguns teóricos acreditavam que o quadro partidário se enxugaria naturalmente pelos anos seguintes, mas isso não aconteceu.
Das siglas existentes à época, apenas oito sobreviveram até hoje.
Mas, de lá para cá, outras 21 ganharam vida.
O excesso numérico não é exatamente o problema.
Nos Estados Unidos, existem mais partidos do que o Brasil.
Mas apenas dois, o Republicano e Democrata, conseguem eleger representantes no Congresso.
Não há recursos do estado a alimentar legendas sem expressão. “O financiamento público impede a redução no número de partidos”, diz Leonardo Barreto, cientista político da Universidade de Brasília .
O financiamento público dos partidos não se justifica.
As legendas sem expressão não deveriam receber esses recursos porque não têm votos e não representam a população.
As legendas de expressão não deveriam receber esses recursos porque não precisam deles para sobreviver.
Mudanças - A reforma política em discussão no Congresso pode agravar a situação.
Se for aprovado o texto do relator Henrique Fontana (PT-RS), as campanhas serão financiadas inteiramente com recursos públicos, o que deve incentivar a criação de partidos incapazes de andar com as próprias pernas.
O texto do petista também não prevê uma cláusula de barreira, que exigiria critérios mais rígidos para o funcionamento dos partidos.
Mas, por outro lado, pode contribuir para corrigir a proliferação de partidos de aluguel: o fim das coligações em eleições para vereador e deputado: “A minha visão é de que isso gera uma reacomodação politizada, não à força, na política brasileira”, diz Fontana.
O cientista político Leonardo Barreto concorda: “Para sanear o sistema partidário, bastaria extinguir as coligações”.
Na verdade, o Congresso já chegou a criar uma cláusula de barreira em 2006: para poder assumir cargos eletivos em qualquer plano, as legendas teriam de obter ao menos 5% de votos na disputa pela Câmara dos Deputados.
A regra acabou anulada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) meses depois.
Mas, enquanto vigorou, a cláusula causou a extinção de legendas como o PAN (o Partido dos Aposentados da Nação) e o Prona (do ex-deputado Enéias Carneiro).
Ambas preferiram se fundir a siglas maiores: o PTB e o PL, respectivamente.
Pré-candidato do PPL à prefeitura de São Paulo e presidente do diretório estadual da legenda, Mário Manso diz que não há problemas com a instabilidade do quadro partidário: “Partidos são como pessoas: nascem, crescem e, se não souberem dar resposta aos problemas do Brasil, morrem”, afirma.
PSD - A disseminação de legendas tornou a identidade das siglas brasileiras um mistério indecifrável.
Qual é a diferença de ideias entre PSB e PT?
Entre PTB e PDT?
Entre PR e PP?
Poucos se arriscam a teorizar.
Em eleições regionais, o PSOL já se aliou ao PCdoB, que por sua vez divide coligações com o DEM.
Ironicamente, os dois partidos que protagonizam a polarização do debate político nacional, PT e PSDB, têm mais semelhanças do que divergências programáticas.
Neste aspecto, o PSD é um avanço: nasceu como o único partido que flutua sobre o espectro ideológico.
O importante é ganhar eleição.
Nada de direita, esquerda e centro - postura que permite o namoro simultâneo com Dilma Rousseff e José Serra.
Não que petistas e tucanos fiquem escandalizados com isso: em Belo Horizonte, a terceira maior cidade do país, o prefeito Márcio Lacerda (do PSB) foi eleito com apoio simultâneo de PT e PSDB.
A dobradinha deve se repetir este ano.