Amou daquela vez como se fosse a última Beijou sua mulher como se fosse a última E cada filho seu como se fosse o único E atravessou a rua com seu passo tímido Subiu a construção como se fosse máquina Ergueu no patamar quatro paredes sólidas Tijolo com tijolo num desenho mágico Seus olhos embotados de cimento e lágrima Sentou pra descansar como se fosse sábado… (Chico Buarque) Por Manuela Dantas Após a merecida pausa arquitetada para gerar a construção do conhecimento alimentador das palavras escritas e flutuantes que deslizam uma semana nas mentes e nos corações dos leitores dessa coluna, aconteceram dois fatos que me fizeram permanecer na tratativa da temática das construções.

O primeiro evento aconteceu na sexta-feira passada quando recebi a encomenda de refletir e escrever sobre o papel do engenheiro do século XXI.

Decerto, um tema bem complexo que caberia em 5 anos de uma reestruturação do Curso de Engenharia.

O fato é que continuo refletindo…

O segundo evento aconteceu no sábado passado, ao abrir o Blog do Jamildo e ler todos os comentários da coluna de acessibilidade e me deparar com o depoimento verdadeiro, sincero e que soa como um desabafo realizado pelo João Roberto.

Trocando em miúdos, toda essa chuva de pensamentos paralelos se encontrou no infinito da minha reflexão e me impulsionou a continuar dissertando sobre o que há tempos me é familiar e que ressurge fortemente com uma nova dimensão poética e humanitária: a construção.

Lembrei da minha infância em que não conhecia profundamente os aspectos geradores das construções gerenciadas por meu pai, mas adorava caminhar animadamente por aqueles trechos espalhados pelo Nordeste e ver surgir rapidamente à transformação que a construção gerava no ambiente, nas pessoas, ver a força do trabalho e ver, especialmente, nos olhos dos construtores a esperança e a alegria com os bons frutos gerados.

Meu pai via além, via e participava da transformação do Brasil, das sementes plantadas para o crescimento econômico que acompanhamos hoje.

Hoje (17 de outubro), não por coincidência, comemoramos o dia da Construção e o Brasil, especialmente Pernambuco, orgulha-se com o setor que mais cresce no estado e impulsiona a economia do mesmo a crescer em níveis superiores ao da China.

Num futuro próximo, as bases construídas hoje em infraestrutura possibilitará a continuidade do crescimento econômico em outros setores. É lindo ver a ebulição de construções em Suape, Recife e mais ainda ver o trem da transnordestina pedindo passagem do sertão ao litoral e transformando a realidade sofrida de pessoas sem oportunidades em sonhos que crescem com a revolução de novas perspectivas.

Quem te viu, quem te vê Salgueiro! É de se esperar que o Homem acompanhe o trem da história e cresça tal qual sua obra, todavia não me espanto em saber por dados do próprio IBGE que a sétima economia do mundo (superando a França e o Reino Unido), título orgulhosamente ostentado por nosso Ministro da Fazenda, também ostenta, nesse caso tristemente, a marca de obter em um universo de 169 países a posição de 73ano IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).

Ora, continuando a minha reflexão sobre o papel da engenharia no século XXI, não posso deixar de concluir que em primeiro lugar está o HOMEM, em segundo lugar está o HOMEM e em terceiro lugar está o HOMEM.

Outrossim, a engenharia é um forte setor de inclusão social, não só por ser o setor que mais emprega, mas também por ser o agente de transformações do espaço e da sociedade.

Recordo-me de que um colega da Universidade apontava que a Engenharia era responsável pela construção das civilizações, filosofia a parte, não podemos fugir da responsabilidade de sermos os agentes de mudanças profundas e verdadeiras nos ambientes que atuamos e isso só será possível com uma atuação focada na responsabilidade social.

Ora, diante dessa constatação, fiquei surpresa ao ler o depoimento do João Roberto que estudava em uma Instituição de Ensino Jurídica, a qual em 2009 realizava uma reforma nas suas instalações, mas que os projetos arquitetônicos e as obras civis não contemplavam aspectos de acessibilidade.

Questionei-me sobre que tipo de profissionais estamos formando já que existem normas e leis que obrigatoriamente deveriam ser seguidas e que não foram contempladas, por fim mais uma vez questiono como os projetos dessa reforma foram aprovados pela prefeitura.

Continuando a reflexão sobre a construção e seus impactos, deparo-me com o conceito de responsabilidade social aonde a mesmo expressa compromissos mais amplos do que os previstos na lei (acessibilidade, obrigações trabalhistas, tributárias, sociais, legislação ambiental, de uso do solo).

Expressa, principalmente, a adoção e disseminação de valores, condutas e procedimentos positivos do ponto de vista ético, social e ambiental.

Aliás, nesse momento o engenheiro torna-se o agente Construtor da Civilização, como diria meu colega de outros tempos, ou seja, o agente de uma nova cultura, sejam atores de mudança social, sejam construtores de uma sociedade melhor.

Para isso, o Engenheiro Civil do século XXI deve • Ter os mais elevados padrões éticos de comportamento; • Exigir os padrões técnicos mais elevados; • Informar-se; • Reconhecer e aceitar a diversidade.

Por fim, queridos colegas não nos limitemos a sermos conduzidos pelo trem da história sem contribuir para a construção de um mundo acessível que respeite e inclua todos os brasileiros, eliminemos as barreiras atitudinais e arquitetônicas que insistem em manter a exclusão.

Desse modo, insisto em manter a fé e a esperança de que amanhã será outro dia e que ele surgirá como ontem ao adentrar, sem a costumeira ajuda para a superação de barreiras arquitetônicas, os umbrais da casa de recepção que minha sobrinha comemorava o seu primeiro aninho, deslizar facilmente com as rodas da minha cadeira e rapidamente ver a minha linda sobrinha se jogar nos meus braços com um sorriso inspirador de novas construções…

Isso posto, findo o artigo com as palavras de Neruda: É Proibido É proibido chorar sem aprender, Levantar-se um dia sem saber o que fazer Ter medo de suas lembranças. É proibido não rir dos problemas Não lutar pelo que se quer, Abandonar tudo por medo, Não transformar sonhos em realidade. É proibido não fazer as coisas por si mesmo, Não crer em Deus e fazer seu destino, Ter medo da vida e de seus compromissos, Não viver cada dia como se fosse um último suspiro. É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar, Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte. É proibido não criar sua história, Deixar de dar graças a Deus por sua vida, Não ter um momento para quem necessita de você, Não compreender que o que a vida te dá, também te tira. É proibido não buscar a felicidade, Não viver sua vida com uma atitude positiva, Não pensar que podemos ser melhores, Não sentir que sem você este mundo não seria igual.

Pablo Neruda